04 de dezembro de 2025
CHAPÉU ALHEIO • atualizado em 01/12/2025 às 09:21

Consequências: prefeitos falam em colapso fiscal com despesas aprovadas pelo Congresso

Municípios temem impacto explosivo de projetos aprovados por deputados e senadores que criam despesas sem receita, incluindo aposentadoria especial e novos pisos salariais
Deputados e senadores aprovaram pautas-bomba questionadas por prefeitos e governo federal- Foto Vinicius Loures / Câmara dos Deputados / arquivo
Deputados e senadores aprovaram pautas-bomba questionadas por prefeitos e governo federal- Foto Vinicius Loures / Câmara dos Deputados / arquivo

Os projetos recentemente aprovados ou em avanço no Congresso Nacional que ampliam despesas obrigatórias sem indicar fonte de custeio, causam grande preocupação aos prefeitos que pagarão essa conta. Na lista: aposentadoria especial, pisos salariais, adicionais e expansão de vagas na educação infantil.

A Confederação Nacional dos Municípios (CNM) aponta que faltou compromisso com a responsabilidade fiscal e que deputados e senadores “fizeram favor com chapéu alheio”.

O conjunto de medidas pode levar centenas de prefeituras ao colapso fiscal. Um levantamento da CNM estima que apenas as propostas em discussão nesta semana somam mais de R$ 100 bilhões de impacto aos cofres municipais ao longo dos próximos anos.

Entidade que representa 5,1 mil prefeituras, a CNM denuncia que o Congresso “desrespeita” a Emenda Constitucional 128/2022, que proíbe a criação de despesas sem a definição de receitas. Desde o dia 26, em seu portal, a confederação alertava sobre as “pautas-bomba” no Congresso.

Pautas-bomba no Congresso: projeto dos ACSs é crítico, aponta CNM

Uma das aprovações mais críticas foi a do Projeto de Lei Complementar (PLP) 185/2024, que cria aposentadoria especial para Agentes Comunitários de Saúde (ACSs). O projeto traz prejuízos ainda mais preocupantes do que a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 14/2021, que também versa sobre o tema. “O PLP representa um potencial impacto de R$ 103 bilhões aos Municípios ao elevar o déficit atuarial dos Regimes Próprios de Previdência Social (RPPS), que atualmente já supera a marca de R$ 1,1 trilhão”, divulgou a CNM em nota.

A CNM reconhece a relevância dos ACSs, mas alerta que o PLP não apresenta mecanismos de compensação financeira e “transfere integralmente aos Municípios o ônus de benefícios exclusivos a uma única categoria”, reclama a CNM.

Os prefeitos alegam que pode faltar recurso para custear serviços básicos caso o Congresso continue a criar despesas sem elevar as receitas municipais.

“É urgente que o Congresso atue com visão federativa, diálogo e responsabilidade fiscal. Os municípios não podem continuar arcando sozinhos com políticas criadas sem planejamento e sem financiamento”, afirma o presidente da CNM, Paulo Ziulkoski, conforme publicou o portal Congresso em Foco no sábado (29).

A Confederação classifica as “pautas-bomba” como medidas de forte apelo eleitoral às vésperas de 2026, ano em que a maioria dos deputados e senadores tentará a reeleição ou concorrerá a outros cargos. De acordo com o portal, os prefeitos preparam corpo a corpo na Câmara para impedir que as propostas sejam aprovadas em definitivo.

Atualmente tramitam no Congresso mais de 350 projetos de criação ou reajuste de pisos salariais. A CNM estima que se forem aprovados apenas 33 desse bolo, o impacto nos municípios chegaria a R$ 43 bilhões por ano.

E o PLP dos ACSs é justamente o que está mais evidência, após ter sido aprovado por unanimidade no Senado Federal e seguir para a Câmara dos Deputados.

