Vacina foi eleita a palavra do ano pelo dicionário Oxford em 2021. E não à toa. Era este talvez o imunizante mais esperado na história da humanidade. Aquele que poderia conter o avanço brutal do coronavírus mundo afora. Só no Brasil, no ano anterior, foram 195 mil vítimas da covid-19.
A esperança para conter a pandemia começou a ser aplicada em pequenas doses em 2020. Porém, no Brasil, a vacina só chegaria neste ano. E a conta-gotas. Depois de muita pressão, num domingo, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) concedeu autorização para uso emergencial da primeira vacina anti-covid. Tratava-se da CoronaVac, desenvolvida pela chinesa Sinovac e envasada no país pelo Butantan.
O imunizante já havia sido alvo de disputa política intensa em 2020, entre o presidente Jair Bolsonaro, que chamou-a de “vachina” e afirmou que o governo federal não o compraria, e o governador de São Paulo, João Doria, que tentou promover-se como o “pai da vacina”.
A polêmica aumentaria após São Paulo aplicar a primeira dose do país na enfermeira Mônica Calazans, logo depois da autorização da Anvisa, no mesmo dia 17 de janeiro. O Ministério da Saúde afirmou que detinha exclusividade no contrato com o Butantan e ameaçou processar o governo paulista.
Primeira vacina em Goiás é aplicada em Anápolis
Como retribuição à recepção dos repatriados de Wuhan, antes mesmo do início da pandemia, o governador Ronaldo Caiado aplicou a primeira dose da vacina contra a covid-19 no estado em Anápolis. A idosa Maria Conceição da Silva, de 73 anos, moradora do Abrigo dos Velhos Professor Nicéphoro Pereira da Silva foi a primeira contemplada e rogava para que todos, em breve, pudessem ter a vacina no braço.
O desejo de dona Maria, no entanto, não se concretizou. O país vivia um momento de grande escassez de vacinas. Em janeiro, apenas profissionais de saúde e moradores de instituições de longa permanência tiveram acesso ao imunizante. Em meio ao medo de um recrudescimento, várias cidades registraram também os chamados fura-filas, que se imunizavam antes de chegar sua vez.
A AstraZeneca, grande aposta do governo federal, atrasou os repasses do Ingrediente Farmacêutico Ativo (IFA) para produção da vacina na Fiocruz. Isso fez o calendário de imunização travar diversas vezes. O Ministério da Saúde, então comandado por Eduardo Pazuello, sofria muitas críticas por não ter fechado contrato com a Pfizer, farmacêutica que mais fornecia doses ao mundo.
Só foi possível iniciar a vacinação por faixa etária decrescente em Goiânia no dia 10 de fevereiro. O ex-prefeito Iris Rezende foi um dos primeiros a se imunizar, quando houve a abertura para o público em geral a partir dos 85 anos de idade. Neste momento, o vírus já mostrava uma versão mais letal e transmissível.
P1 sufoca o país
Enquanto a vacinação prosseguia com muita lentidão, o Sars-CoV-2 tinha disseminação cada vez mais rápida. Depois de devastar Manaus, que já sofrera sobremaneira na primeira onda, a nova versão do vírus, ainda chamada de P1, se espalhou pelo Brasil. A maior cidade do Norte do país, inclusive, ficou sem oxigênio para atender os pacientes. Também não havia leitos, e doentes foram transferidos para diversos estados, inclusive Goiás, que acolheu vários deles.
Quando os primeiros infectados com a P1, posteriormente nominada como Gamma, chegaram aos hospitais de Goiânia, os especialistas já alertavam para a periculosidade da cepa. Ela causava uma doença mais grave e atingia também pacientes mais jovens.
Em questão de semanas, Goiás viu a variante tornar-se a dominante. As hospitalizações e mortes subiram fortemente, enquanto a campanha de vacinação estava empacada pela falta de imunizantes.
Os meses de março e abril, especialmente, levaram muitas vidas. As imagens de hospitais lotados e cemitérios abarrotados dominaram o noticiário. A pressão por vacinas aumentava e culminou na instalação, no dia 27 de abril, de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar ações e omissões do governo federal na pandemia.
