O mês de setembro é historicamente o que mais registra incêndios florestais no Brasil. E 2017 não é diferente. Nas últimas semanas, por exemplo, o fogo causou estragos no Parque Estadual do Araguaia, em Mato Grosso, e na Serra dos Pirineus, em Goiânia. Em Minas Gerais, a Serra do Rola Moça viu mais de mil hectares serem consumidos pelas chamas. Incêndios atingem também terras da aldeia indígena Bacurizinho, no Maranhão.
De acordo com o monitoramento feito por satélites pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), houve apenas três ocasiões desde 1998 que os registros de queimadas no mês de setembro foram superados. Em duas delas, agosto contabilizou mais incêndios e, na outra, outubro. Em 2017, já se pode afirmar com segurança que setembro vai superar agosto. Mesmo estando no meio do mês, já foram registrados mais de 44 mil focos, contra 49 mil de todo o mês passado.
O monitoramento por satélites do Inpe integra o Ciman Virtual, um sistema vinculado ao Centro Integrado Multiagências de Coordenação Operacional e Federal. Ele reúne, em tempo real, informações, fotos e detalhes do combate aos incêndios. Essa diversidade de dados é fornecida por diversos órgãos federais, entre eles, o Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), a Fundação Nacional do Índio (Funai), a Polícia Federal e as Forças Armadas.
A explicação para os meses de agosto, setembro e outubro serem tradicionalmente os mais críticos está no clima. Diversos estados registram neste período de estiagem as menores taxas de umidade relativa do ar. Mas, apesar das condições naturais serem favoráveis à ocorrência e propagação de queimadas, elas têm origem na ação humana.
“Incêndios naturais são decorrentes de raios. Assim, é praticamente certo que as queimadas que se concentram nos dias mais secos e quentes são provocadas pelo homem, por negligência, imperícia, imprudência ou mesmo por dolo”, informou em nota a Secretaria de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável de Minas Gerais (Semad).
Na explicação da Semad, incêndios naturais são mais comuns na primavera e até mesmo no verão, quando há ocorrência de raios. Estações, segundo o órgão ambiental, em que a umidade relativa do ar está alta e, em alguns casos, “a vegetação ainda guarda bastante umidade, o que torna as chamas menos intensas e as consequências normalmente muito brandas”.
Entre as formas de começar um incêndio por ação humana, a Semad cita fogueiras mal apagadas, limpeza de pastagens com fogo, queima de restos de folhas ou lixo, uso de foguetes. Há ainda os casos intencionais.
Em Minas Gerais, há registros de queimadas vinculadas a disputas fundiárias, a atos de vandalismo, a ações de retaliação e a prática de caça, acrescenta a secretaria. Até mesmo incêndios causados por crianças já foram registrados. “Nos meses de agosto a outubro, qualquer pequena fagulha pode se tornar um grande incêndio potencializado pela ação dos ventos”, informa também o Corpo de Bombeiros de Minas Gerais.
O Artigo 41 da Lei Federal 9.605/1998, que trata dos crimes ambientais, estabelece que o ato de provocar uma queimada florestal é punível com pena de dois a quatro anos de reclusão e multa de R$ 3.489,64. Se o ato não for intencional, é caracterizado como culposo, com pena de seis meses a um ano, além da multa.
No dia 28 de agosto uma guarnição de bombeiros, que estava de prontidão na Serra do Rola Moça, prendeu três homens em flagrante, suspeitos de atear fogo dentro da unidade de conservação. Um deles foi indiciado por crime ambiental.
Segundo dados da Secretaria de Administração Prisional de Minas Gerais (Seap), sete pessoas estão atualmente detidas no estado enquadradas no Artigo 41 da Lei Federal 9.605/1998. O Corpo de Bombeiro de Minas Gerais estima que, no caso específico das unidades de conservação, 99,9% de todas as queimadas ocorrem por causa humana.
