12 de agosto de 2024
Brasil • atualizado em 13/02/2020 às 01:37

“Só quero ter ele nos meus braços”, diz pai de bebê atingido por bala perdida no Rio

Klebson da Silva, 27, no dia em que registrou seu filho, vítima de bala perdida / Foto: Custodio Coimbra
Klebson da Silva, 27, no dia em que registrou seu filho, vítima de bala perdida / Foto: Custodio Coimbra

Ao registrar seu filho nesta segunda-feira (3) no cartório do Hospital Municipal Moacyr do Carmo, em Duque de Caxias (RJ), Klebson da Silva, 27, se permitiu um sorriso contido. Algumas horas antes, recebera dos médicos a notícia de que Arthur, seu filho, vítima de bala perdida antes mesmo de nascer, estava em estado de saúde estável, ainda que grave.

A mãe de Arthur, Claudineia dos Santos Melo, 29, foi atingida na barriga na tarde da sexta-feira (30), a caminho do supermercado, na entrada da favela do Lixão, na cidade da Baixada Fluminense.

De acordo com a Polícia Militar, agentes haviam acabado de fazer uma operação na favela quando, na saída, foram alvo de tiros. A PM diz que não houve revide. Grávida de nove meses, Claudineia passou por uma cesariana de emergência, e os médicos descobriram que o tiro também ferira o bebê.

“Estamos torcendo para que ele se recupere. Só quero ter ele nos meus braços, disse Klebson. A bala perfurou os dois pulmões de Arthur e atingiu duas vértebras da coluna, por isso o bebê respira por aparelhos e está paraplégico.

Mas, para o neurocirurgião Eduardo França de Aguiar, que também é diretor do hospital, há chance de o quadro ser revertido.

Claudineia, por sua vez, segue internada, mas passa bem e está lúcida. Não sabe que o filho pode ficar paraplégico. “Ela está muito fragilizada. Chora, pergunta pelo filho. É melhor dar a notícia aos poucos. Foi o pedido do pai”, diz a psicóloga do hospital, Verônica Pereira.

O diretor do hospital onde Arthur nasceu conta que nunca tinha visto caso parecido. “Foi um milagre o menino ter sobrevivido”, disse o secretário municipal de Saúde de Duque de Caxias, José Carlos de Oliveira.

Claudineia e Klebson são migrantes da Paraíba. “Viemos para dar uma vida melhor para os familiares, diz ele.

Claudineia, que vive no Rio há cerca de cinco anos, é de Lucena, município de 12 mil habitantes na região metropolitana de João Pessoa. Klebson é de Natuba, município de 10 mil habitantes a cerca de 100 km da capital. Claudineia é da segunda geração de sua família a trocar a Paraíba por Caxias em busca de emprego.

Ela é tesoureira em um supermercado na zona sul do Rio. Ele é conferente de estoque em um frigorífico em São João de Meriti, também na Baixada Fluminense.

Por medo de retaliação, Klebson prefere não comentar a situação de segurança da cidade onde vive. Por ora, não pensa em se mudar. “Não consigo pensar nisso agora, só em fazer minha mulher e meu filho melhorarem.”
crise na segurança

Claudineia e Arthur entram para uma estatística que não para de crescer no Rio, a de pessoas atingidas por balas perdidas. Levantamento feito pela Folha indica que pelo menos uma pessoa foi atingida a cada dois dias na região metropolitana em 2017.

Com o Estado em crise, o Rio vive descontrole na segurança. O número de mortes violentas subiu 16% de janeiro a maio deste ano, em relação ao mesmo período do ano passado –de 2.528 para 2.942.

Historicamente, a Baixada Fluminense, onde Claudineia foi baleada, concentra parte expressiva da criminalidade no Estado. Na região metropolitana como um todo, os conflitos entre facções, entre facções e milicianos e entre criminosos e policiais têm sido muito frequentes.

Especialistas em segurança pública dizem que não é de hoje a tendência de agravamento da situação e apontam um conjunto de explicações. Entre elas, estão o abandono de políticas que davam certo, como o sistema de metas para as polícias, e a falta de correção de rumo em programas como o das UPPs (Unidades de Polícia Pacificadora).

A crise financeira do Estado agravou a situação. Não há recursos para contratar PMs aprovados em concurso. Policiais não receberam o 13º salário de 2016 nem o adicional por atingir metas e pelo trabalho na Olimpíada. A corporação também denuncia o mau estado de equipamentos.

Enquanto isso, a família de Arhur tenta manter as esperanças. “A gente não quer que o que aconteceu com a nossa família aconteça com outras”, diz Walter Melo, 27, primo de Claudineia. “Não queremos ser mais um caso.”

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