ALEX SABINO
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Nos infelizes 20 dias da seleção argentina na Rússia em junho, Lionel Scaloni era uma das pessoas mais acessíveis da comissão técnica. Era ao auxiliar que os torcedores hospedados no mesmo hotel do elenco antes dos jogos procuravam para perguntar qual era o estado de ânimo de Lionel Messi.
Após o fiasco comandado por Jorge Sampaoli, que jogou sua fama de estrategista e disciplinador no ralo em menos de um mês, o inexperiente Scaloni foi o chamado para assumir a seleção.
A mensagem oficial é que a escolha é interina, apenas até o final do ano. Mas ele nutre a esperança, estimulada pelo presidente da AFA (Associação de Futebol Argentino), Claudio “Chiqui” Tapia, de se tornar permanente.
O argumento de auxiliares da Tápia nos bastidores, um deles ouvido pela Folha de S.Paulo, é que os resultados são bons até agora. Mas contra quem? Sob o comando de Scaloni, a Argentina derrotou Guatemala e Iraque e empatou com a Colômbia.
O maior desafio será nesta terça (16), contra o Brasil, na Arábia Saudita.
É a partida em que Scaloni, auxiliado por jogadores históricos da seleção como Walter Samuel e Pablo Aimar, pode ganhar pontos para continuar.
“Eu gosto desses rapazes. Acho que eles merecem uma oportunidade. Por que não? O que foi feito nos últimos anos com nomes que eram considerados mais experientes deu certo? Não deu”, afirma o zagueiro campeão mundial em 1986 e o hoje comentarista Oscar Ruggeri.
Ele era o capitão no último título da seleção argentina: a Copa América de 1993.
Não que o trio Scaloni-Samuel-Aimar seja o plano A de Tapia. Após a queda no Mundial, eliminação recheada de polêmicas e intrigas de bastidores, o presidente da AFA telefonou para Diego Simeone, do Atlético de Madri (ESP), seu eterno sonho de consumo. Ouviu resposta negativa. Mauricio Pocchetino, do Tottenham Hotspur (ING), também descartou a sondagem.
Tapia considera a volta de Gerardo Martino, que deixou a equipe (sem receber parte dos salários) após a derrota na final da Copa América Centenário, em 2016. Os dois têm bom relacionamento.
Toda a discussão é manchada pelo que Lionel Messi vai fazer no futuro. Como a Folha publicou durante a Copa, funcionários da AFA que estavam na concentração argentina em Bronnitsi se espantaram com o estado emocional do atacante após a perda do pênalti na estreia, contra a Islândia.
Durante todo o Mundial, ele falou apenas duas vezes com a imprensa. Nenhuma após a derrota para a França. Pediu aos dirigentes tempo para pensar e decidiu que neste ano não atua mais pela seleção.
A ausência e os resultados sem ele acenderam de novo a discussão sobre o “clube de amigos” que seria a seleção, comandado por Messi. Algo que o próprio astro e seus companheiros mais próximos no elenco sempre disseram não existir.
É fato que aos poucos, Scaloni tenta implementar uma renovação na equipe. Por enquanto tem sido fácil. Ele não precisa convocar os chamados “históricos”. Jogadores experientes e que fazem parte da “mesa chica” (mesa pequena, em espanhol), que formariam a panela de Messi. Entre Aguero, Higuaín, Di María e Romero, apenas o último deve enfrentar o Brasil. Mascherano se aposentou da seleção.
Interino ou efetivo, Scaloni não se considera uma ruptura com o passado e nem age como tal. Tanto que repetiu todos os seus antecessores. Assim que foi escolhido para a seleção, entrou em um avião e foi conversar com Messi em Barcelona.
O interino não é unanimidade. A Argentina é seu primeiro trabalho como técnico.
“O problema é a perda de tempo. Quem é o treinador? Quem quer que seja, deveria estar preparando o time para a Copa América do ano que vem. Eu escolheria Tata [Martino], Simeone ou [Marcelo] Gallardo. Mas a AFA tem de tomar uma decisão”, reclama o comandante do Huracán, Gustavo Alfaro.
Messi é sombra tamanha sobre o futuro da Argentina que Diego Maradona partiu para o ataque pelo que vê como indiferença do camisa 10 com a seleção.
Para o campeão mundial de 1986 e ídolo maior do próprio Messi, o atual capitão argentino não se comporta como líder e não pode ser visto como tal. E para deixar isso claro fez o ataque mais pesado de um argentino ao jogador cinco vezes eleito melhor do planeta.
“É inútil tentar tornar caudilho alguém que vai 20 vezes ao banheiro antes de uma partida. Não o endeusemos mais. Messi é Messi jogando em Barcelona e Messi é Messi jogando com a Argentina. Mas com a seleção, é apenas um jogador mais.”
Isso vai contra tudo o que acreditaram todos os treinadores que passaram pela seleção argentina nos últimos anos. Inclusive o próprio Maradona, técnico na Copa de 2010, e Lionel Scaloni.