Após repercussão de casos registrados no Hospital das Clínicas da Universidade Estadual de Campinas, relacionados à hepatite medicamentosa por conta do uso de medicamentos que compõem o “Kit Covid”, especialistas afirmam que há casos de pacientes com lesões no fígado, também no Estado de Goiás, causados pelo uso das medicações.
Em entrevista à Rádio Bandeirantes (820), durante o quadro Saúde em Foco da última quinta-feira (29), o médico hepatologista Rafael Ximenes alegou que a maioria dos pacientes com doenças hepáticas, têm relatado uso de medicamentos para tratamento precoce da Covid-19. “Nós temos visto em consultórios, hospitais, alguns pacientes com lesão no fígado, sugestiva de lesão por medicamento, e que fizeram uso desse chamado Kit Covid, seja no intuito de prevenção ou de tratamento na fase inicial de Covid”, disse.
Apesar de a maioria dos casos registrados no Estado até o momento serem leves, todas situações são preocupantes. “Felizmente a maioria dos casos são leves, não têm relatos de nenhum caso em Goiânia com a gravidade desses de São Paulo, mas de toda forma é um quadro que preocupa. Ele (fígado) sofre um processo de lesão, muitas vezes por inflamação causada por aquele medicamento e, com isso, a gente tem um aumento das enzimas do fígado no sangue. Nos casos mais graves, o fígado pode começar a diminuir sua função, então a pessoa começa a ficar amarela, que é o que a gente chama de icterícia e em casos mais graves até ter repercussão neurológica grave, que é a encefalopatia hepática”, explicou.
De acordo com o hepatologista, os tratamentos vão desde apenas à suspensão dos medicamentos, até o transplante de fígado, em casos mais graves. “Primeiro ponto é suspender as drogas, os medicamentos que possam ser os responsáveis pela lesão, segundo ponto, monitorizar como é que vai ser a evolução do fígado. Muitos casos quando a gente tira o remédio, o fígado se regenera sozinho e a gente não precisa fazer nada. Tem algumas situações em que existem tratamentos, remédios específicos, e pra quem, nesses casos mais graves, que felizmente são raros, transplante de fígado seria o tratamento de cura”, ponderou.
Por se tratar de um assunto polêmico atualmente, pelo fato de não haver comprovação científica da eficácia dos medicamentos para tratamento da Covid-19, além da possibilidade de riscos à saúde, alguns pacientes têm receio em dizer, em um primeiro momento, que fez ou faz uso dos medicamentos. “Acho que como isso já tem sido debatido e algumas pessoas já sabem desse risco, alguns ficam às vezes um pouco receosos de contar e isso, pra gente, a gente estimula muito que eles falem a verdade, porque quanto mais informação tiver sobre o paciente, maior a chance de a gente dar um tratamento efetivo. Mas a maioria acaba relatando, sim, que fez o uso”, afirma Ximenes.
Com relação à hidroxicloroquina, o médico hepatologista afirma que o risco de lesão hepática parece ser bem baixo. Já a azitromicina, ivermectina e até mesmo a vitamina “D”, podem ser mais prejudiciais se utilizadas em doses altas. “Pode acontecer às vezes lesões leves, mas não é algo frequente (hidroxicloroquina). A Azitromicina, ela leva a alteração do fígado em torno de 1 a 2% dos casos. Pode parecer pouco, mas se a gente pensar que às vezes tem milhares, talvez milhões de pessoas usando, passa a ser muito. E isso preocupa a gente. Alguns desses casos podem ser graves”, pontua o especialista.
“Já a ivermectina, até antes da pandemia, era extremamente raro a gente identificar lesão no fígado por essa medicação. E a partir do momento que ela começou a ser usada em dose mais alta, por tempo prolongado, por dias consecutivos, isso passou a aparecer mais. Então nesse caso, parece que depende, sim, do tempo de uso da dose que está sendo utilizada”, ressalta. A respeito da vitamina “D”, o hepatologista alerta: “A gente às vezes pensa que vitamina não tem risco, mas tem sim. O uso de dose excessiva de vitamina D, tem risco inclusive de calcificação de órgãos, e isso gera repercussão para o organismo”.
Diante das observações, Rafael Ximenes destaca ser desnecessário o uso das medicações para tratamento a Covid-19. “A gente tem que ter muito cuidado com o uso dessas medicações e eu acho que é interessante destacar que a maioria delas não tem comprovação de eficácia, nem para prevenção, nem para tratamento, e algumas já tem até comprovação de ineficácia, ou seja, a gente já tem demonstração de que ela não funciona. Então não justifica mais a gente fazer o uso dessas medicações”, ponderou.