O que as regras estabelecem:

  • Poderão se aposentar os ACSs homens aos 52 anos, com 20 anos na atividade;
  • Poderão se aposentar as ACSs mulheres aos 50, com o mesmo tempo;
  • Poderão se aposentar os ACSs com 15 anos na função + 10 anos em outra ocupação;
  • Pensão por morte com integralidade;
  • Aposentadoria por incapacidade permanente;
  • Contagem especial de tempo, inclusive de atividade sindical;
  • Prazo de 120 dias para estados e municípios adaptarem suas leis.

Por isso, a previsão é de potencial impacto de R$ 103 bilhões ao elevar o déficit atuarial dos Regimes Próprios de Previdência Social (RPPS), que atualmente já supera a marca de R$ 1,1 trilhão.

A CNM aponta que o déficit atuarial resulta do cálculo de longo prazo (normalmente 75 anos) que compara o valor presente das futuras despesas previdenciárias com o valor presente das receitas projetadas. Na prática, isso representaria o montante que seria necessário ter em caixa atualmente para garantir o pagamento dos benefícios ao longo das próximas décadas.

União também reage contra

Não só os prefeitos estão prevendo prejuízos severos. O governo federal ameaça ir até a Justiça caso a proposta seja confirmada pelos parlamentares.

O projeto foi incluído na relação das pautas-bomba em tramitação no Congresso pelo presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), em meio a uma disputa de poder. Ele foi incluído horas depois que o presidente Lula o desagradou ao indicar o advogado-geral da União, Jorge Messias, para uma vaga no STF que Alcolumbre deseja para o ex-presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD/RO).

O secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Dario Durigan já sinalizou que se o projeto for mantido, haverá reação. “Se uma matéria desse tipo, com esse tamanho de impacto, avançar, seremos obrigados a fazer o veto. E se o veto cair, seremos obrigados a ir ao Supremo para restabelecer o cumprimento das regras fiscais”, sustentou.

Estimativas preliminares do Ministério da Previdência, apontam que o impacto do PLP será superior a R$ 24 bilhões em dez anos, somando gastos do regime próprio (servidores concursados) e do INSS.

Mais gastos com impacto municipal

Além do PLP dos ACSs, o projeto de lei 1.559/2021, que cria um piso nacional para farmacêuticos, também vai repercutir nos cofres municipais, já que esses profissionais atuam majoritariamente na atenção básica à saúde. Esse projeto representa impacto anual de R$ 309 milhões apenas para as prefeituras.

Para agravar, a União não prevê nenhum repasse compensatório, como ocorreu no piso da enfermagem que passou por um longo impasse político, jurídico e fiscal desde sua aprovação e, ainda hoje, não está plenamente consolidado em todo o país.

Ampliando o problema, no último dia 18, a Comissão de Trabalho aprovou o projeto de lei 2.952/2025, que concede adicional de insalubridade a profissionais da educação escolar. De acordo com a CNM, o texto não define critérios objetivos para caracterizar a insalubridade, cria insegurança jurídica e pode desencadear ações judiciais em massa. Somente nesse caso, o impacto estimado é de R$ 6,5 bilhões.

Entre as pautas-bomba no Congresso, outra grande preocupação dos prefeitos é com o projeto de lei 4.012/2024, que impõe a expansão obrigatória de creches e pré-escolas em áreas urbanas e rurais. A medida é considerada meritória, mas “insustentável” pelos prefeitos. O portal apurou que 4.823 municípios não atendem a meta prevista para creches rurais, e 4.285 não cumprem o percentual para pré-escolas.

Segundo a CNM, para zerar esse déficit, seriam necessárias 131 mil novas matrículas em creches rurais e a criação de 187 mil novas matrículas em pré-escolas e 2.706 novas unidades de ensino. A saída exige obras, pessoal, transporte escolar e manutenção, gastos a mais para o orçamento municipal.

Essas medidas pressionarão ainda mais a folha de pagamento, ampliando obrigações sem financiamento, aumentando o déficit previdenciário e levando prefeituras a perderem capacidade de manter serviços básicos, avalia a Ziulkoski. “O município está na ponta do serviço público. Criar despesas por lei sem colocar recurso é empurrar a conta para o cidadão”, reclama.

(Com informações do Congresso em Foco)


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