Os municípios goianos de Davinópolis e Ceres estão entre as 20 cidades brasileiras que passarão por investigação da Polícia Federal (PF) por supostas irregularidades na aplicação de emendas impositivas do tipo transferência especial, conhecidas como “emendas PIX”. A determinação é do ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal (STF), em ação que tramita há quatro anos na Corte para verificar o cumprimento das normas constitucionais sobre esse tipo de repasse.
A decisão tem como base o 8º Relatório Técnico da Controladoria-Geral da União (CGU), que analisou 20 entes federados que receberam os maiores valores dessas transferências em 2024 e que não haviam apresentado planos de trabalho até 13 de fevereiro de 2025. No total, foram avaliados 44 planos, somando R$ 72 milhões.
O relatório concluiu que nenhum dos 20 municípios cumpriu integralmente as exigências legais. Em 14 deles, os recursos já haviam sido utilizados e, em 11, foram identificadas irregularidades na contratação de serviços ou compras de bens. Para Dino, os dados evidenciam um “quadro generalizado de ilegalidades”, com falhas na transparência, rastreabilidade e execução dos planos de trabalho.
Davinópolis
Em Davinópolis, três emendas que juntas somam R$ 4,6 milhões serão investigadas. Entre elas:
- R$ 500 mil destinados pela deputada Magda Mofatto (PRD) para ampliar o sistema de videomonitoramento;
- R$ 120 mil indicados por Jeferson Rodrigues (Republicanos) para expansão da rede de fibra óptica;
- R$ 4 milhões enviados por Glaustin da Fokus (Podemos) com objeto amplo, incluindo locação de máquinas, compra de imóvel, obras urbanas e reformas diversas.
A CGU identificou sobreposição de contratações e sobrepreço na locação de máquinas e veículos pesados, além de planos de trabalho entregues fora do prazo e incompletos. O órgão também apontou uso dos recursos em desconformidade com a finalidade prevista, falta de fiscalização contratual, ausência de relatórios de gestão e fragilidade nos procedimentos administrativos.
A prefeita Vanusa Bento (Podemos) afirmou, em nota, que as emendas mencionadas são referentes à gestão anterior e que nenhum dos recursos foi recebido ou utilizado durante seu mandato. Disse ainda que parte das verbas teria sido empregada no custeio da máquina pública, conforme informado pela equipe de transição, e declarou estar à disposição para colaborar com as investigações.
Ceres
Em Ceres, foram analisadas duas emendas que totalizam R$ 1,1 milhão:
- R$ 800 mil, indicados pelo senador Jorge Kajuru (PSB), para reformar a Praça Cívica;
- R$ 300 mil, enviados pelo deputado José Nelto (UB), para construção de uma ponte e obras de drenagem.
A CGU concluiu que os planos de trabalho do município também foram apresentados extemporaneamente, sem envio de relatórios de gestão. O prefeito Edmário Barbosa (UB) disse ter recebido a notícia com “surpresa, mas tranquilidade”. Ele afirmou que a reforma da praça já foi concluída e que a prestação de contas está em andamento junto ao Ministério das Cidades. Sobre a emenda destinada à ponte, garantiu que os recursos estão sendo aplicados na construção de uma ligação com o Povoado do Sapé e na canalização de um córrego.
Reação dos parlamentares
Os parlamentares responsáveis pelas indicações defenderam a regularidade dos repasses e transferiram à gestão municipal a responsabilidade pela execução:
- Magda Mofatto disse ter tomado conhecimento do caso pela imprensa e afirmou que tem “total tranquilidade” quanto às indicações, prometendo acompanhar a aplicação dos recursos.
- Jeferson Rodrigues ressaltou que sua emenda foi destinada legalmente e que a execução é de responsabilidade da prefeitura.
- José Nelto reforçou que “depois que envia a emenda, a responsabilidade é do prefeito”.
- Kajuru teve posicionamento semelhante.
- Glaustin da Fokus disse confiar plenamente na lisura da aplicação dos recursos em Davinópolis, destacando que a prefeita e o ex-gestor Diogo Nunes fazem parte de sua base política.
CGU aponta falta de transparência
Segundo o relatório, nenhum dos municípios auditados atingiu nível adequado de transparência ativa em portais ou relatórios. A CGU afirmou que são necessários ajustes na rastreabilidade dos recursos e no detalhamento de sua aplicação.
Para Flávio Dino, permanecem “falhas generalizadas no cumprimento dos planos de trabalho, no atendimento às condicionantes legais e na observância dos princípios da transparência e da rastreabilidade”.
Com isso, o ministro determinou:
- Envio do relatório à PF para apuração de indícios de crimes;
- Elaboração, pela CGU, de um plano de auditorias para 2026, com foco em áreas críticas, como saúde e obras de asfalto;
- Apresentação, pela AGU, em 60 dias, do 1º relatório do grupo de trabalho destinado à responsabilização civil e administrativa e à recuperação de recursos.
Além disso, Dino reforçou regras para o uso de emendas coletivas e de bancada em despesas de pessoal da saúde, agora permitidas pelo TCU, estabelecendo exigências rigorosas de transparência, como conta exclusiva para cada tipo de emenda e publicação mensal dos servidores pagos com esses recursos no Portal da Transparência.
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