A média móvel de mortes por covid-19 chegou ao auge de 3.125 em 12 de abril, segundo o consórcio de veículos de imprensa. Na semana anterior, o país chegou a registrar quase 4,2 mil mortes pela doença em apenas 24 horas. E não eram só idosos, como na primeira onda, mas também muitos adultos jovens.
Volta das restrições
Cerca de nove meses após o lockdown de março, que também se prolongou por abril de 2020, os municípios goianos veriam novas restrições na tentativa de segurar o contágio. Aparecida de Goiânia liderou um movimento na Grande Goiânia para a adoção de medidas conjuntas. O primeiro decreto saiu no fim de fevereiro e houve prorrogações para o mês de março.
Bares e restaurantes voltaram a fechar, assim como praticamente todos os serviços não essenciais. Por semanas, os eventos religiosos também foram proibidos. As medidas foram sendo flexibilizadas a cada período de 14 dias, mas permaneceram restritivas por boa parte de abril. Os goianienses puderam voltar à mesa de bar somente em 22 de abril, mas ainda com muitas regras, com limitação de público e horário.
Campanha de vacinação deslancha e vira o jogo
Depois de meses de tormenta, o Brasil finalmente viu a vacinação avançar com mais força no meio do ano. Em junho, a população abaixo de 60 anos começou a ser vacinada por faixa etária decrescente em Goiás. Os números já começavam a melhorar, baixando da casa de 2 mil mortes diárias.
Ficou claro também que, embora a vacina fosse desejada pela vasta maioria dos brasileiros, um grupo, liderado pelo presidente Jair Bolsonaro, atacava o imunizante. A desinformação começou a se proliferar com força, anunciando mentiras. Parte da população então se desmobilizou. Em Goiás, por exemplo, mais de 10% daqueles que são elegíveis para se vacinar não tomaram sequer uma dose. A abstenção à segunda dose, somada à primeira, é de 1,6 milhão de goianos, ou seja, quase 30% de quem tem 12 anos ou mais.
De todo o modo, a vacina proporcionou mais segurança para a retomada. O contágio e, por conseguinte, internações e óbitos caíram. As flexibilizações se deram em maior grau. Os cinemas, que estavam fechados desde março de 2020, reabriram em julho em Goiânia, assim como os teatros. Os eventos puderam voltar com força, assim como as torcidas encheram novamente os estádios.
Por outro lado, os hospitais, antes lotados, desmobilizaram centenas de leitos que antes eram exclusivos para tratamento de pacientes com covid. Se Goiás chegou a ter o sistema colapsado, com uma imensa fila de espera por um leito hospitalar, a vacina fez com que as internações saíssem da casa do milhar e fossem para as dezenas. E a ocupação passasse a ficar na casa dos 20%.
Na rede estadual, em determinado momento, houve quase 2 mil internados por covid simultaneamente. Neste fim de ano, o número varia entre 80 e 90. Em Anápolis, a prefeitura desmobilizou o hospital de campanha. Goiânia, assim como o estado, transferiu leitos – antes covid – para outros tratamentos.
Postos de saúde cheios de novo, mas não é só covid
O ano termina com um novo alerta na saúde. Mas, desta vez, não é apenas o coronavírus o culpado. Na verdade, indicam os testes, a covid é atualmente o menor dos problemas. Cais, UPAs e outros postos de saúde estão cheios de pessoas com sintomas gripais. Todavia, os diagnósticos são de gripe e doenças transmitidas pelo aedes aegypti, como dengue, zika e chikungunya.
Nas principais cidades do estado, a população tem dificuldade de conseguir atendimento pelo alto número de pacientes. Sem lugar para esperar, muitas delas sentam-se e até deitam-se no chão. O reflexo é sentido tanto na rede pública, quanto na particular. Estados e municípios, em resposta, incentivam a busca pela vacina contra a gripe.
Além disso, o ano encerra-se com o temor do espalhamento da variante ômicron. A cepa é a mais contagiosa entre todas identificadas até hoje e causa problemas na Europa. Dados preliminares dão ânimo, porém, ao indicar que essa variação tende a ser menos letal. Ademais, a expectativa do início da vacinação de crianças contra a covid aumenta a esperança de que 2022 seja bem diferente de 2021 na saúde.
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