Desde junho de 2023 as mulheres puderam contar com uma conquista: a mudança na lei da laqueadura. A alteração na Lei nº 9.263/1996, também conhecida como Lei do Planejamento Familiar, estabeleceu novas regras para o acesso ao procedimento de laqueadura pelo Sistema Único de Saúde (SUS), entre elas, a idade mínima para realização do procedimento, de 25 para 21 anos, e o veto à necessidade de autorização do cônjuge para a execução da esterilização.
A mudança na lei simbolizou liberdade de escolha para as mulheres. Para o advogado especialista em direito da saúde, Henrique Rodrigues de Almeida, acostumado a receber mulheres com esse tipo de questão, a mudança representou também uma evolução social, há tempos necessária. “Essa lei é como se fosse uma carta de alforria, uma liberdade, porque antes havia muita restrição, principalmente na restrição da mulher precisar que o cônjuge autorizasse esse procedimento. É algo impensável hoje em dia, então é uma evolução gigantesca do ponto de vista social que o Estado tenha reconhecido que a mulher é livre para decidir sobre seu próprio corpo e tenha criado essa nova lei”, destacou.
Nessa mesma perspectiva, a estudante de medicina Cristiely Oliveira Caixeta de Sousa, que além de ter tido contato direto com mulheres interessadas nesse procedimento durante o internato nas maternidades possui vontade expressa de realizar o procedimento em breve, acredita que a alteração é reflexo, também, de uma mudança social.
“Essa dispensa da autorização do cônjuge para a realização do procedimento, que é um dos pontos mais discutidos aí dessa nova alteração, representa não só o avanço da conquista de alguns movimentos sociais, mas também é um reflexo da mudança da sociedade, das formas de se relacionar em sociedade”, pontuou.
Para a estudante, que aos 28 anos e sem filhos já faz planos para realizar o procedimento, a mudança representou liberdade de escolha. “O principal benefício mesmo está na autonomia, na liberdade de escolher ter ou não ter filhos e de que forma não tê-los e de essa escolha ser válida sem a permissão, o aval de terceiros”, disse Cristiely.
Entre as regras instituídas pela alteração na legislação de 1996, validadas a partir do ano passado, o advogado listou as principais: “A idade mínima para poder solicitar fazer a laqueadura, antes de 25 anos, hoje é de 21 anos. Outro ponto muito fundamental na mudança é que antes dessa lei era preciso a aprovação do cônjuge. Agora, esse consentimento do cônjuge é totalmente dispensável. Ela pode fazer independentemente se o cônjuge autorizar ou não. Um outro ponto que mudou também é a respeito da laqueadura feita durante o parto, porque antes era proibido, salvo algumas exceções. Hoje já é autorizado”, elencou o especialista.
Outra mudança que a lei trouxe é que o histórico de cesarianas sucessivas anteriores não é mais requisito para a realização de laqueadura tubária durante a cesárea, sendo a esterilização cirúrgica em mulher durante o período de parto garantida, desde que observados o prazo mínimo de 60 dias entre a manifestação da vontade e o parto, além das devidas condições médicas. O advogado esclarece que o prazo de dois meses é uma medida instituída pelo governo para que o procedimento seja realizado com clareza pelas solicitantes. “A intenção disso é evitar que a mulher aja por impulso, pelo emocional, então o governo criou esse prazo mínimo, para evitar possíveis ações futuras adversas à vontade da mulher”, explicou Henrique.
Em Goiânia, o procedimento é realizado gratuitamente pelo SUS em três maternidades: Hospital e Maternidade Dona Iris (HMDI), Maternidade Nascer Cidadão (MNC) e Hospital e Maternidade Municipal Célia Câmara (HMMCC). O diretor-técnico do Hospital e Maternidade Dona Iris, Affonso Honorato, explica como solicitar a realização da laqueadura. “Para a realização a paciente deve procurar uma unidade básica de saúde do seu bairro e solicitar o encaminhamento para unidade que realize. Após a solicitação, a paciente é encaminhada para acompanhamento da equipe de psicologia e serviço de planejamento familiar para garantir que ela tem ciência do ato. Passados 60 dias ela está apta a realizar o laqueadura tubária”, elucidou.
Vale destacar que ao procurar uma unidade básica de saúde para fazer uma laqueadura é necessário apresentar documentos pessoais (RG e CPF), cartão SUS, comprovante de residência e certidão de nascimento, no caso de filhos vivos, para atendimento.
Além da laqueadura, as maternidades municipais de Goiânia também oferecem outros métodos contraceptivos, como a inserção do DIU (Dispositivo Intrauterino) de cobre, que previne a gravidez sem utilização de hormônios e tem durabilidade de até 10 anos. De março de 2023 a março de 2024, foram 2.279 inserções de DIU e 1.137 laqueaduras nas três maternidades municipais.
Procedimentos contraceptivos realizados nas Maternidades Municipais de Goiânia de março de 2023 a março de 2024 | ||||
HMDI | MNC | HMMCC | Total | |
DIU | 863 | 749 | 667 | 2.279 |
Laqueadura | 400 | 366 | 371 | 1.137 |
O ginecologista e obstetra Rogério Cândido, diretor-técnico da Maternidade Nascer Cidadão (MNC), detalha o passo a passo para realização desse procedimento nas maternidades públicas da capital. “O primeiro passo é procurar uma unidade básica de saúde, onde a paciente receberá orientações iniciais sobre métodos contraceptivos disponíveis. Caso opte pela cirurgia de laqueadura tubária, que é irreversível, é necessário passar por avaliações clínicas e psicológicas para garantir que a decisão seja tomada de forma consciente e informada, para então ser encaminhada via regulação da Secretaria Municipal de Saúde (SMS) para o procedimento em uma das maternidades municipais da capital”, orienta Rogério.
Veja abaixo os requisitos para realização da laqueadura pelo SUS: