O Conselho Nacional dos Procuradores-Gerais (CNPG) montou uma espécie de vigília para impedir que emendas ao pacote anticorrupção aprovadas pela Câmara dos Deputados resista ao Senado.
Em reunião realizada nesta quarta-feira (30), os procuradores-gerais de todos os Estados brasileiros definiram uma frente de ação para tentar demover senadores de acolher o texto-base proveniente da Câmara.
Na madrugada de quarta, deputados desfiguraram o projeto original das Dez Medidas de combate à corrupção sugerido pelo Ministério Público. A alteração que mais preocupa os procuradores-gerais é a previsão de punição de investigadores por crime de abuso de autoridade.
“Principalmente, o que mais preocupa são as expressões muito vagas, como investigação ‘temerária’. O que é temerária? Não tem conceituação jurídica”, criticou Gianpaolo Smanio, procurador-geral de Justiça de São Paulo.
Para ele, a redação torna subjetivo o julgamento de um crime de responsabilidade e deixa em aberto o que é passível de criminalização. O texto aprovado pela Câmara prevê pena de detenção ao investigador de seis meses a dois anos.
No entendimento dos procuradores-gerais, não apenas a Operação Lava Jato está em risco como também investigações locais de crimes de prefeitos e improbidade administrativa.
Se aprovado o projeto, “retrocederemos 30 anos. Todo o arcabouço de legislação que foi construído de investigação, de probidade, de busca de meios de combater corrupção serão desprezados”, disse Smanio.
A semelhança com a Operação Mãos Limpas, na Itália, ficaria ainda mais flagrante. Após a operação, houve um movimento de enfraquecimento do Poder Judiciário, (do qual o Ministério Público italiano faz parte), a corrupção aumentou e tudo o que foi construído se perdeu, disse Smanio.
Outras duas alterações que acenderam o alerta vermelho dos investigadores são a exclusão do enquadramento como crime de enriquecimento ilícito e a perda dos bens adquiridos ilicitamente.
“O crime, a corrupção não podem compensar nem econômica nem pessoalmente. É preciso aprimorar os instrumentos de combate à corrupção e não diminuí-los e dificultar a vida do investigador”, afirmou o procurador-geral paulista.
O CNPG elencou uma série de tentativas de reduzir a autonomia do Ministério Público que já foram rejeitadas pelo Congresso Nacional e pela população, como a PEC 37.
As manifestações de junho de 2013 adotaram a rejeição dessa proposta de emenda à Constituição como uma de suas principais bandeiras. (A PEC previa poder exclusivo à polícia para tocar investigações criminais, excluindo essa competência do Ministério Público.)
“Esse projeto de lei reaviva coisas da época da Lei Maluf”, disse Smanio, em referência à tentativa do deputado Paulo Maluf (PP-SP) de aprovar a também chamada Lei da Mordaça, em 2010, que previa institutos similares aos aprovados de madrugada como a prisão de investigadores.
A justificativa usada por congressistas para defender o projeto é evitar abuso de autoridade. Para o CNPG, contudo, a fiscalização do investigador já existe, por meio de instituições como o Conselho Nacional do Ministério Público e o Conselho Nacional de Justiça.
“Não há necessidade de criminalizar a conduta de investigação”, concluir Smanio.
Folhapress
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