22 de novembro de 2024
Cidades • atualizado em 12/10/2020 às 18:19

Sem receita, empresas de transporte coletivo de todo Brasil defendem novo modelo tarifário para melhoria do sistema

Otávio Cunha ressalta medidas importantes à serem adotadas para o transporte público sobreviver
Otávio Cunha ressalta medidas importantes à serem adotadas para o transporte público sobreviver

A Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos (NTU) em relatório divulgado na última terça-feira (06/10) revelou alguns dados preocupantes com relação ao transporte coletivo urbano, por exemplo, a crise aguda que o setor passa ao deixar de realizar 32 milhões de viagens por dia no auge da pandemia. Em entrevista concedida ao jornalista Altair Tavares, do Diário de Goiás, o presidente da associação Otávio Cunha, atentou que o novo coronavírus apenas escancarou um problema já crescente: entre 2013 e 2019, a queda da demanda no transporte coletivo foi de 26%, enquanto o período de 1994 à 2012, 25%. “Já existia um desequilíbrio econômico quando chegou a pandemia”, pontuou. A entrevista na íntegra você poderá acompanhar ao final desta matéria. 

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Otávio traça um histórico do transporte coletivo no Brasil, mostra problemas existentes, mas também aponta possíveis soluções. A proposta de criar outras fontes de receitas é uma delas e talvez a mais importante: “Vamos ser realistas: a tarifa jamais remunerará daqui para frente e já não estava remunerando antes, adequadamente um bom serviço de transporte”, ressaltou. 

Por isso, é fundamental que se pense em receitas extra-tarifárias onde o transporte individual financie o coletivo. “É buscar fontes extra-tarifárias para bancar esse serviço. Que saia do orçamento municipal, estadual e federal. Que venha pela taxa de licenciamento paga. A verdade é que o transporte individual que deve financiar o transporte coletivo. Essa máxima é aplicada no mundo todo. Ninguém resolveu o problema de mobilidade urbana sem investir no transporte público coletivo. Essa alternativa de remuneração por quilômetro, é a solução que dará sustentabilidade para o transporte público no país”.

Otávio reforça que este proposta é defendida tanto por empresas como por titulares das pastas municipais que cuidam do setor do transporte local. “Eu diria que esta alternativa ela é hoje objetivo de consenso entre todas as empresas e também entre todos os secretários de transportes que são responsáveis pela organização do serviço nos municípios. Porque como a demanda caiu muito nos últimos anos você não consegue mais equilíbrio na atividade”, salienta.

Revisão contratual de concessão pública às empresas

Otávio também salienta que uma forma de tentar vislumbrar uma solução no transporte coletivo é a reformulação dos contratos de concessão entre o poder público e as empresas. Ele explica que os contratos vigentes são de ‘concessão comum’ e quando eles foram instituídos, funcionavam bem, mas o contexto mudou e ‘a conta não bate mais’. “Na concessão comum, o risco de demanda é de quem opera, no tempo que tinha muita demanda, a conta fechava, hoje, já não fecha mais, então precisa ser modificado e existem na própria lei, você tem a questão das PPPs, a concessão patrocinada. Na concessão patrocinada coloca o poder público que é delegatário do serviço a obrigação de dar sustentabilidade ao serviço”, explica.

Cunha utiliza o modelo de concessão adotada pelas empresas que operam nas rodovias estaduais e federais. “Você tem a garantia do equilíbrio econômico do serviço seja pela tarifa que você cobra e se essa tarifa não é suficiente, existe um fundo garantidor desse serviço ter continuidade que é o caso das concessões de rodovia que funciona muito bem neste país. No dia que não tiver funcionando bem, a rodovia, o concessionário entrega o serviço e está encerrado o assunto. Hoje, se nós quiséssemos entregar o serviço não tínhamos condições porque não tinha ninguém para operar”, explica.

Crise no transporte público: cenário catastrófico

A pandemia agravou a crise no transporte coletivo. De acordo com dados do RedeMob Consórcio da última sexta-feira (09/10) a demanda em Goiânia ainda está 54,10% menor do que antes dos decretos de isolamento social serem estabelecidos pelos governos estadual e municipal. O anuário da NTU revela que a capital goianiense não é a única a ser assombrada pela queda histórica. Houve uma perda diária de 1,2 milhões de viagens realizadas por passageiros pagantes em todo o país, o equivalente a uma queda de 3,7% da média de viagens (288,3 milhões) dos meses de abril e outubro do ano passado, em comparação com os mesmos meses de 2018.

