O protesto organizado por centrais sindicais e movimentos sociais contra as reformas previdenciária e trabalhista, pela saída do presidente Michel Temer e por eleições diretas transformou a Esplanada dos Ministérios, em Brasília, em um palco de batalha com a Polícia Militar e a Força Nacional nesta quarta (24).
Policiais militares deram tiros com armas letais na direção dos manifestantes. A Secretaria de Segurança do Distrito Federal informou que abrirá inquérito para investigá-los. “Esse procedimento não é o adotado”, afirmou.
Sete ministérios depredados, dois incendiados e 49 feridos -entre eles um manifestante baleado, um estudante de Santa Catarina que teve a mão decepada por um rojão e oito policiais- são alguns dos números do ato, que reuniu 45 mil pessoas, segundo a PM, ou 150 mil, de acordo com organizadores.
Por decreto, válido até o próximo dia 31, Temer convocou as Forças Armadas para conter manifestações de rua. À noite, os prédios dos ministérios já passaram a ter proteção de homens do Exército. Cerca de 300 militares do 32° GAC (Grupo de Artilharia de Campanha) estão espalhados pela Esplanada.
Com o prédio do Ministério da Agricultura em chamas, PMs que não dispunham de armas com balas de borracha sacaram armas comuns e dispararam. João Neto, militante da Força Sindical, disse que viu um homem ser atingido na boca, mas não soube precisar se era munição real ou de borracha. “Ele estava afastado, não estava fazendo nada, o policial sacou a arma e atirou”, disse.
Segundo a Segurança Pública, oito pessoas foram detidas sob suspeita de crimes como lesão corporal, dano ao patrimônio público, porte de arma branca e desacato.
A manifestação contra as reformas estava marcada desde antes de vir a público a investigação sobre Temer, resultante da delação da JBS. As suspeitas de corrupção e de obstrução da Lava Jato, divulgadas na semana passada, engrossaram o protesto.
“O ato foi maior do que o esperado, e 150 mil em Brasília são milhões representados pelo Brasil”, disse Guilherme Boulos, um dos coordenadores do MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem Teto).
Membros do governo também avaliaram que o volume de pessoas foi significativo.
Autoridades calcularam que entre 500 e 600 ônibus de outras cidades chegaram a Brasília. A reportagem encontrou manifestantes de São Paulo, Rio, Espírito Santo, Minas, Pará, Rio Grande do Norte, Paraíba e Rio Grande do Sul.
“É importante lutar por diretas, principalmente porque esse governo quer impor reformas sem consultar o povo e sem ter uma base de votos”, disse o agente comunitário de saúde Luciclaudio Bezerra, 39. Ele enfrentou viagem de cerca de 39 horas de ônibus de Santa Cruz (RN) a Brasília para participar do ato.
Foram mais de quatro horas seguidas de confronto ao longo do Eixo Monumental, onde ficam os ministérios. O ponto mais crítico foi o gramado próximo ao Congresso.
Manifestantes armaram barricadas de fogo com banheiros químicos e atiraram paus, pedras e fogos de artifício, enquanto a polícia lançava bombas de gás, spray de pimenta e balas de borracha. Havia sindicalistas, professores, estudantes e também pessoas mascaradas.
“Não sei direito como aconteceu, de repente senti o impacto e caí”, disse Vitor, 31, de Curitiba, ferido no braço por uma bala de borracha. Dois homens, de 18 e 35 anos, levaram tiros de bala de borracha nos olhos e foram levados ao Hospital de Base.
CONFRONTO
O conflito começou por volta das 13h30, quando a manifestação se aproximava de um bloqueio policial a 500 metros do Congresso. Primeiro, chegaram sindicalistas de roupa laranja da Força Sindical, que forçavam as grades e eram repelidos com spray.
Depois, uma multidão se engajou na tentativa de invadir o Congresso. Dos carros de som, líderes pediam calma, mas não eram ouvidos. “Companheiros mascarados, por favor, temos mães aqui, vamos manter a calma”, pediu a senadora Vanessa Grazziotin (PC do B-AM).
Quando ficou claro que as bombas não cessariam, líderes como Zé Maria (PSTU) disseram para os manifestantes resistirem à ação da polícia.
Um técnico de som da equipe da documentarista Petra Costa, que filmou os bastidores do impeachment de Dilma Rousseff, foi ferido na perna esquerda por uma bala de borracha da PM.
Em meio à confusão, participantes do ato começaram a recuar para o estádio Mané Garrincha, um pontos iniciais da marcha. Quem passava pela rua era atingido por bombas e disparos -um homem ficou com uma bala de borracha alojada no pescoço.
Usuários de ônibus no terminal rodoviário, a dois quilômetros do Congresso, sofreram com spray de pimenta. Jornalistas de vários veículos ficaram no fogo cruzado.
Por volta das 18h, a Esplanada dos Ministérios estava praticamente esvaziada pela polícia. Mais cedo, o governo liberou os servidores para que abandonassem rapidamente os prédios.
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