A apreensão do passaporte de Ronaldinho Gaúcho e Assis, seu irmão e empresário, é uma decisão extrema em uma ação de crime ambiental. A medida, tomada na última quarta-feira, é característica de processos criminais. Mas o pedido do Ministério Público foi acatado mesmo se tratando de um processo cível porque a Justiça entendeu que houve descaso do ex-jogador.
Em 2015, Ronaldinho Gaúcho foi condenado a demolir as obras feitas em um terreno de Porto Alegre, localizado em área de preservação permanente. Ele também teria de pagar uma multa de R$ 800 mil. Já naquela época, a juíza Fernanda Carravetta Vilande apontava descaso por parte dos irmãos. Na sentença, ela escreveu que houve “desprezo à legislação e aos agentes públicos e, inclusive, ao comando judicial proferido (os réus, simplesmente, ignoraram a ordem antecipatória, sequer tendo apresentado contestação ou justificativa de qualquer espécie), fixo o valor de R$ 800 mil a título de indenização por danos ambientais”.
Esta condenação ocorreu três anos e oito meses atrás e, até agora, ele e Assis não cumpriram a sentença. “Os sujeitos responsáveis pela dilapidação do meio ambiente estão a se esquivar há longa data do cumprimento de suas obrigações legais”, escreveu o desembargador Newton Fabrício, integrante da 1ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, que tomou a decisão.
O fato de a apreensão dos passaportes ser determinada pelo Tribunal de Justiça significa que é uma decisão da segunda instância. O processo está em andamento desde 2012 e se baseou em uma investigação que começou em 2009. A apuração indicou a construção de um trapiche de 142 metros que começava nas margens do Lago Guaíba, Zona Sul de Porto Alegre, e invadia a água em 70 metros.
No final, havia uma plataforma para atracar barcos e uma de pesca. Ocorreu ainda a canalização de 110 metros de um riacho, a construção de duas pontes no local e pavimentação da margem esquerda do lago. O terreno onde tudo aconteceu pertencia ao Teresópolis Tênis Clube e foi comprado por Ronaldinho.
O UOL Esporte ligou para Assis diversas vezes durante a tarde e o começo da noite de sexta-feira e todas as chamadas foram encaminhadas para a caixa postal.
APREENSÃO DE PASSAPORTE
Esta não foi a primeira vez que o Ministério Público solicitou a apreensão do passaporte de Ronaldinho Gaúcho e Assis. Em 16 de janeiro deste ano, o juiz Ramiro Oliveira Cardoso avaliou a retenção deste documento ou da carteira de motorista dos réus. O argumento para não aceitar foi o fato de se tratar de uma medida característica de ações criminais.
“Indefiro o requerimento de depósito em juízo do passaporte e/ou carteira nacional de habilitação até o adimplemento da dívida por implicar o pleito em interdição temporária de direitos, espécie de medida restritiva, equiparável, portanto, a pena criminal”, escreveu o juiz da 3ª vara cível.
O processo em que Ronaldinho e o irmão foram condenados também determina o pagamento de indenização de R$ 8,5 milhões. O valor alto é uma atualização do montante estipulado na decisão de 2015. Na ocasião, a Justiça fixou indenização de R$ 800 mil, deu prazo de seis meses para as obras serem demolidas e multa diária de R$ 100 mil em caso de descumprimento do prazo. Também consta da decisão da última quarta-feira não permitir a emissão de nenhum documento em nome dos réus.
Além dos dois irmãos, a empresa que construiu o trapiche e canalizou o riacho também foi condenada. Trata-se da Reno Construções e Incorporações Ltda. O UOL Esporte tentou contato em dois telefones e as ligações não foram atendidas.
FISCAIS BARRADOS
O descaso não é algo que ocorreu somente depois da sentença. Em todo o período, a Justiça apontou falta de colaboração de Ronaldinho e seu irmão. Em um trecho do despacho do juiz de primeira instância, Mauro Caum Gonçalves, foi mencionada a proibição de fiscais entrarem na propriedade onde ocorreu o crime ambiental.
“Também está comprovado, através dos documentos que os demandados (réus) efetuaram as obras referidas na inicial sem prévia licença ambiental e sem a realização de estudo de impacto ambiental, tendo sido, inclusive, impedida a entrada, em certa oportunidade, da equipe de fiscalização na área degradada”.
Mas ainda assim a investigação ocorreu porque vários vizinhos fizeram denúncias. O inquérito constatou que Ronaldinho e Assis foram avisados que a construção do trapiche e a canalização do rio caracterizavam crime ambiental.
“Todavia, ignoraram todas as advertências administrativas, tendo prosseguido na conclusão das obras, sem prévia licença ambiental e sem autorização dos órgãos responsáveis, conforme informação emitida pela Secretaria Municipal do Meio Ambiente”, aponta um trecho da decisão do juiz de primeira instância.
As advertências foram repetidas durante dois anos e ainda assim Ronaldinho e o irmão prosseguiram com as obras. A apreensão do passaporte pode complicar os negócios de Ronaldinho, que constantemente está viajando por causa de ações de patrocinadores. Na quinta-feira, ele estava no Japão cumprindo compromissos.
Para se ter uma ideia da rotina do ex-jogador, o lançamento da camisa que a seleção brasileira usou na Copa da Rússia teve Ronaldinho Gaúcho como principal atração num palco montado na Avenida Paulista, em São Paulo. No backstage, repórteres de todo o país pediam entrevista a Assis.
Era março e o empresário de Ronaldinho Gaúcho abriu a agenda do celular mostrando que no mesmo dia o irmão viajaria com destino a Ásia, África e Europa para compromissos de patrocinadores. Eles voltariam somente depois da final da Copa.
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