O governo deflagrou movimento para tentar impedir a instauração de Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar corrupção no Ministério da Educação (MEC). Até ontem, 26 senadores já tinham assinado o requerimento de criação da CPI do MEC. São necessárias 27 assinaturas. O alvo principal da comissão é a atuação do gabinete paralelo operado no ministério por pastores ligados ao ex-ministro Milton Ribeiro e a tentativa de compra de ônibus a preço inflado, casos revelados pelo Estadão.
Presidente da Comissão de Educação no Senado, Marcelo Castro (MDB-PI), que conduziu sessões em que três prefeitos confirmaram ter recebido cobrança de propina para ter acesso a recursos do MEC, estava entre os que defendiam apuração do caso. Mudou o discurso, e agora, mesmo diante dos relatos, diz que vai “analisar a possibilidade” só após ouvir o novo ministro da Educação. A assinatura dele poderia viabilizar a comissão.
O senador Alvaro Dias (Podemos-PR), que costuma apoiar investigações, também não quis aderir ao movimento. Alegou que não quer dar palanque eleitoral para oposição. O senador Carlos Viana (PL-MG), indicado para assumir a liderança do governo no Senado, foi na mesma linha. “Eu não acredito que a gente prospere com as assinaturas ou mesmo que a gente vá se instalar uma CPI em ano eleitoral”. Autor do pedido de abertura da CPI do MEC, o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) afirmou que os fatos são “gravíssimos” e devem ser rapidamente apurados.
Na noite desta quinta-feira, 7, o presidente Jair Bolsonaro demonstrou mais uma vez incômodo com escândalo da licitação com indicação de sobrepreço para aquisição de ônibus escolares. No dia nacional dos jornalistas, criticou o trabalho da imprensa. “Investigativo pipoca nenhuma, rapaz. Bando de sem vergonha jornalistas. Não investigam nada”, declarou em transmissão ao vivo em suas redes sociais.
Bolsonaro repetiu o discurso de que foi o governo, e não a imprensa, quem descobriu as irregularidades na licitação, o que é uma inverdade. Mesmo diante de alertas de órgãos de controle, o governo manteve o leilão com preços elevados e só reduziu no dia 4, após divulgação do caso pelo Estadão. “Deixa acontecer a licitação, pô”, disse, referindo-se ao pregão dos ônibus.
O ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira, procurou senadores para barrar a coleta de assinaturas pró-CPI. Ciro, que é senador licenciado e hoje tem poder para liberar recursos do Orçamento a parlamentares, está diretamente ligado à distribuição de verbas do MEC. O Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) é presidido por Marcelo Ponte, ex-assessor de Ciro.
Ouro
A proposta de CPI envolve a investigação do caso de cobrança de propina em ouro e disfarçada por meio da compra de bíblias patrocinadas pelos pastores Gilmar Santos e Arilton Moura. A comissão também foi proposta para apurar a licitação para compra de 3.850 ônibus escolares. Como revelou o Estadão, a concorrência foi elaborada com indicação de sobrepreço de mais de R$ 700 milhões. A licitação está embargada pelo Tribunal de Contas da União (TCU).
Ontem, o presidente do FNDE prestou depoimento na Comissão de Educação. Marcelo Ponte alegou que o governo já tinha sido alertado por órgãos de controle e ajustado a cotação dos ônibus antes da divulgação da notícia pelo Estadão. Documentos internos do FNDE, no entanto, desmentem a versão apresentada por ele.
Por Julia Affonso, André Shalders e Breno Pires, Estadão Conteúdo
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