JOÃO GABRIEL
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O general da reserva Marco Aurelio Costa Vieira terá pela frente o duro desafio de transformar o Ministério do Esporte (ME) em uma secretaria subordinada ao Ministério da Cidadania, chefiado por Osmar Terra, que o nomeou para o cargo nesta quinta-feira (20).
Formado na Escola de Educação Física do Exército, Marco Aurelio tem ligação com pessoas importantes do futuro governo do presidente eleito, Jair Bolsonaro (PSL). Ele, inclusive, já trabalha na equipe de transição.
Não é a primeira vez que um ex-militar assume um alto cargo no esporte brasileiro. O major Sylvio de Magalhães Padilha (1909-2002) foi presidente do Comitê Olímpico Brasileiro (COB) de 1963 a 1988.
O ME foi criado em 1995 pelo então presidente Fernando Henrique Cardoso, com status de ministério extraordinário. Antes disso, existiram diversas secretarias (a primeira em 1937) que cuidavam da política esportiva brasileira, quase sempre subordinadas ao Ministério da Educação.
Em 1998, o ministério extraordinário se tornou-se Ministério do Esporte e Turismo. Em janeiro de 2003, durante o primeiro governo Lula, a pasta foi dividida em duas.
Marco Aurelio cursou a Academia Militar das Agulhas Negras (Aman) na mesma época que o vice-presidente eleito, general Hamilton Mourão, mas em turmas diferentes
Assim como o futuro ministro do Gabinete de Segurança Institucional e conselheiro de Bolsonaro, general Heleno, Marco Aurelio também é “calção preto”, jargão militar para os formados em Educação Física pelo Exército.
Foi Heleno quem, em 2012, o indicou para ser diretor-executivo de operações dos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro, quando foi subordinado a Carlos Arthur Nuzman, ex-presidente do COB.
Nuzman foi afastado das atividades esportivas em 2017, após ser preso acusado de participar de um esquema de compra de votos para que o Rio fosse escolhido sede dos Jogos de 2016. Hoje ele responde às acusações em liberdade.
Marco Aurelio é descrito como alguém que trabalha bem em equipe, tem conhecimento técnico e sabe como funcionam as burocracias estatais. É extremamente metódico, além de ser qualificado como de fácil relacionamento.
Apesar de ter entrado em um cargo de grande destaque e diversas atribuições na Rio-2016 (como supervisionar a relação com comitês, as instalações, cerimônias, transporte, segurança e tecnologia), foi perdendo espaço na organização dos Jogos e acabou como responsável pelo revezamento da tocha olímpica.
Alguns atribuem a queda de Marco Aurelio justamente a seu jeito burocrático e ordenado, que teria feito com que seu ritmo de trabalho fosse mais lento que o necessário. Outros, porém, dizem que foi escolha de Nuzman.
Para a logística e segurança de todo o trajeto da tocha olímpica pelo Brasil, foi importante a boa relação do general com os setores do Exército em todas as regiões do país, sobretudo no Norte. Foram mais de 20 mil quilômetros percorridos pelas cerca de 12 mil pessoas que participaram do revezamento.
Alguns contratempos, no entanto, marcaram o trajeto, como a passagem pela cidade de Angra dos Reis (RJ), quando a carreata foi interrompida por manifestações políticas. Na época, eventos foram cancelados e a tocha foi apagada.
Já em Manaus (AM), o dia de cerimônias terminou com a morte da onça-pintada Juma, de nove anos. O animal, mascote do 1º Batalhão de Infantaria da Selva, participou das solenidades acorrentada. Ao fim do evento, no entanto, a onça tentou escapar e foi morta a tiros. O episódio gerou comoção e um pedido formal de desculpas do COB.
Conhecido como uma pessoa “boa de papo”, Marco Aurelio é elogiado pelo atual vice-presidente do COB, Marco La Porta, por ser “sério, competente e importante” nas tarefas que lhe são atribuídas.
Ricardo Leyser, que foi secretário executivo do Ministério do Esporte e chegou a ser ministro, lembra que o general “nunca deu problema” ao órgão, mas ressalva que os pormenores das atividades do comitê organizador eram de acesso restrito.
O nome de Marco Aurelio foi recebido com surpresa por parte do setor esportivo da política brasileira, tanto no Ministério do Esporte quanto na Câmara dos Deputados.
As preocupações que rondam a nomeação do militar se dão por ele ser alguém que terá pouco poder de se contrapor a decisões do restante do Executivo para defender o esporte, por exemplo, de possíveis cortes de verba.
Marco Aurelio é elogiado por ser capaz de “botar ordem na casa”, porém não tanto por se impor como liderança.
Desde o anúncio de Osmar Terra para Cidadania, o general começou a participar de encontros com o atual ministro do Esporte, Leandro Cruz, envolvendo também outras pessoas para iniciar o processo de transição da pasta.
Atual presidente da Comissão de Esportes (Cespo) da Câmara dos Deputados, Alexandre Valle (PR-RJ) disse ter tido um encontro com Marco Aurelio, com o intuito de iniciar um diálogo e apresentar o trabalho da comissão e o panorama dela atualmente.
“O presidente eleito Jair Bolsonaro tem feito escolhas de pessoas técnicas dentro da sua área e perfil”, declarou.
O ex-velejador Lars Grael demonstrou apoio ao futuro secretário. “Muitas vezes o gestor vem para o esporte sem ter conhecimento anterior, enquanto ele já demonstra um conhecimento”, disse.
Já o lutador de taekwondo Diogo Silva discordou e defendeu o que o secretário deveria ter um bom diálogo com o setor educacional.
“Ter uma pessoa que não obtêm o conhecimento nem a articulação necessária para liderar o esporte demonstra nossa fragilidade”, declarou.
O vice-presidente da Comissão Nacional de Atletas, Virgilio de Castilho, ex-atleta do triatlo, opinou a favor do general, mas fez um alerta.
“Vamos reclamar, abrir o bico e tentar, de certa forma, dialogar. Nós temos espaço conquistado para isso”, disse.
Marco Aurelio tem extensa carreira no Exército. É doutor em ciências militares com ênfase em logística e gestão, e já ocupou diversos cargos de comando, como a chefia do Gabinete do Estado-Maior.
Foi um dos braços direitos do general Heleno quando este chefiava a ação militar brasileira no Haiti, funcionando como interface de apoio no Brasil. Chegou a ser cotado para assumir as forças de paz das Nações Unidas.
Em 2010, teria se envolvido em um escândalo de licitação fraudulenta divulgado em agosto deste ano pelo jornal El Pais, com documentos obtidos pela plataforma BrasilLeaks e denúncia feita pelo coronel da reserva Rubens Pierrotti.
Tanto Marco Aurelio quanto Mourão estariam envolvidos no caso. Ao jornal, Mourão negou as acusações e disse que iria processar Pierrotti por difamação.
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