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Neste cenário catastrófico, Cunha revela que empresas deixaram de funcionar. “Já existia um desequilíbrio econômico quando chegou a pandemia. Essa situação se tornou extremamente preocupante, várias empresas já fecharam no Brasil, outras estão em processo de recuperação judicial, outras que vão ser desativadas até o final deste ano”, enfatizou.

Em Salvador, a situação chegou ao ponto de um consórcio de empresas composto por 800 ônibus entregarem o serviço à Prefeitura. “Porque as empresas que compunham esse consórcio, não tinham mais condições de operar. Essa situação é uma realidade que se explica pela falta de investimento e de política estruturando para o transporte público neste país”, explicou.

Ao jornalista Altair Tavares, o presidente da NTU, Otávio Cunha faz um retrospecto do cenário do transporte coletivo no Brasil

Otávio explica que desde a extinção da Empresa Brasileira de Transportes Urbanos (EBTU), no governo do então presidente da República, Fernando Collor (1990-1992) o transporte público “nada se fez neste sentido [buscar melhorias para o transporte]”. Tanto os governos anteriores como o atual, sob a batuta do presidente Jair Bolsonaro não tiveram “nenhuma atuação mais proativa na definição dessas políticas. Então, o setor com a pandemia, nós tivemos a necessidade de ofertar 50% e tivemos uma queda de demanda de 80%.”

As pessoas não sentem-se seguras em sair de casa, avalia Otávio. E isso impacta diretamente no transporte coletivo. “Eu acredito mesmo que a gente só terá paz total em relação à esse espectro da pandemia. Dessa doença, nós só teremos um pouco de paz e mais seguros para retomar plenamente nossa atividade no dia que tiver uma vacina, que esteja comprovada que pode imunizar a população no mundo todo. Enquanto isso não acontecer, certamente a gente está vendo isso, todas as atividades econômicas sofreram e estão se recuperando muito lentamente. O nosso setor, continua operando com defasagem entre receita e custo”, estabelece.

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Ele utiliza o exemplo de Brasília para ilustrar o tamanho da crise. “Há um desequilíbrio portanto e está na ordem seguinte: entre 80% de oferta de serviço ou 100% de oferta de serviço como aqui em Brasília. Brasília tem 100% de oferta de serviço e está transportando 39% da demanda. Na média nacional, nós estamos abaixo dos 50% da demanda histórica e ofertando serviço 75, 80, 100%. O desequilíbrio continua”, pontua. Enquanto a demanda diminui consideravelmente, impactando na receita, a oferta de veículos continua igual para a população. A conta não bate.

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Senado trava ajuda para empresas sobreviverem à crise

“O presidente Alcolumbre [Davi, DEM] se recusa a pautar esse projeto, que o governo é a favor porque a origem desse projeto veio de governo e agora estão falando que o governo está contra, isso é uma mentira. Um absurdo o que estão fazendo

Aprovado pelo Congresso Federal, uma ajuda de socorro emergencial de aproximadamente 4 bilhões de reais que seria dado aos municípios repassarem às empresas de transporte coletivo para dar um fôlego para sobreviverem à crise está travado no Senado Federal. “O Governo sinalizou uma ajuda emergencial de 4 bilhões de reais que ajudaria muito o setor a sobreviver emergencialmente. O projeto de lei foi aprovado na Câmara e está travado no Senado. O presidente Alcolumbre [Davi, DEM] se recusa a pautar esse projeto, que o governo é a favor porque a origem desse projeto veio de governo e agora estão falando que o governo está contra, isso é uma mentira. Um absurdo o que estão fazendo”, ressalta.

Otávio ressalta que apesar das alterações feitas pelos deputados federais, o que saiu de lá e foi encaminhado para o Senado Federal acaba sendo bom para as empresas, mas Alcolumbre tem feito resistências em apresentar o projeto para votação. “O governo já se manifestou várias vezes que é a favor até porque o projeto nasceu dele. Houve alterações na Câmara, mas o que saiu de lá é um projeto bom que ajuda e dá indicativos aos municípios, aos executivos municipais que têm a responsabilidade de organizar o transporte público de buscar soluções estruturantes à ele.”

Assista a entrevista na íntegra:


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