27 de novembro de 2024
Publicado em • atualizado em 28/05/2018 às 02:16

Governo acelerou anúncio de acordo ciente do risco de que ele não valia

Michel Temer, presidente do Brasil (Foto Divulgação)
Michel Temer, presidente do Brasil (Foto Divulgação)

Temer, por exemplo, não mexeu na agenda de compromissos nos dois primeiros dias de protestos –esteve inclusive em um evento político do MDB para manifestar apoio à pré-candidatura de Henrique Meirelles à Presidência.
Apenas no quarto dia, quinta-feira (24), o governo passou a adotar o discurso da prática de “locaute”, a ação de empresários por trás do movimento.
Na principal reunião sobre o tema, naquele mesmo dia, no Palácio do Planalto, líderes de entidades do setor preveniram o ministro Eliseu Padilha (Casa Civil): não tinham poder de comando sobre todos os manifestantes.
Padilha respondeu que, mesmo assim, era preciso algum anúncio porque o país, nas palavras do ministro, não poderia parar. Assim foi feito. O acordo não foi cumprido pelos manifestantes.
Padilha entrou na história quando a confusão já estava instalada. Ele foi escalado por Temer na quarta (23) para assumir as negociações depois que o presidente, após um café com bispos evangélicos, recebeu alertas sobre o crescimento dos protestos.
Até então, a preocupação estava circunscrita à escalada dos preços dos combustíveis diante da greve. Esse foi o foco de reunião entre Temer e um grupo de ministros no domingo (20), no Palácio do Jaburu, um dia antes do início das paralisações.
Naquele momento, a área de inteligência, sob o comando do general Sérgio Etchegoyen (Gabinete de Segurança Institucional), não previu que a greve poderia paralisar o país, apesar de uma carta da Abcam (Associação Brasileira dos Caminhoneiros) endereçada a Temer ter sido protocolada na semana anterior chamar atenção para esse risco.
“Imagine o Brasil ficar sem transporte por uma semana ou mais? Seria terrível para todos, mas parece que só dessa forma vocês vão voltar seus olhares para as nossas necessidades e reivindicações”, diz o documento assinado pelo presidente da entidade, José da Fonseca Lopes.
Em outubro, a mesma associação havia procurado a Casa Civil para discutir os preços dos combustíveis. “Seria uma loucura imaginar que uma greve possa ser prevista com seis meses de antecedência”, disse Padilha à Folha.
Serviços públicos essenciais, como unidades de saúde, resgate em situações de emergência, transporte de passageiros e policiamento de rua, não haviam sido alertados a tempo pelo Planalto sobre o risco real da greve e, assim, não deram início a nenhum plano de emergência antes que as bombas dos postos começassem a secar.
O governo não conseguiu organizar nenhum plano de contingência. Também demorou a reagir no campo político.
Na segunda (21), os presidentes da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do Senado, Eunicio Oliveira (MDB-CE), assumiram a linha de frente da agenda política ao anunciarem uma comissão para discutir o tema dos combustíveis.
No dia seguinte, o presidente da Petrobras, Pedro Parente, entrou no circuito. Esteve em Brasília com a equipe econômica. Saiu dizendo que não mexeria em hipótese alguma na política de reajuste.
Com o impasse e protestos se agravando pelas estradas, Padilha, então, telefonou para Flávio Benatti, presidente da CNT (Confederação Nacional do Transporte), para que ele sensibilizasse as entidades do setor a aceitar um acordo. Marcaram a reunião de quinta com 11 entidades.
O presidente da Abcam, José da Fonseca Lopes, quarto representante a discursar no encontro a portas fechadas, disse que não estava lá para negociar e deixou o Planalto.
Com a saída repentina dele, os demais representantes do movimento se reuniram separadamente por uma hora. Na volta, titubearam sobre o fechamento de um acordo justamente porque temiam não garantir o seu cumprimento.
Nesse momento, Padilha telefonou para Eunicio Oliveira, a pedido dos manifestantes. Eles queriam um compromisso de que o Congresso aprovaria um projeto de lei sobre fretes. Eunicio não quis assinar o acordo e afirmou que não tinha como dar a palavra de que o texto passaria, mas disse que pautaria o tema.
Os líderes das entidades toparam assinar, sob a condição de que levariam o teor para discussão e aprovação nas estradas.
Após o anúncio feito por Padilha, os grupos de Whatsapp dos caminhoneiros paralisados já indicavam que o entendimento não seria cumprido.
As mensagens, relatadas à reportagem, diziam que os representantes reunidos no Planalto não tinham o respaldo das lideranças regionais.
A ausência de uma liderança única é exatamente, na avaliação de assessores de Temer, o que tem dificultado as negociações. O protesto nasceu de pequenas paralisações em cidades no interior da Bahia, do Rio de Janeiro e de São Paulo e rapidamente se alastrou.
Em São Paulo, começou na cidade de Ourinhos. O diretor do sindicato dos caminhoneiros autônomos do município, Ariovaldo Almeida Junior, conta que a manifestação no interior paulista foi organizada duas semanas antes.
“Procurei outras entidades sindicais autônomas do interior paulista, como de Bauru, Piracicaba e Jaú. Nós elegemos uma liderança para o movimento em cada local”, disse.
Para ganhar adesão fora de São Paulo, dirigiu cerca de 680 km até Volta Redonda, no Rio de Janeiro. Segundo ele, o movimento surgiu da insatisfação da categoria e não tem vinculação política.
Na sexta-feira, a situação nas estradas não mudou. Uma reunião de emergência foi convocada e o ministro Etchegoyen (GSI) assumiu um protagonismo. No sábado (26), sem sinais de uma remissão, o Planalto passou a declarar haver prática de locaute e anunciou a abertura de 37 inquéritos e pedidos de prisão de empresários do setor. (Com texto de GUSTAVO URIBE, TALITA FERNANDES E DANIEL CARVALHO BRASÍLIA, DF E SÃO PAULO, SP Folhapress)

Altair Tavares

Editor e administrador do Diário de Goiás. Repórter e comentarista de política e vários outros assuntos. Pós-graduado em Administração Estratégica de Marketing e em Cinema. Professor da área de comunicação. Para contato: [email protected] .