06 de setembro de 2024
Publicado em • atualizado em 25/06/2021 às 22:38

Com restrição na vacinação, mães lactantes propõe escalonamento para que todas sejam imunizadas

(Foto: SMS/Goiânia)
(Foto: SMS/Goiânia)

Com poucas doses disponíveis para a vacina e inseridas nos grupos prioritários, as mães que ainda amamentam seus filhos ficaram na expectativa de serem imunizadas contra a Covid-19 após o governador Ronaldo Caiado (DEM-GO) anunciou nesta quinta-feira (25/06) que as lactantes entraram nos grupos prioritários. De fato, foi um avanço num momento em que cada dose significa esperança que até dias atrás não existia para as mulheres que tem suas crias pequenas.

Ao mesmo tempo, a restrição das doses apenas para lactantes que têm filhos com até seis meses frustrou algumas mães que amamentam e tem crias fora dessa faixa etária. “Fiquei bastante animada quando fiquei sabendo do anúncio que lactantes em Goiás seriam inseridas e com expectativa de saber o calendário da Prefeitura. Somos consideradas pessoas com mobilidade reduzida, nossa imunidade não é a mesma de uma pessoa que não produz leite. Gastamos mais energia durante a produção. A vacinação tinha que ser para todas as lactantes. Acho essa limitação injusta e até irresponsável”, destaca a designer de moda Tainara Maia, de 26 anos, que até hoje amamenta a filha que tem 1 ano e 2 meses. “O aleitamento materno ainda é o principal alimento da minha filha”, reforça.

Hora de comemorar, mas também cobrar

Mãe de dois filhos, a médica-veterinária Patrícia Rabelo é uma das líderes do movimento Lactantes pela Vacina em Goiás. Ela comemora a decisão, mas o grupo ainda não se sente totalmente satisfeito com a medida. “Recebemos a notícia com muito contento, estamos muito felizes com a conquista. Entretanto, a gente faz a ressalva e espera da Prefeitura um posicionamento de escalonamento por idade”, explica. Ela inclusive, relembra que o governador do Estado, Ronaldo Caiado (DEM) não fez nenhuma ressalva quanto a sub-grupos de lactentes ao fazer o anúncio da imunização. “Ele disse que as lactantes seriam vacinadas e lactantes são todas as mães que amamentam, sem restrição de idade.”

Uma das parlamentares que fez a ponte entre o movimento Lactantes pela Vacina e a Secretária Municipal de Saúde em Goiânia foi a vereadora Sabrina Garcez (PSD). Ela comemora a rapidez desde o primeiro encontro até a inserção do grupo na vacinação, mas reforça que ainda há o que se cobrar. “Apesar de ter começado com mães que têm filhos com até seis meses, a nossa pretensão é avançar nessa luta para que essas mães que tenham filhos maiores também possam se vacinar. Num primeiro momento agora é comemorar e deixar essas mãezinhas já se vacinarem e a partir disso, a gente já vai começar a nossa próxima busca que é para aumentar essa idade dos filhos um pouquinho mais velhos”

Naturalizamos a ‘falsa obrigatoriedade’ da amamentação até seis meses

Mãe do pequeno Davi, a socióloga e vereadora Aava Santiago (PSDB) junto com a colega, Sabrina Garcez intermediou o movimento Lactantes pela Vacina com a Prefeitura. Ela também comemora o feito. Mas é preciso fazer mais. “Agora é celebrar essa vitória e planejar os próximos passos para conseguir estender a vacinação para lactantes no geral”, destacou.

Santiago reforça que há um problema estrutural por trás da decisão da Prefeitura: a de que, nas entrelinhas, existe um contexto entre nossas vivências que uma mãe deve apenas amamentar dentro dos seis primeiros meses. “Nós temos um desestímulo a amamentação até os dois anos”, crava. “É corriqueiro naturalizar a amamentação por até seis meses e tá tudo certo. Isso está na forma como as empresas, o poder público, a opinião se comportam”, destaca.

Toda essa toada acaba refletindo em decisões como essa da Prefeitura de Goiânia. “E isso acaba reverberando do ponto de vista concreto em ações como essa: não compreender que uma criança de seis meses a dois anos não só podem como idealmente devem estar se alimentando. É claro que nem sempre as mães conseguem manter o fluxo de leite, mas no mundo ideal toda a criança teria de ter contato com o leite materno até os dois anos de idade”, pondera.

O que a OMS recomenda

No mundo ideal, como Aava pontuou, não deveria haver um limite para a amamentação de uma criança. A Organização Mundial de Saúde (OMS), no entanto, recomenda que seja estendida até os dois anos, mas que exclusiva pelos primeiros seis meses. É a partir dessa premissa que a Prefeitura de Goiânia decidiu sobre a restrição da imunização para lactantes com bebês que não tenham passado do sexto mês de vida. 

Em nota encaminhada ao Diário de Goiás, a pasta apresenta a justificativa adiantando que não existe previsão para ampliar a vacinação para o grupo. “A Secretaria de Saúde de Goiânia esclarece que o critério adotado pelo município foi baseado na prerrogativa da Organização Mundial da Saúde (OMS) do aleitamento materno exclusivo de que a criança receba apenas leite materno, por seis meses. No momento não há perspectiva de ampliação para lactantes”. Porém, não há uma relação entre a recomendação com a vacinação contra a Covid-19. Patrícia explica: “A Organização Mundial de Saúde prevê o aleitamento materno exclusivo até os seis meses, mas prolongado até dois anos ou mais.” 

A coordenadora do movimento ressalta que aguarda que a imunização seja flexibilizada. “A gente espera que Goiânia possa rever e escalonar porque também entende que as doses são limitadas, a gente entende que precisa fazer um escalonamento mas a gente quer a posição de como vai ser esse escalonamento.”

O que a Sociedade Brasileira de Pediatria diz

A Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) defende a vacinação de lactantes, independente da idade da criança. Para a SBP, o benefício da vacinação da lactante é propiciar a proteção destas mulheres contra a covid-19, diminuindo, portanto, o risco teórico de transmitir a infecção aos filhos destas mães vacinadas. Além disso, o leite materno contém anticorpos (IgA secretória contra o SARS-CoV-2) que poderiam potencialmente proteger o bebê amamentado.
No Rio de Janeiro, o prefeito Eduardo Paes (DEM) já colocou as lactantes sem restrição de idade na fila da vacinação e elas começarão a ser imunizadas a partir da próxima segunda-feira (28/06). Por lá, será necessário apenas uma declaração do profissional pediatra que faz o acompanhamento da criança. “A partir de segunda-feira, a gente começa a vacinar as lactantes, desde que tenham a indicação do profissional de saúde que faz o acompanhamento da criança”, afirmou ao anunciar a abertura.

Domingos Ketelbey

Jornalista e editor do Diário de Goiás. Escreve sobre tudo e também sobre mobilidade urbana, cultura e política. Apaixonado por jornalismo literário, cafés e conversas de botequim.