O tenente-coronel Mauro Cid, que foi ajudante de ordens do ex-presidente Jair Bolsonaro, contou em depoimento no Supremo Tribunal Federal que estava se referindo ao ex-presidente e a generais da reserva que também estão sob investigação, quando afirmou, em áudios divulgados pela revista Veja, que todos estavam se dando bem e ficando milionários. “[No áudio] O senhor afirma que todos se deram bem, ficaram milionários. Quem são essas pessoas?”, perguntou o desembargador Airton Vieira.
O magistrado é instrutor do gabinete do ministro Alexandre de Moraes, à frente do inquérito. Cid, lhe respondeu: “Estava falando do presidente Bolsonaro, que ganhou Pix…, dos generais que estão envolvidos na investigação e estão na reserva”.
Na sequência, Cid reclamou que perdeu tudo. “A carreira está desabando”, assinala no depoimento, cuja íntegra foi liberada por Moraes depois de determinar a volta do ajudante para a prisão. Cid foi preso novamente por “descumprimento das medidas cautelares e por obstrução à Justiça”.
Coaf mostrou valores recebidos por Bolsonaro que Cid citou
Conforme lembrou o portal Congresso em Foco neste sábado (23), relatório do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) mostra que Bolsonaro recebeu R$ 17,2 milhões por meio de Pix, de janeiro a julho de 2023. Eram doações feitas por apoiadores para o ex-presidente pagar multas dele à Justiça.
Além disso, aponta o site especializado na cobertura dos assuntos políticos, Bolsonaro aplicou em renda fixa os recursos, que extrapolam muito os valores cobrados pela Justiça.
Enquanto isso, Mauro Cid afirmou no Supremo que foi abandonado. Disse até que os amigos o tratam como um “leproso”, com medo de se prejudicarem quando, para o militar, essas pessoas deveriam apoiá-lo.
Mauro Cid reclama de Bolsonaro e nega pressão para delatar
Pouco antes de ser preso pela segunda vez, na sexta (22), Mauro Cid reafirmou, em depoimento ao desembargador, o conteúdo de sua delação premiada. Nesse depoimento, negou o que afirmou nos áudios, que tinha sido coagido para delatar e encaixar suas acusações na “narrativa” da Polícia Federal e de Alexandre de Moraes.
Ao magistrado, Mauro Cid disse que não sofreu pressão. Disse que os áudios enviados por ele a um interlocutor fazem parte de um “desabafo” e uma “conversa particular”. O ex-ajudante de ordens de Bolsonaro alegou que não se lembra de quem era o interlocutor. Agora ele corre o risco de perder os benefícios da delação.
Confira alguns trechos do depoimento de Mauro Cid (veja a íntegra disponibilizada pelo Congresso em Foco):
– Frustrado em relação ao presidente Bolsonaro, generais e sua própria situação, ele afirma que Bolsonaro e generais da reserva se “deram bem” e ficaram “milionários”.
– Lamenta que está recluso em casa, sem vida social e não trabalha.
– Cita que os áudios divulgados pela revista Veja eram apenas um “desabafo” e que não houve pressão para que prestasse seu depoimento.
– Diz que não se lembra para quem fez o “desabafo”, feito provavelmente por telefone celular.
– Garante que só tem contato com seu círculo próximo, que inclui amigos, amigos militares e amigos da equitação e que a exposição midiática prejudica suas relações. E que não tem contato com políticos ou pessoas do Judiciário.
– Afirma que está enfrentando problemas financeiros e familiares e que está perdendo tudo que tem.
– Alega que está prestes a ser promovido a outra patente e está sensível devido a isso.
– Nega que foi forçado a falar qualquer coisa pela Polícia Federal e garante que o seu depoimento foi para fechar lacunas em uma linha de investigação.
– Afirma que quer retomar sua vida normal e sente falta de apoio e sustentação de outras pessoas.
– Reafirma o teor de sua delação e o desejo de levá-la adiante.
Desmaio
Mauro Cid voltou a ser preso logo após esse depoimento. Ao receber a ordem de prisão, chegou a desmaiar.
Por enquanto, o STF ainda não divulgou se vai anular ou manter a delação premiada feita pelo ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro. Nas gravações divulgadas pela revista, Mauro Cid diz ter sido pressionado em depoimentos à PF a delatar acontecimentos dos quais não tinha conhecimento ou “o que não aconteceu”. Afirma ainda que a Procuradoria-Geral da República e o ministro Alexandre de Moraes têm uma “narrativa pronta” e só aguardam o momento certo de “prender todo mundo”.
O STF apura que a gravação da conversa tenha sido realizada de forma combinada entre ele e outros investigados pela Corte.
O áudio pode resultar na anulação da delação de Cid, que foi homologada por Alexandre de Moraes em setembro do ano passado. Foi por meio da homologação que ele conseguiu a liberdade provisória.
Versão da defesa
Em nota ao portal Congresso em Foco, a defesa de Mauro Cid não negou a autenticidade dos áudios e disse que as falas “não passam de um desabafo em que relata o difícil momento e a angústia pessoal, familiar e profissional pelos quais está passando, advindos da investigação e dos efeitos que ela produz perante a sociedade, familiares e colegas de farda”. A
Além disso, a defesa ainda negou que o militar tenha criticado a atuação de autoridades nas investigações sobre ele. Também não vê que as falas possam ter algum impacto sobre o acordo de delação premiada fechado entre o tenente-coronel e a Polícia Federal.
Leia mais sobre: Bolsonaro / Mauro Cid / Polícia Federal / STF / Brasil / Política