23 de novembro de 2024
Brasil • atualizado em 13/02/2020 às 00:20

Para PGR, “escola sem partido” é inconstitucional e subestima alunos

Inscrições encerram no próximo sábado, 20. (Foto: Agência Brasil)
Inscrições encerram no próximo sábado, 20. (Foto: Agência Brasil)

Em parecer enviado ao STF (Supremo Tribunal Federal) nesta quarta (19), a PGR (Procuradoria-Geral da República) criticou duramente a tentativa de implantação da chamada “escola sem partido”, que, segundo seus idealizadores, tem por objetivo impedir professores de influenciarem alunos política e religiosamente.

De acordo com a PGR, a iniciativa é inconstitucional e subestima a capacidade de discernimento dos estudantes em sala de aula.

“Há equívocos conceituais graves, como o de considerar que o alunado seria composto de indivíduos prontos a absorver de forma total, passiva e acrítica quaisquer concepções ideológicas, religiosas, éticas[…]. Despreza a capacidade reflexiva dos alunos, como se eles fossem apenas sujeitos passivos do processo de aprendizagem, e a interação de pais e responsáveis, como se não influenciassem a formação de consciência dos estudantes”, sustenta a PGR.

A manifestação assinada pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot, foi protocolada a uma ação movida pela Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação contra a Assembléia Legislativa de Alagoas.

O deputados estaduais alagoanos aprovaram uma lei que proíbe o professor de colégios públicos e particulares de praticar “doutrinação política e ideológica, bem como quaisquer outras condutas por parte do corpo docente ou da administração escolar que imponham ou induzam aos alunos opiniões político-partidárias, religiosa ou filosófica”.

Para Janot, no entanto, a proposta do Legislativo local é vaga, afeta a liberdade de expressão do educar e compromete o processo de ensino.

“A Constituição estabelece diversas liberdades que fazem parte do conteúdo do direito à educação: aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber. Essas liberdades de aprendizado, ensino e pesquisa formam o núcleo essencial do direito à educação. Sem liberdade de ensinar e de aprender não há o próprio direito à educação”, argumenta.

A peça afirma que possíveis excessos de professores não justificam a medida. O PGR diz que já há instituições e normas voltadas à fiscalização e eventual punição de docentes. Acrescenta que não cabe à escola reproduzir as convicções dos pais dos alunos.

“Não se ignora que professores[…] estão sujeitos a praticar erros e abusos na profissão. Mas a veiculação de ideias contrárias à convicção de alunos, pais e responsáveis não gera[…] consequência indesejável[…]. Entre a vedação apriorística de conteúdos e a liberdade de ensino, esta é preferível”, sustenta o PGR.

Além das críticas ao mérito da proposta, o parecer afirma que a Assembleia estadual não tem competência para legislar sobre o assunto, de responsabilidade exclusiva da União, de acordo com Janot.

“Veiculação de princípios que regem as atividades de ensino é, em essência, tema que demanda tratamento uniforme no território nacional, porquanto traduz interesse geral. Dessa forma, incumbe à União definir normas sobre a matéria[…]. Não caberia ao Legislativo de Alagoas inovar no ordenamento jurídico e prever princípios gerais para a educação, mormente quando distintos daqueles da lei nacional”, diz.

O projeto de lei em questão é de autoria do deputado Ricardo Nezinho (PMDB). O governador de Alagoas, Renan Filho (PMDB), vetou a proposta aprovada pelo Legislativo, mas a Assembléia derrubou o veto.

Na Câmara dos Deputados, em pelo menos nove Assembleias e 17 Câmaras municipais tramitam projetos que visam proibir a “doutrinação ideológica” em temas políticos, religiosos e sexuais em salas de aula.

Conceito

Além dos mesmos objetivos, os textos da maioria dos projetos normalmente assinados por políticos de alas conservadoras e têm uma origem comum: o anteprojeto criado pela organização “Escola sem Partido”, formada por “estudantes e pais preocupados” com a “contaminação político-ideológica das escolas”.

A entidade defende que a educação moral, sexual e política é de competência da família. E argumenta que o professor não é um educador, devendo se limitar a repassar os conteúdos das disciplinas de forma isenta.

Fundador da organização, o advogado Miguel Nagib diz que anteprojeto defende uma abordagem equilibrada das diferentes correntes políticas e sociais: “Seria impossível ensinar história sem falar de política. O que defendemos é que ele não esconda nenhum ponto de vista”.

O site da entidade traz uma lista de aspectos que alunos devem ficar atentos para “flagrar” o doutrinador. Um deles diz que “você pode estar sendo vítima de doutrinação ideológica quando o professor se desvia frequentemente da matéria […] para assuntos relacionados ao noticiário político ou internacional”.

(Folhapress)

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