A líder escocesa Nicola Sturgeon pediu ao Reino Unido na sexta (31) que autorize um novo plebiscito pela independência da Escócia, após a derrota da mesma consulta em 2014. Ela calculou que, insatisfeita com o “brexit”, a saída britânica da União Europeia, a população vai desta vez votar por sua separação. Pode ter se equivocado.
Líderes de movimentos separatistas ouvidos pela Folha na capital escocesa, Edimburgo, disseram que o gesto de Sturgeon veio cedo demais e causou ansiedade.
“Não temos chances de ganhar agora”, diz Colin Fox, um líder do Partido Socialista Escocês. Fox foi do conselho da campanha pelo “sim” há três anos, derrotada por 55% dos votos. “Nos perguntamos qual será a consequência de outra derrota.”
EUROCETICISMO
Sturgeon pediu autorização ao plebiscito em uma carta à premiê britânica, Theresa May, dois dias após Londres iniciar o “brexit”. Ela precisa do aval para seguir adiante com a consulta, prevista para entre 2018 e 2019. Não há prazo para resposta.
O governo britânico já sinalizou que, como hoje sua prioridade é o “brexit”, não aceitará o pedido. A escocesa alertou que buscará alternativas caso seja impedida.
Sturgeon vincula a repetição do plebiscito a divergências quanto ao “brexit”. Enquanto 52% do Reino Unido votou por deixar a UE, a população escocesa preferia permanecer, com 62% dos votos –e foi derrotada.
O que a escocesa parece não ter levado em conta, diz Fox, é que “o ceticismo em relação à União Europeia é profundo na Escócia”.
“Ninguém aqui estava com cartazes pró-UE durante o plebiscito do ‘brexit'”, diz. “Votamos para ficar no bloco como o menor dos males.”
Pesquisa do centro NatCen realizada entre julho e dezembro de 2016 mostra que o “euroceticismo” escocês cresceu de 40%, em 1999, a 67%. O argumento de que o “brexit” é o suficiente para a independência, portanto, não deve convencer eleitores.
John Curtice, especialistas britânico em estatística, chegou à mesma conclusão. Ele publicou um estudo nesta semana sugerindo que, apesar de ter votado para ficar na UE, os escoceses concordam com as razões que levaram britânicos a votar pela saída. Coincidem, por exemplo, no controle à migração.
“Se basear a sua estratégia no ‘brexit’ e na permanência na UE, é improvável que Sturgeon consiga progresso em sua campanha”, diz Curtice.
Ele sugere que o argumento mais convincente será a economia –demonstrar que será melhor ao país.
Essa é uma das metas da associação Negócios pela Escócia, que começou a arrecadar fundos para a nova campanha pela independência.
“Não sou um grande fã da União Europeia, mas é insano o Reino Unido deixar seu maior parceiro comercial”, afirma Adam David, proprietário de uma loja de móveis.
Apesar do seu ceticismo quanto à UE, ele apoia a repetição do plebiscito e o pedido pela adesão da Escócia ao bloco econômico como um país independente –um processo que levaria anos.
“Meus móveis são dinamarqueses”, explica. “Aperto um botão e recebo as peças dois dias depois. Quando sairmos da UE, vai haver burocracias e barreiras.”
Diante dos argumentos correntes, outro separatista, Allan Armstrong, lamenta: “Essa campanha já está começando a se parecer com a de 2014”. Ele representa a Campanha Radical da Independência, de esquerda.
O separatismo, afirma, é resultado do retrocesso da social-democracia no Reino Unido e da sensação de que um Império Britânico já não faz mais sentido. A Escócia, diz, tem o direito de determinar seu próprio futuro.
Mas os escoceses tampouco deveriam se agarrar ao argumento nacionalista de que, por serem diferentes, precisam se separar, diz.
“É mais do que vestirmos kilt, bebermos uísque e tocarmos a gaita de fole”, afirma. “É sobre nosso sistema de saúde e nossos empregos. É uma questão social.”
(FOLHA PRESS)
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