23 de dezembro de 2024
Goiânia • atualizado em 21/06/2020 às 21:14

Liminar suspende abertura de empresas em Goiânia

Marlene Bueno: Falta de evidências científicas para abertura de empresas em Goiânia (foto divulgação)
Marlene Bueno: Falta de evidências científicas para abertura de empresas em Goiânia (foto divulgação)

A liminar foi concedida pelo Juiz Claudiney Alves de Melo em ação movida pela Promotora de Justiça Marlene Nunes Freitas Bueno e declara a “nulidade do Decreto Municipal 1.187/2020” que autorizou a abertura de vários segmentos de empresas a partir desta segunda, 22. O documento foi assinado pelo prefeito Iris Rezende na quinta, 18, e publicado na sexta, 19. (VEJA A DECISÃO ABAIXO)

A decisão foi publicada às 18h16 e por volta de 21h00 a Prefeitura de Goiânia já estava notificada. “A Procuradoria Geral do Município informa que acaba de ser notificada sobre a liminar da justiça suspendendo o decreto 1.187, de 19 de junho de 2020. Eventuais medidas administrativas e judiciais serão estudadas e discutidas junto ao Chefe do Poder Executivo para definição das providências”, informou a assessoria de imprensa da administração municipal.

O principal motivo para a ação, segundo a Promotora, foi a ausência dados técnicos para sustentar a abertura. “O decreto pautou-se dentro da competência da municipalidade, mas sem cuidar da necessária fundamentação em elementos de ordem científica, a cargo do COE”, escreve o juiz, na decisão, em consonância com os argumentos do MP.

“A flexibilização prevista no Decreto nº 1.187/2020 não está amparada nos critérios técnicos, antes, pelo contrário, posiciona-se na contramão das medidas que deveriam ser tomadas diante da altíssima taxa de ocupação dos leitos de UTI, porquanto, na data da publicação do decreto, a ocupação dos leitos SUS de UTI alcançava 95%. Dessa forma, a reabertura de parte do comércio prevista para o dia 22/06/2020, segunda-feira, representa ameaça grave ao controle da pandemia”, escreve Bueno na petição inicial, acatada pelo juiz.

A promotora ressalta que “os indicadores do COE foram desprezados e eles não autorizariam a forma de abertura prevista no decreto, pois não leva em conta indicadores essenciais à preservação da vida”. Bueno alerta que dados divulgados pela Secretaria Municipal de Saúde acerca da situação epidemiológica no Município de Goiânia revelam que há tendência de vertiginoso crescimento do número de infectados pela COVID-19 no Município de Goiânia e, consequentemente, da demanda por leitos hospitalares de Unidade de Terapia Intensiva (UTIs) exclusivos para pacientes diagnosticados com o novo coronavírus.

O secretário de governo, Paulo Ortegal, foi ouvido no inquérito instaurado pela Promotora no sábado, 20,

DECISÃO:

MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS, através da Promotora de Justiça MARLENE NUNES FREITAS BUENO, ajuizou Ação Civil Pública com Pedido Liminar em face de MUNICÍPIO DE GOIÂNIA, todos devidamente qualificados, pelas razões fáticas e jurídicas elencadas a seguir.

Expõe o autor que a presente demanda tem por objeto a declaração de nulidade do Decreto Municipal n° 1.187/2020, que autorizou a reabertura de setores da iniciativa privada cujas atividades haviam sido suspensas visando o enfrentamento e prevenção da pandemia da COVID- 19.

Narra que o ato questionado padece de vício de forma, na medida em que não se sustenta sob evidências científicas e análises sobre as informações estratégicas de saúde, nos termos exigidos pela Lei Federal n° 13.979/2020 e pelo julgado da ADI 6341 pelo Supremo Tribunal Federal.

Aduz que compete ao Centro de Operações de Emergência em Saúde Pública (COE), órgão técnico-científico instituído por meio do Decreto Municipal n° 736/2020 e da Portaria n° 102/2020 da Secretaria Municipal de Saúde, a deliberação sobre modificações/alterações nas medidas de enfrentamento da proliferação da doença, de acordo com a evolução do cenário epidemiológico, todavia o plano de retomada das atividades econômicas aprovado por referido órgão, no dia 15.06.2020, não foi levado em consideração para a elaboração do decreto impugnado.

