Brasília – O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva vai ajudar na articulação política do governo com o Congresso, na tentativa de reverter a animosidade entre o PT e PMDB após a vitória de Eduardo Cunha (RJ) para o comando da Câmara. Na conversa de mais de duas horas com Dilma, anteontem, em São Paulo, Lula sugeriu a ela que convoque uma reunião com governadores e prefeitos, em apoio às medidas de ajuste fiscal, e acertou um cronograma de encontros que terá em Brasília.
Após o carnaval, Lula vai se reunir com o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), com o líder do PMDB na Casa, Eunício Oliveira (CE), e com a bancada de senadores do PT. Na sua avaliação, o Palácio do Planalto precisa agir rápido para evitar que a fratura na base aliada se aprofunde e a tese do impeachment ganhe força, no rastro do escândalo de corrupção na Petrobras, que culminou com outra CPI para investigar o desvio de dinheiro na estatal.
Desde que assumiu a presidência da Câmara, no dia 1.º, derrotando o petista Arlindo Chinaglia (SP), Cunha impôs uma série de reveses ao governo, do Orçamento impositivo ao comando da comissão que vai tratar da reforma política, entregue à oposição. Depois de aplanar o terreno com o PMDB no Senado, Lula também pretende conversar com o próprio Cunha.
Nova estratégia
Para enfrentar o boicote ao ajuste fiscal, Lula disse a Dilma que ela deve adotar uma “nova estratégia”. A tática de reação ao cerco político também está passando pelo crivo do marqueteiro João Santana.
No diagnóstico do ex-presidente, Dilma deve chamar uma reunião com governadores e prefeitos, com o objetivo de explicar as iniciativas tomadas para “pôr a economia nos trilhos” e angariar apoios para a votação das medidas impopulares no Congresso, como o endurecimento das regras de acesso ao seguro-desemprego e ao abono salarial.
Na conversa com Dilma, Lula lembrou que fez isso no primeiro ano de governo, em 2003, quando queria aval para a reforma da Previdência.
A proposta de o ex-presidente, porém, foi ouvida com muitos “senões”. Embora ciente de que precisa dos governadores e prefeitos para aprovar o ajuste fiscal no Congresso, Dilma resiste a promover o encontro com eles agora, por temer que todos cheguem a Brasília “com o pires na mão”.
Lula argumentou, no entanto, que é necessário outra abordagem do ajuste, como parte da chamada “batalha da comunicação”. Não foi só: insistiu em que o diálogo é a única forma de vencer as barreiras erguidas até mesmo pelo PT, por movimentos sociais e pelas centrais sindicais.
Fora do gabinete
Para melhorar a imagem do governo, hoje deteriorada, Lula sugeriu a Dilma que saia do gabinete no Planalto e retome as viagens pelo País. O ex-presidente acha que ela deveria aproveitar seus discursos para explicar à população, de forma didática, e com exemplos da “vida real”, a importância do combate imediato às fraudes que existem na concessão dos benefícios trabalhistas. A ideia é mostrar que o governo está agindo para que as irregularidades acabem, e não para retirar direitos a duras penas conquistados.
As viagens e as conversas “olho no olho” com a população são, na opinião de Lula, um importante antídoto contra a queda de popularidade de Dilma. No receituário para sair da crise, o ex-presidente também aconselhou Dilma a visitar obras em andamento, com o objetivo de mostrar que o governo não está parado, a reboque de crises políticas e econômicas.
Para Lula, a presidente tem de reagir logo porque não pode esperar as manifestações de 15 de março contra o governo federal, organizadas pela oposição, quando haverá bandeiras pelo impeachment.
Além de dizer que Dilma deve ir às ruas para defender sua gestão, Lula acha que sua afilhada política também precisa retomar as viagens ao exterior.
Para ele, quando se enfrentam problemas domésticos, os parceiros internacionais com investimentos no País têm interesse em ajudar na reversão das expectativas negativas, porque não querem ver seus projetos minguarem.
Obama
Antes de se despedir do padrinho, Dilma garantiu a ele que fará a viagem aos Estados Unidos, para se encontrar com Barack Obama, no segundo semestre. A visita de Estado deveria ter sido realizada em outubro de 2013, mas foi cancelada após a revelação de espionagem feita pela Agência Nacional de Informação daquele país a ela, a seus auxiliares e a empresas brasileiras.
Para Lula, a presidente precisa “capitalizar” o apoio internacional que o Brasil tem para driblar o atual momento de fragilidade. Dilma concordou.
(Estadão Conteúdo)