Penso muito em Jesus. Jesus, o filho de Deus. E se você é ateu, tudo bem, desde que o seu espírito esteja em paz. Se não vê espírito algum, tudo bem, se o corpo está são, sossegado. Penso em Jesus de carne e osso. O que viveu e morreu sentindo o que a gente sentia. Amor, raiva, atração física, dor na consciência, dor funda na pele, dúvida, solidão, angústia.
Um pai ensina. Mas, por mais oração que carregue, não consegue livrar o filho de todos os males, se busca tocar-lhe a humanidade. Como Deus pode ser humano sem não ser humano, sem perder sua divindade a não ser como resultado da fé em si mesmo, o ser eterno antes e depois?
Jesus tudo podia, no entanto, nem tudo fez. Por bondade, por lição das coisas, por razão indubitável da fé que criou para nos salvar? As intenções de Jesus são as intenções de Deus. Como podem estar no inferno os bem intencionados? Se mesmo o inferno é criação divina, paterna, própria se todos estamos em Deus, que diabo é este que rivaliza com Jesus, o filho, e com o autor de seus evangelhos, a própria palavra reproduzida a todos como notícia de vida e morte?
Penso em Jesus com os dilemas da escolha. Um copo com água ou uma taça de vinho? Um doce de figo ou um churrasco bovino, animal morto com o dorso de um machado atirado sem piedade na testa? A missa de domingo ou o futebol com os amigos? Salvar um filho ou a mãe exausta sobre a cama do hospital? Deixar a guerra avançar ou colocar-se verdadeiro nas mentes e corações que agem em seu nome levando ao abismo o bom senso, a fraternidade, a alteridade, o choro?
Penso em Jesus pensando em mim. Me encontrando em meio a tantos que existem e já existiram. Penso nele em cada olhar generoso, esbaforido, cego pela distinção de sua presença ali, na hora, pronto para agir. Penso. Penso quantas vezes pode ter acontecido de eu ter-me exaltado por sua atenção e nem ter percebido que ele estava ali, era só tocar sua mão, bastava sair de mim um passo até ele. E penso nas consequências – e nas providências nunca alcançadas.
Penso que ele está, o tempo todo, no meio de nós e que o tempo todo, naquele outro tempo em que viveu, viveu segundo a nossa semelhança. Jesus, como eu, como você, como todos, sentiu a carência e a urgência de Jesus divino. Deus pai que viesse arrancar todas essas almas penadas se debatendo em nosso espírito insensato, cansada, incoerente, para então dar-nos o céu, seja isso o que for, desde que seja a Terra livre do que não é nossa concepção de Deus.
Penso em Jesus humano e penso em mim naqueles dias, com Pedro, João, Mateus, Lucas, ao lado. Penso em Deus e não tenho dúvida: não há história mais perfeita e bela pra se viver. Por ora, não nos resta senão ler o que nem sabemos se mal começou ou se está bem no fim. Eis o milagre de tudo: eu penso, não temo a fé.
Vassil Oliveira
Jornalista. Escritor. Consultor político e de comunicação. Foi diretor de Redação na Tribuna do Planalto, editor de política em O Popular, apresentador e comentarista na Rádio Sagres 730 e presidente da agência Brasil Central (ABC), do governo de Goiás. Comandou a Comunicação de Goiânia (GO) e de Campo Grande (MS).