Aponta que também incide vício de motivo sobre o ato fustigado, pois a retomada das atividades autorizada pelo Poder Executivo Municipal, no atual cenário de crescimento do número de casos de contaminação pelo novo coronavírus e de elevada taxa e ocupação de leitos hospitalares, tanto na rede pública quanto na rede privada, vai de encontro ao interesse da coletividade.

Requereu liminarmente, em sede de tutela antecipada, a suspensão dos efeitos do Decreto n° 1.187/2020, com fixação de multa diária no valor de R$5.000,00 (cinco mil reais) para a pessoa do Prefeito de Goiânia em caso de descumprimento da decisão.

Ao final, postulou a procedência dos pedidos de declaração de nulidade do Decreto n° 1.187/2020 e de condenação do Município de Goiânia à obrigação de observar as deliberações do COE em antecedência às restrições e flexibilizações do isolamento social. Juntou documentos (evento 1).

Decido.

Numa análise detida da petição inicial e da documentação anexa, cumpre asseverar que se encontram presentes os requisitos da probabilidade do direito e do perigo de dano, justificadores da concessão da liminar pleiteada.

Senão vejamos.

Estando reservado ao Judiciário a aferição apenas regularidade formal de atos da Administração Pública, tem-se que o Decreto Municipal n. 1.187, de 19 de junho de 2020, pautou-se dentro da competência da municipalidade, mas sem cuidar da necessária fundamentação em elementos de ordem científica, a cargo do Centro de Operações de Emergência em Saúde (COE), instituído pela Portaria n° 102/2020 da Secretaria Municipal de Saúde.

Essa necessidade de fundamentação em elementos científicos, consiste em norma extraída da Lei 13.979/2020, aplicável não só para limitar eventuais excessos do Poder Público contra os cidadãos, preocupação do início das medidas de restrição, mas também para evitar excesso dos Administradores contra a sociedade, agora que chegada a hora definir protocolos de retorno seguro às atividades de comércio e prestação de serviço (interpretação teleológica).

Com efeito, o Decreto Municipal n° 736/2020, que declarou situação de emergência em saúde pública no Município de Goiânia e dispôs sobre medidas de enfrentamento da pandemia provocada pelo novo coronavírus (COVID-19), assim dispôs em seu art. 4°:

Art. 4o Fica instalado o Centro de Operações de Emergência em Saúde – COE-GOIÂNIA- COVID-19, coordenado pela Secretaria Municipal de Saúde, para monitoramento da emergência em saúde pública declarada.

Parágrafo único. Compete ao COE-GOIÂNIA-COVID-19 modificar/alterar as medidas referentes ao enfrentamento da proliferação do COVID-19, de acordo com a evolução do cenário epidemiológico. Grifei.

Da leitura de referido texto normativo, depreende-se que eventual endurecimento ou flexibilização das medidas adotadas pelo Poder Executivo Municipal no combate ao alastramento da pandemia da COVID-19 deveria passar previamente pelo crivo técnico do Centro de Operações de Emergência em Saúde (COE), instituído através da Portara n° 102/2020 da Secretaria Municipal de Saúde, formalidade que não chegou a ser observada na edição do Decreto ora questionado, conforme se vê da respectiva fundamentação.

Em suma, o decreto ora questionado deixou de observar formalidade prevista em Lei Federal, e também em Portaria instituída pela própria Municipalidade, acarretando vício formal que justifica a suspensão de seus efeitos.

DIANTE DO EXPOSTO, defiro o pleito liminar para determinar a suspensão dos efeitos do Decreto Municipal n. 1.187, de 19 de junho de 2020.

Intime-se e cite-se a parte requerida, preferencialmente pela via eletrônica.

Sendo necessária a realização de diligência presencial, cópia desta servirá de mandado/ofício, nos termos do Provimento 02/2012, da Corregedoria-Geral da Justiça.

Cientifique-se o Ministério Público.

Encerrado o período do plantão, providencie-se a distribuição ao Juízo competente para prosseguimento do feito.

Goiânia-GO, 21 de junho de 2020.

Claudiney Alves de Melo JUIZ PLANTONISTA (assinado digitalmente)


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