29 de agosto de 2024
Empreendedorismo

Jovem goiano resgata moda dos anos 80 ao investir em fabricação de shorts para homens

Humberto Carvalho, de 35 anos, criou a ELSTK, produzindo as peças do zero em Goiânia
Modelo Daniel Sampaio (sentado), ao lado do criador da ELSTK, Humberto Carvalho (em pé). (Fotos: Itas Pato)
Modelo Daniel Sampaio (sentado), ao lado do criador da ELSTK, Humberto Carvalho (em pé). (Fotos: Itas Pato)

A indústria da moda é uma das áreas que estão sempre em ascensão, principalmente em Goiânia, considerada um dos principais polos no Brasil. Essa área, quando unida ao empreendedorismo, faz muitos negócios darem certo. Foi o que aconteceu com o goiano, publicitário por formação, Humberto Carvalho, de 35 anos, que depois de uma década trabalhando com publicidade e marketing em São Paulo, decidiu voltar às suas raízes e criar a ELSTK, sua própria marca de shorts com peças inspiradas nos anos 80.

Em entrevista ao Diário de Goiás, Humberto contou sobre como o negócio surgiu. “Minha história de mudança de carreira envolveu autoconhecimento e moda como política, já que, a partir de um momento, o ritmo de trabalho alucinante e as relações abusivas me levaram a um esgotamento físico e mental, o famoso Burnout. Isso foi em 2016 e, depois desse primeiro esgotamento e sem saúde mental para continuar, comecei a repensar minha vida profissional e o que eu faria dali em diante”, introduziu.

O agora empresário, que ajuda a confeccionar seu produto do zero, afirmou que sua rede de amigos e familiares ajudou no processo de mudança. O ponto chave, contado por Humberto, foi quando, em uma viagem para Berlim, capital da Alemanha, ele teve a oportunidade de ver e viver experiências artísticas, culturais e políticas, em uma cena de clubes e festas de música eletrônica, que estão há décadas institucionalizadas naquele lugar.

“Essas vivências diziam respeito principalmente às liberdades do corpo, gênero e sexualidade, algo que aqui no Brasil infelizmente nos destacamos da forma mais perversa possível, sendo o país que mais mata pessoas Trans e Travestis e de todo o espectro da sigla LGBTQUIAP+) no mundo, segundo dados atualizados do Grupo Gay da Bahia (GGB) em parceria com a Aliança Nacional LGBTI+. Foi lá em Berlim que vi uma variedade enorme de roupas e acessórios de fetiche, mas teve uma peça que mais me chamou a atenção: os Shorts “masculinos”. Me apaixonei”, contou Humberto.

O artista afirmou que chegou da Europa obcecado na ideia dos shorts e pensou que criar e confeccionar uma marca própria, com sangue 100% brasileiro era o que ele iria fazer. “Desenvolvi o projeto do que seria a Elstk (Elástica), que começou pelo nome e criação de marca e, em 2018, iniciei a
busca por fornecedores e parceiros de produção, o que seria desde então o maior desafio”, lembrou.

Humberto, porém, disse que não encontrou os fornecedores que procurava em São Paulo, encontrando apenas no início de 2020, por coincidência, ou não, em Goiânia, sua cidade natal. “A dificuldade de quebrar alguns parâmetros de gênero e do mercado local de confecção para os shorts, somada ao fato de estar distante do processo de produção, me convenceram a voltar para minha cidade natal e acompanhar tudo de perto. “Voltei para Goiânia em maio de 2020, no início do primeiro ano da pandemia do Covid-19 e os dois anos seguintes foram sem novidades além de muita espera e a torcida por dias melhores”, relatou.

Após os muitos altos e baixos da pandemia, o empresário encontrou dois parceiros em 2022 que o ajudaram a materializar a ELSTK: Raphael Fraga, estilista goiano com marca própria – a @NORproject – radicado em Lisboa, e Washington Gomes, também estilista e modelista piauiense, com ateliê e residência aqui em Goiânia, dono da marca @OPHION.shop, ambos com experiência de mercado e eventos do circuito da moda em seus portfólios, como por exemplo o São Paulo Fashion Week e o Baile da Vogue.

“Mesmo sabendo que não seria fácil, descobri, ainda, que para empreender no Brasil você não precisa só de coragem, você precisa ter uma boa dose de loucura também. Por exemplo, mesmo Goiás sendo considerado um ‘polo de moda’, o que vemos aqui são produções de larga escala, ‘modinha’ e ‘Fast Fashion’, um mercado que aposta pouco ou quase nada em nichos reais, onde temos a oportunidade de ter mais cuidado com a produção das peças, melhor remuneração de toda a cadeia de fornecedores e consequentemente, maior valor agregado”, pontuou Humberto.

Por fim, depois de todos obstáculos, o artista, agora dono da própria marca de roupa afirmou que um dos principais temas da ELSTK é o de resgatar os shorts – como o próprio nome já diz – realmente curtos. Ele reforçou que estas peças se popularizaram na década de 80 e que qualquer um pode se lembrar “dos pais, tios e avós e até mesmo os jogadores de futebol usando essas roupas bem curtinhas”.

Além disso, Humberto lembra, ainda, que o motivo da queda do uso deste modelo de roupa para homens estava intimamente ligada à epidemia da AIDS nos anos 80. “A ‘nova doença’ que na época foi perversamente chamada de ‘câncer gay’ gerou muito estigma e preconceito. Os shortinhos começaram a ser associados aos homens gays e também à epidemia e, quatro décadas depois, com a possibilidade de conviver com o vírus do HIV sem desenvolver a AIDS e com saúde, através do tratamento antirretroviral disponibilizado pelo SUS, o que sobra é a desinformação e o preconceito. Dentro desse propósito, faço da ELSTK uma plataforma de retomada política e cultural da comunidade LGBTQIAP+, e uma ode ao amor-próprio como ferramenta de resistência”, disse.

“A ELSTK é um pulso de expansão, uma provocação ao entendimento de si e do resgate de quem somos – sozinhos, entre quatro paredes ou em conjunto. Conjunto que só funciona quando a expansão transborda em autocuidado e cuidado com o outro”, concluiu Humberto, completando que continua a procura de “parceires costureires”.


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