27 de agosto de 2024
Publicado em • atualizado em 08/07/2020 às 21:41

Cidadão vira às costas para quarentena

Comércio da Avenida Anhanguera no Centro de Goiânia. Foto: Samuel Straioto.
Comércio da Avenida Anhanguera no Centro de Goiânia. Foto: Samuel Straioto.

Ao circular pela circular pela Avenida Anhanguera, em Goiânia, nesta quarta-feira (8) dava-se a impressão daqueles feriados prolongados, com menos gente na rua. Mas na verdade não era essa a realidade, e o que indicava isso eram as faixas de isolamento na porta dos estabelecimentos. Havia menos gente no trânsito e nas calçadas, mas várias pessoas estavam ali, na luta pelo ganha pão. Nada de feriado, mas sim pessoas tentando se encaixar em um “novo normal”, provocado pela pandemia da Covid-19. Alí, percebe-se um sintoma do que acontece na cidade.

Ao longo da Avenida Anhanguera, estabelecimentos que não poderiam abrir estavam com portas bem abertas, como algumas lojas de utilidades, situadas antes e depois do cruzamento com a Avenida Goiás, no sentido Novo Mundo. A pandemia provocou mudança de comportamento, o cafezinho com o pão de queijo, já não pode ser sentado à beira do quiosque, mas de pé e rápido, sem muita prosa.

Enquanto a fiscalização da Prefeitura de Goiânia atuava em Campinas, que contava com a presença do prefeito Iris Rezende em uma acanhada comemoração dos 210 anos do bairro, em um auditório aos fundos da Igreja Matriz, os comerciantes relutavam em permanecer fechados e alguns se arriscavam abrindo as portas dos estabelecimentos. Um olho no gato, outro no peixe, ou melhor um olho no cliente, outro no fiscal e na polícia.

Próximo à Rua 6, no centro, uma grande loja de eletrodomésticos abriu uma porta, na entrada estavam vendedores de celulares e fiscais do estabelecimento. Do outro lado da descuidada Avenida Anhanguera, cartão postal negativo no meio da cidade, asfalto ondulado, grades sujas ou quebradas, um verdadeiro retrato do abandono, aberta uma fresta de uma loja de tecidos para área de Cama, Mesa e Banho, cliente não entra, mas pode levar o produto.

De modo geral, as pessoas usavam máscaras, o que é importante durante a pandemia. Ambulantes saíram às ruas em busca do sustento, mas faltava ordenamento e organização, principalmente na região da Praça do Bandeirante.  Vale ressaltar que o ordenamento neste ponto não é culpa da pandemia, mas de uma falta de organização histórica da Prefeitura de Goiânia que há anos sequer realiza concursos para fiscais de posturas. Mas deixemos este debate para outro momento.

A quarentena intermitente 14 x 14 não chegou ao objetivo esperado, ou seja com meta de isolamento social acima de 55%. O governador Ronaldo Caiado (DEM), sempre faz questão de lembrar que Goiás já ocupou a primeira colocação do país. No começo da quarentena houve uma adesão da população, mas agora à situação é diferente. O vírus está aí, rondando, ativo. Há riscos, o sistema de Saúde, cada vez mais cheio.

Por outro lado, às pessoas estão cansadas, preocupadas, inseguras, incertas com o “hoje” e mais ainda com o “amanhã”. A quarentena não funcionou, parece apenas um feriado prolongado. 37,3% é o índice de isolamento social, considerado baixo. Na prática, não funciona. O #Ficaemcasa não cola para quem vê os boletos acumularem e transbordarem na caixa do Correio. Muitos que erguem as vozes para defender tal situação estão seguros, que bom, mas nem todos.

Existe o cenário ideal e o real. O ideal era que houvesse um distanciamento maior. Os estudos científicos mostram isso, e o cenário é extremamente preocupante. Mas a pandemia mostra que os governos não foram preparados para serem de fato um governo, para dar segurança social a população, em um momento tão difícil da história contemporânea da humanidade.

 Na União, falta uma coordenação nacional, um presidente inconstante como uma folha ao vento, pra lá e pra cá, que minimiza o problema, quando se requer todo cuidado possível. Medidas demoram a ser tomadas pela União. Um auxílio emergencial que não chega a todos que precisam, e muitos que não precisam receberam o que poderia ser um alívio para tantos lares. No Estado, a grande reclamação do setor produtivo foi a falta de diálogo, faltou um equilíbrio entre a Saúde e a Economia, faltou o discurso chegar à ponta da população. No Município, o questionamento em muitos momentos foi a falta de critério para determinadas atividades e a ousadia para manter protocolos, garantindo a Saúde e mantendo os empregos.

Aqui também não podemos esquecer do judiciário. As decisões não podem ser apenas na frieza da lei, liminares no fim de noite, aos finais de semana, que pegam as pessoas de surpresa e que mexem com a vida da população. A meu ver não cai bem. É preciso a sensibilidade não baseada na frieza do mundo refrigerado, nas casas confortáveis dos desembargadores e juízes, já que estamos na era do Home Office, mas das coisas reais que afetam diretamente a vida das pessoas.

A quarentena 14×14 melhorou os índices, mas não funcionou na sua plenitude. As pessoas estão nas ruas, essa é uma realidade e não há como fugir. Uma reabertura não pode ser de qualquer jeito e nem tudo de uma vez. Assim como nos primeiros dias, em que o cidadão abraçou a quarentena, os gestores precisam ter habilidade, conscientizando as pessoas do risco da doença, que não é uma gripezinha, mas uma doença que tem matado muita gente, destruindo famílias, histórias, sonhos. Não é momento de festas, mas de um breve distanciamento. O governador Ronaldo Caiado e o prefeito Iris Rezende voltaram a mesa para discutir e precisam ter sensibilidade do que pode ser aplicado no mundo real.