Alguns estados têm legislações complementares. Em Mato Grosso, esse tipo de crime é também punível conforme decreto estadual que permite ao governo estabelecer anualmente um período de restrição ao uso do fogo para limpeza e manejo de áreas rurais. Este ano, ele começou em 15 de julho e vai até 30 de setembro, podendo ser prorrogado em razão das condições climáticas. Infratores estão sujeitos a uma pena de seis meses a quatro anos de prisão e autuações que podem variar entre R$ 7,5 mil e R$ 1 mil por hectare.
Focos de calor
O Corpo de Bombeiros de Mato Grosso tem se esforçado para orientar a população a adotar medidas simples, como evitar jogar guimbas de cigarro às margens de rodovias ou dentro dos parques, não colocar fogo em lixo e não realizar queimadas para limpeza de lotes vagos.
“Em alguns municípios do estado, não chove desde o final de junho. E estamos vendo a ação desastrosa e criminosa do homem, que emprega indevidamente o fogo neste período crítico”, diz o tenente Paulo André Barroso, comandante do Batalhão de Emergências Ambientais do Corpo de Bombeiros.
Apesar da preocupação, o estado vem contabilizando menos incêndios em comparação com 2016. De 1º de janeiro a 10 de julho de 2017, Mato Grosso registrou 6.151 focos de calor, volume 18% inferior ao contabilizado no mesmo período do ano passado, quando foram registrados 7.497 focos de calor.
Já em Minas Gerais, o volume de incêndios nesta época do ano supera o registrado no ano passado. Segundo o Corpo de Bombeiros, somente no interior ou arredores das unidades de conservação estaduais, foram registrados de janeiro a agosto 385 ocorrências de focos de calor. No mesmo período de 2016, houve 364 ocorrências. Focos de calor são alterações na superfície terrestre que indicam grande possibilidade de ocorrência de fogo, mas que não são necessariamente um incêndio, podendo ser uma queima controlada ou ainda um falso alerta.
A manipulação inadequada do fogo traz riscos não apenas para o meio ambiente, mas também para o responsável muitas vezes dentro de sua própria propriedade. Dados do Corpo de Bombeiros de Minas Gerais mostram que, dos 5,7 mil chamados recebidos em 2016 relacionados com incêndios em vegetação, 3,3 mil diziam respeito a lotes vagos. Outros 93 eram ocorrências dentro de unidades de conservação estaduais e o restante envolvia outras áreas de vegetação.
Unidades federais
O ICMBio, responsável pela gestão das unidades de conservação federais, avalia que vem conseguindo aprimorar o trabalho e reduzir o impacto dos estragos. “Desde o início do ano, foram afetados cerca de 350 mil hectares no interior de unidades de conservação federais. Em anos anteriores, secos como 2017, a média aproximada foi de 500 mil hectares”, disse Christian Berlinck, coordenador de combate e prevenção de Incêndios do órgão.
Segundo ele, uma estratégia de maior planejamento aliada ao melhor conhecimento do tema vem tornando as ações mais eficientes. Por outro lado, ele avalia que os resultados poderiam ser melhores não fosse o contexto de crise econômica. “Na atual situação, os recursos financeiros são um entrave. Com mais recursos, a possibilidade de contratação de maior efetivo e mais equipamentos seriam maiores”.
Berlinck avalia que dificilmente o Brasil vivenciaria uma tragédia similar ao que ocorreu em junho em Portugal, quando mais de 60 pessoas morreram carbonizadas em uma estrada que atravessa uma área florestal que estava em chamas.
“A vegetação passível de queima nos dois países é diferente. Aqui, o fogo é normalmente de superfície e subterrâneo. Não é de copa de árvores, como ocorreu em Portugal. Além disso, no caso das unidades de conservação federais, a maioria dos incêndios não são periurbanos e ocorrem longe das vilas”.
De toda forma, no combate ao fogo na Serra do Rola Moça, o governo de Minas Gerais não hesitou em interromper o trânsito na estrada que corta a unidade de conservação. “A pressão para liberação da via foi intensa e bastante hostil. Mas uma estrada com labaredas elevadas e veículos circulando são os ingredientes para uma tragédia. O caso de Portugal e tantos outros em diversos países devem ser sempre lembrados”, informou a Semad.
Com informações da Agência Brasil
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