Argumentando falta de transparência e um “apagão” na fiscalização do orçamento, a Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) ingressou na quinta-feira (25) com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade no Supremo Tribunal Federal (STF) questionando a legalidade das chamadas “emendas Pix”, no modelo “transferência especial”. A emenda Pix é uma emenda individual que pode ser usada por deputados e senadores para destinar verbas públicas. A Abraji também pediu liminar suspendendo os repasses temporariamente.
A associação aponta na ADI 7688 que essas emendas não seguem os critérios adequados de fiscalização e transparência e mesmo assim já somam R$ 20 bilhões dos cofres da União desde 2020. Com base no que diversos jornais revelaram, a Abraji cita as barreiras para fiscalização adequada das emendas.
A organização justifica que as emendas parlamentares individuais no modelo de “transferência especial” dificultam a comprovação da necessidade e o rastreamento da aplicação dos recursos.
Situação de gravidade aparece no SIOP
“Em consulta ao SIOP (Sistema Integrado de Planejamento e Orçamento), estruturante do Governo Federal que oferece suporte ao Orçamento e ao planejamento federal, é possível verificar a gravidade da situação. Ao buscar na base de dados, a União já transferiu, efetivamente, mais de 15 bilhões de reais em emendas individuais por transferências desde 2020, e empenhou mais de 20 bilhões ao todo”, afirma a petição da Abraji.
Advogados argumentam impedimentos ao controle
O escritório que representa a Abraji nesta ação é Márlon Reis e Estorilio. O ex-juiz Márlon Reis é um dos autores da Lei da Ficha Limpa do Brasil. O outro advogado é Rafael Estorilio. Entre os pontos cruciais levantados pela assessoria jurídica, a emenda Pix impede que o Executivo possa fazer o controle da execução financeira e da prestação de contas desse tipo de repasse de dinheiro.
Como funciona
Na emenda PIX, o valor é enviado diretamente ao cofre da prefeitura ou governo local indicado sem a necessidade de apresentar projeto, ou apontar em qual área aplicar a verba. Funciona como uma doação que atualmente não se consegue rastrear, devido à ausência de regras claras.
As emendas PIX foram criadas em dezembro de 2019, com a Emenda Constitucional 105, sob o argumento de facilitar e acelerar o repasse a estados e municípios. A execução e fiscalização dessas verbas fica descentralizada, o que faz a União perder o controle de como esses recursos foram gastos. Assim, causa grave opacidade ao sistema de fiscalização orçamentária, prejudicando a transparência necessária ao escrutínio público.
“A ausência de convênios e outros instrumentos formais de repasse impede a rastreabilidade dos fundos, dificultando a fiscalização e a garantia de que os recursos estão sendo utilizados de maneira adequada e eficiente, resultando na simples mixagem de todas as contas do ente favorecido”, explica a petição protocolada pela Abraji.
Supremo já declarou inconstitucionalidade de casos parecidos
A Ação Direta de Inconstitucionalidade proposta pela Abraji encontra paralelo em decisões recentes do STF, que apontaram a inconstitucionalidade do “orçamento secreto” e de determinadas emendas parlamentares. “Nesses casos, o STF identificou que a falta de transparência e controle na destinação de recursos públicos compromete gravemente os princípios constitucionais da publicidade, moralidade, eficiência e legalidade administrativa, conforme previsto no artigo 37 da Constituição Federal”, afirma o texto protocolado.
Associação pede que ministro Flávio Dino seja relator
A petição inicial proposta pela Abraji pede que, por prevenção, a ADI seja relatada pelo ministro do STF Flávio Dino. O motivo é que ele é o relator das ações que questionam outro tipo de emendas parlamentares, como as do orçamento secreto, uma vez que há uma conexão entre os temas.
A Abraji lembra que na ação sobre o orçamento secreto, o ministro Flávio Dino determinou a realização de uma audiência de conciliação no dia 1º de agosto, com representantes dos poderes Legislativo e Executivo. A intenção é encontrar soluções que levem ao fim da falta de transparência demonstrada em reportagens da imprensa, que levou o STF a declarar a inconstitucionalidade dessas emendas em dezembro de 2022.
Conforme a Abraji, no despacho que determinou essa audiência, Dino salientou que “para analisar a conformidade constitucional das “emendas PIX”, é necessária a provocação desta Corte em ação própria”. Conforme a associação sua ADI vai justamente ao encontro dessa necessidade.
Abraji pediu liminar para impedir emendas PIX até julgamento
Em seu pedido, a organização requer também uma medida cautelar de suspensão do artigo 1º da Emenda Constitucional nº 105/2019. A intenção é que a liminar impeça a prática da emenda Pix até o julgamento da ação.
A associação justificou seu interesse no processo destacando que, entre os pilares da Abraji, está “a luta pelo acesso à informação e a busca pela transparência pública, essenciais para o bom exercício do jornalismo e para a manutenção do estado democrático de direito”. A Abraji coordena atualmente o Fórum de Direito de Acesso a Informações Públicas, organização atuante há 20 anos, que reúne dezenas de organizações comprometidas com a democracia.
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