O produtor rural goiano enfrentou um ano desafiador em 2023, especialmente o de leite e carne. O aumento de 72% nas importações de leite vindo da Argentina, segundo o balanço anual da Federação da Agricultura de Goiás (Faeg), abalou a cadeia da pecuária de leite. Guerras e fatores climáticos como o El Niño deixam a previsão para 2024 cheia de alertas para o agronegócio goiano.
O contexto do setor é curioso. Isto tendo em vista que, apesar do cenário negativo do Produto Interno Bruto (PIB) Agro do Brasil de 0,7% em 2022, o setor alcançou crescimento de 14,5% em 2023. Mas em Goiás o valor bruto da produção (faturamento) caiu de R$ 101 bilhões em 2022 para R$ 97 bilhões este ano. Foi a primeira queda nos últimos quatro anos.
O balanço foi divulgado nesta quinta-feira em coletiva de imprensa na sede da Faeg. Na oportunidade, o vice-presidente da instituição, Eduardo Veras, fez um apelo para o ministro da Agricultura, Carlos Henrique Fávaro, pela redução das importações de leite argentino.
“O ministro é conhecedor do setor, começou o ano visitando mercados internacionais para abrir para exportações. E lembro que 88% das exportações do PIB goiano são do setor agropecuário”, afirmou Veras. Ele representou o presidente da Faeg, José Mário Schreiner, que sofreu atraso em uma viagem.
“Em relação à pecuária leiteira, não é um problema de Goiás, é nacional, se não for feita alguma coisa essa cadeia vai desaparecer. O leite hoje é a produção de maior impacto socioeconômico. Temos produção nos 246 municípios e, se desestruturarmos essa cadeia, haverá um grande impacto para a economia goiana. E o nosso consumidor sentirá as consequências”, reforçou o vice-presidente da Federação.
Ele continuou fazendo um apelo: “Pedimos medidas internas para proteção da cadeia do leite, para que garantir que ele continue a produzir de forma sustentável e eficiente”.
Os dados da Faeg apontam que o ano foi desafiador porque alto custo de produção causou a queda na rentabilidade. Como no caso do leite, houve cadeias em que a margem foi negativa. Segundo a apresentação, de 2020 a 2023 houve redução de 10,41% na produção de leite, por exemplo. E isso agravou com as importações deste ano.
De todo modo, o setor agropecuário goiano continuou em crescimento. Chegou a 12.7% de crescimento no PIB goiano. “Foi uma safra cheia, com bolso vazio”, definiu Eduardo Veras.
Ele aponta recorde de alto custo de produção devido às tensões geopolíticas mundiais (guerras) incidindo nas cadeias de produção de suprimentos, como da soja. Isto conforme a Federação, tirou rentabilidade do produtor rural.
Em cadeias como a pecuária leiteira, o problema foi maior devido à importação de produtos subsidiados da Argentina. Com importações 72% superiores a 2022, isso “derreteu a rentabilidade dos produtores de leite e está causando desestruturação da cadeia leiteira. Se não for adotada política de apoio, os produtores estão fadados a encerrar atividade”, reiterou.
Mas o balanço apontou que a pecuária de corte também sofreu. O preço médio de 283 reais a arroba em 2022, caiu para 223 reais este ano.
Conforme Veras, o setor teve recorde de abate, com aumento de 18% no corte, provendo também maior abate de fêmeas. Porém ele alerta que isso gera uma interferência no ciclo agropecuário que afetará o fornecimento de carne no futuro, voltando a fazer o preço elevar.
A queda brusca de preço da arroba que ocorreu para o produtor no início do ano, segundo ele, somente agora está incidindo no mercado, gerando uma lacuna de consumo e preços baixos para o produtor. Esse desequilíbrio na relação com o consumidor pode durar dois anos.
A previsão é que, em 2024, se houver a continuidade no aumento de abates, e também aumento no consumo, o mercado vai melhorar. “Neste cenário a tendência é haver carne mais barata para o consumidor e maior rentabilidade ao produtor”.
De todo modo, analisando o ano que está no fim, a Faeg levou em consideração os grandes debates nacionais de temas que influenciam o setor. Um deles foi a reforma tributária que exigiu articulação e expectativa de impacto negativo em Goiás. Outro é o Marco Temporal, sobre o qual o setor espera veto legislativo.
Também há o andamento do Marco Legal dos Pesticidas, que agradou o setor. Além disso, a COP 28 em andamento em Dubai, que conta com representantes da FAEG/CNA.
Essa conjuntura exige acompanhamento do setor tendo em vista os impactos sobre a cadeia agropecuária brasileira e goiana. No caso da COP 28, por exemplo, ele lembra que foi apresentada pela União Europeia uma proposta separada que visa construir barreiras econômicas não-tarifárias, prejudicando o agronegócio do Brasil.
O produtor goiano deve ficar atento em 2024. “Será necessário planejamento e precaução. A principal orientação é que o produtor tenha o custo de produção na mão e busque maior produtividade por metro quadrado em relação aos outros anos para ser mais competitivo e esteja preparado para os impactos climáticos do El Niño”, recomenda o vice-presidente da Faeg.
Ele crê em desaceleração da economia mundial. Também recomenda atenção às adversidades e tendências como tensões geopolíticas, eleições no Uruguai e EUA, além dos impactos da recente eleição na Argentina.
Com chuvas irregulares e localizadas este ano, o plantio está atualmente atrasado e isso trará consequências para a safra de 2024. No momento, cerca de 70% da safra está plantada com atraso.
Isso, estima a Faeg terá interferência na segunda safra, a de milho, porque a janela de plantio está se encurtando. “O resultado será uma menor área plantada com milho, e consequentemente, menor oferta do produto, o que interfere também na pecuária, com redução de oferta de alimentação à base de milho”.