O Projeto de Lei da Dosimetria, que busca reduzir o tempo de prisão de condenados pelos atos golpistas de 8 de janeiro, já eleva as tensões no Senado e deve enfrentar, paralelo, um relatório separado, alternativo. Já na pauta da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) e do Plenário de quarta-feira (17), o texto é criticado por senadores que fazem eco a juristas.
Eles apontam falhas estruturais na proposta, aprovada na madrugada do dia 10 pela Câmara dos Deputados, e alertam para consequências graves como lacunas legais que podem beneficiar outros crimes. O PL da Dosimetria foi alvo de protestos nacionais no domingo (14).
Um dos críticos no Senado é o senador e delegado de Polícia Civil Alessandro Vieira (MDB-SE), que classificou o projeto como “tecnicamente insustentável”. Ele é o relator do PL Antifacção na Casa e vê conflito nos objetivos das duas matérias que caminham em sentidos opostos.
“Vou apresentar voto em separado pela rejeição total do projeto, buscando a construção de soluções técnicas para o tema”, anunciou o senador nas redes sociais dele.
Vieira alerta que o texto enviado pela Câmara afrouxa o tratamento penal de forma generalizada, contrariando o discurso político que justificou sua aprovação na Câmara. “O texto do PL da Dosimetria carrega vícios insanáveis, em especial por afrouxar o tratamento penal para crimes diversos daqueles declarados pelos deputados”, enfatizou ele.
O tipo de relatório paralelo que Vieira pretende apresentar é conhecido no Congresso como voto em separado e só será votado se a CCJ rejeitar o relatório do senador Espiridião Amin (PP-SC).
Alessandro Vieira ainda não detalhou quais mudanças pretende propor se isso ocorrer. O risco de redução generalizada de penas, lembra o senador, não é o único problema do PL da Dosimetria.
Ele também considera queo texto original indiretamente cria novos tipos penais, o que pode gerar conflito com o PL Antifacção, já aprovado pela Casa. No sentido inverso, o PL Antifacção endurece regras da Lei de Execução Penal no combate ao crime organizado e ainda será reanalisado pela Câmara dos Deputados.
O PL da Dosimetria foi direcionado para atender politicamente os condenados do 8 de janeiro, inclusive o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). Entretanto, da forma açodada como foi apresentado e a rapidez com que tramitou, terá um alcance mais permissivo e significativamente mais amplo.
A proposta nasceu a partir do projeto de anistia defendido pela oposição, mas foi reformulada ao longo de meses de negociação para tratar formalmente apenas da redução de penas. Sua tramitação ocorreu em momento de enfrentamento de parte da Câmara com o Supremo Tribunal Federal (STF) que avança na investigação sobre desvios de emendas parlamentares, irritando congressistas.
A maior controvérsia do PL da Dosimetria foi a alteração do artigo 112 da Lei de Execução Penal, que regula a progressão de regime. Pelo texto aprovado, a progressão passa a ser, como regra geral, permitida após o cumprimento de um sexto da pena. Percentuais mais elevados ficam restritos a exceções específicas, como crimes hediondos, feminicídio, milícia e delitos cometidos com violência ou grave ameaça previstos nos Títulos I e II do Código Penal.
Para agravar, o projeto cria uma multiplicidade de faixas que também tornam a aplicação desigual entre estados e tribunais.
Dessa forma os críticos apontam que o texto cria brechas relevantes e amplia a sensação de impunidade. O motivo é que, crimes que não aparecem entre as exceções, serão automaticamente enquadrados na regra mais branda. Um exemplo está em alguns dos chamados crimes sexuais, por exemplo os atos libidinosos sem violência ou grave ameaça que não são crimes hediondos e, pelo projeto, poderão ter progressão mais rápida do que a atualmente aplicada, livrando os condenados antes. Na mesma linha, os crimes de corrupção e contra o meio ambiente.
A expectativa no Senado é que Amin faça ajustes no texto sobre esses pontos críticos, entretanto, a intenção de esgotar o assunto na Casa antes do fim do período de sessões, que é esta semana, pode levar a outro texto que não corrija essas lacunas ou até gere outras.
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