A reforma política aprovada pelo Congresso irá facilitar a debandada de eleitos por partidos nanicos.
Políticos de siglas que não atingirem o mínimo de votos estipulados pelas novas regras eleitorais poderão mudar de legenda, sem risco de perda do mandato.
Uma cláusula de desempenho instituída pela reforma veta o repasse de recursos públicos do fundo partidário e o acesso gratuito à propaganda no rádio e na TV aos partidos que não conseguirem em 2018 pelo menos 1,5% dos votos válidos nacionais para a Câmara dos Deputados. Em 2030, o patamar chegará a 3% dos votos válidos.
Tomando como base a eleição de 2014, um levantamento da Folha apontou que 14 das 32 agremiações existentes na época não ultrapassaram o piso inicial de 1,5% dos votos.
A brecha aberta agora para a migração partidária, portanto, seria uma forma de compensar candidatos vitoriosos que poderiam ter sua atuação prejudicada por restrições impostas a seus partidos.
“Essa possibilidade faz sentido no cenário de transição que viveremos nos próximos anos. Com a cláusula de desempenho, muitos deputados terão suas carreiras ameaçadas. Então a licença para trocar de sigla é útil para configurar uma nova realidade”, avalia Diogo Rais, professor da Faculdade de Direito da Universidade Presbiteriana Mackenzie.
Para Walber de Moura Agra, procurador de Pernambuco e coautor de “Elementos de Direito Eleitoral”, a medida gera algumas distorções.
“Sou contrário a ela, mesmo com a permissão normativa. Isso enfraquece os partidos políticos, quando precisamos densificá-los.”
Na prática, é comum que eleitos por partidos nanicos busquem alternativas para migrar para os de maior porte, em busca de condições mais vantajosas de atuação.
Dos 25 deputados federais que se elegeram em 2014 por siglas que não atingiram 1,5% dos votos válidos, 18 mudaram de grupo. Foram beneficiados sobretudo por uma janela excepcionalmente aberta pelo Congresso em 2016 que autorizava as migrações durante um mês daquele ano.
Embora irrisórias diante do total de 513 deputados na Câmara, as 18 desfiliações tiveram forte impacto em suas agremiações. Quatro siglas nanicas perderam todos os seus eleitos na casa: PSDC, PMN, PRTB e PTC.
“Essa nova brecha erra ao proteger um mandato específico, e não os partidos, não a pluralidade do sistema. A sociedade precisa de mais representação política na Câmara”, diz Carlos Massarollo, presidente do PMN.
Justa causa
Nos últimos anos, o troca-troca nos partidos vem sendo barrado por leis mais rigorosas. Decisão do Supremo Tribunal Federal estabeleceu que nos cargos do sistema proporcional (vereadores, deputados estaduais e federais) o mandato pertence ao partido. A desfiliação, com algumas poucas exceções, implicaria a perda do posto.
Uma lei de 2015 define como “justa causa” para a troca apenas três hipóteses: grave discriminação pessoal; desvio reiterado do programa partidário por parte das siglas; ou que a mudança seja efetuada durante o período de 30 dias que antecede o prazo final de filiação exigido em lei (seis meses antes do pleito) para concorrer ao pleito.
A brecha introduzida agora pela reforma política em relação aos nanicos cria uma espécie de quarta justa causa.
“Isso é um absurdo, é premiar a infidelidade”, contesta José Maria Eymael, presidente do PSDC, partido que perdeu para o Podemos seus dois deputados federais eleitos em 2014. “Não há motivo para trocar de sigla. Mesmo com todas as restrições, um bom político não será prejudicado. Se tiver capacidade e desejo, não há barreira.”
O deputado Carlos Andrade (PHS-RR) tem opinião contrária. Manteve-se fiel ao partido nanico pelo qual se elegeu em 2014, mas não descarta mudar de casa se for reeleito sem que o PHS atinja o mínimo de votos exigidos.
“Não adianta ser um zumbi durante o mandato, sem participação efetiva. Com o corte do fundo partidário, os deputados serão muito prejudicados na comunicação com as bases de seus Estados”, considera. (Folhapress)
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