Michel Temer se aproximou do púlpito com o brasão presidencial às 16h09 de quinta-feira (18). Fora convencido a fazer um discurso em tom de indignação para negar que tivesse dado aval para a compra do silêncio do ex-deputado Eduardo Cunha.
Naquele mesmo minuto, chegava a um computador da Casa Civil o e-mail em que o ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal, concedia o que Temer queria ter visto antes de dizer em público que não renunciaria.
Mas não dava mais tempo. O presidente discursava às cegas, enquanto Gustavo do Vale Rocha, subchefe de Assuntos Jurídicos da Casa Civil, lia a mensagem do ministro relator da Lava Jato: a íntegra da gravação de uma conversa entre Joesley Batista e Michel Temer já estava à disposição do Palácio do Planalto.
Escutar a gravação completa era fundamental para o peemedebista. Enquanto elaborava seu rápido discurso, o presidente repetia que não se lembrava dos “detalhes” da conversa com Joesley e que, por isso, queria se defender somente após ouvir tudo o que o empresário havia entregado à PGR (Procuradoria-Geral da República).
Nas primeiras horas de quinta, Temer assinou um ofício pedindo a Fachin acesso em primeira mão às gravações. A justificativa era econômica, setor em que ancora seu governo. A Ibovespa havia caído 10% naquela manhã e interrompido os pregões. O país estava em colapso, argumentava Temer.
Sem resposta do STF, o presidente foi convencido por auxiliares próximos de que não havia mais tempo: o desgaste de sua imagem aumentava e o mercado despencava. Ele precisava falar.
Visivelmente nervoso, Temer releu o texto escrito por sua equipe de comunicação –e revisado por ele– diversas vezes e treinou, sozinho, a entonação minutos antes de fazer seu discurso.
“Não renunciarei. Repito: não renunciarei. Sei o que fiz e sei a correção dos meus atos. Exijo investigação plena e muito rápida para os esclarecimentos ao povo brasileiro. Essa situação de dubiedade e de dúvida não pode persistir por muito tempo”, disse o presidente.
Temer não entrou em detalhes. Enquanto isso, funcionários da Casa Civil atravessavam a Praça dos Três Poderes, que separa o Planalto do STF, em busca dos áudios.
‘ALIVIADO’
Quando chegou a seu gabinete, no 3º andar do Planalto e ocupado por ministros e parlamentares que o apoiam, o presidente se disse “aliviado” e seguiu à saleta onde costuma fazer as refeições.
Ali, o presidente havia feito desabafos desde as primeiras horas da manhã em razão da publicação de detalhes da delação da JBS. Dizia-se vítima de “conspiração” e reconhecia que aquele era o pior dia em um ano de governo.
Gustavo Rocha havia preparado um laptop com caixas de som para que o peemedebista ouvisse sua conversa com Joesley. Temer escutou os primeiros minutos e, quando se deu conta de que ainda faltava mais de meia hora de gravação, disse: “Não posso ficar todo esse tempo aqui”.
O auxiliar permaneceu na sala para ouvir o áudio até o final e afirmou que, pelo menos ali, “não havia nada”.
O semblante tenso do presidente ganhou um leve contorno de alívio e deu sustentação ao discurso de que “iria enfrentar até o fim” todo o processo, apesar do custo político que isso traria à sua imagem e à de seu governo.
Joesley acusa Temer de ter dado aval para a compra do silêncio de Cunha. Auxiliares alertaram que, além disso, o presidente poderia ser acusado de prevaricação, visto que o empresário falava em compra de juízes e procurador.
“Era blefe”, rebateu Temer, que assistiu ao restante do noticiário pela televisão, agora em silêncio. Apareciam novas acusações. E ele voltou a fechar o semblante.
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