O adultério partidário rolou solto na temporada pré-eleição 2018, de acordo com os dados do TSE (Superior Tribunal Eleitoral): 41% dos candidatos neste ano que já tinham disputado algum pleito trocaram de legenda para concorrer novamente.
Ou seja: quatro em cada dez postulantes não estavam na sigla atual na última vez em que apareceram nas urnas. O percentual é o maior das três últimas eleições gerais: foi de 29% em 2014 e de 26% na de 2010.
O levantamento feito pela Folha de S.Paulo considerou os candidatos a todos os cargos e usou como referência as duas eleições imediatamente anteriores (municipal e geral). Assim, por exemplo, se uma pessoa concorreu a vereador em 2016 por um partido e voltou agora por outro, foi incluída no rol dos migrantes.
Estudiosos da política partidária associam o troca-troca à crise das legendas (atingidas pela Operação Lava Jato e alvo de descrença dos eleitores) e à busca dos políticos por condições mais favoráveis para disputar a eleição após as recentes reformas eleitorais.
“O sistema partidário que operou nos últimos 20 anos colapsou”, diz o cientista político Jairo Nicolau, professor da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro). “O trio que dominou a política nas últimas décadas, PT, PSDB e MDB, quebrou.” O momento de “reorganização da vida partidária”, diz, pode ter contribuído para a intensa migração.
A também cientista política Marcela Tanaka, da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas), acrescenta à lista a “atração” exercida por partidos que têm fatias mais gordas dos fundos de campanha e de tempo de TV.
Também há, lembra ela, o caso de “grandes nomes que migram para legendas menores, mas onde possam manter o próprio capital político”.
O PSL (Partido Social Liberal), do presidenciável Jair Bolsonaro, foi a sigla que mais teve baixas antes desta eleição, na comparação com a lista de candidatos das duas anteriores. Apenas 33% dos que concorreram em 2014 ou 2016 se mantiveram no PSL. Os outros 67% trocaram de partido para disputar neste ano.
PMB (Partido da Mulher Brasileira) e Podemos –que até 2016 era PTN (Partido Trabalhista Nacional)– também seguraram poucos candidatos (39% e 43%, respectivamente).
Na outra ponta da tabela estão três partidos de esquerda. O PSOL, do candidato ao Planalto Guilherme Boulos, tem os filiados mais fiéis: 89% dos candidatos da legenda neste ano são postulantes que se mantiveram na sigla.
As taxas de fidelidade são altas também no PSTU (Partido Socialista dos Trabalhadores Unificado), com índice de 87%, e PCO (Partido da Causa Operária), com 86%.
“Isso diz muito sobre a filiação partidária pragmática e a ideológica”, comenta Marcela.
“Tradicionalmente, partidos de esquerda têm filiados e militantes mais fiéis, dado o trabalho de base e a organização partidária. Já partidos mais novos, menos institucionalizados, tendem a ter candidatos que pensam em benefícios mais seletivos, geralmente individuais”, diz ela.
Um dos critérios para a migração neste ano, completa Nicolau, foi a cláusula de desempenho mais rígida, que deve dificultar a sobrevivência de partidos menores. Com isso, filiados se mexeram em busca de legendas viáveis.
O levantamento nos dados permite ver ainda quais partidos que, na movimentação pré-eleição, mais receberam candidatos oriundos de outras siglas e mais perderam.
Nesse caso, o partido ao qual Bolsonaro se filiou em março teve saldo positivo: foi a sigla que mais recebeu candidatos que decidiram migrar. Do total de postulantes que mudaram para disputar esta eleição, 7% tiveram como destino o PSL.
Já o ranking de legendas que mais perderam é encabeçado pelo MDB (Movimento Democrático Brasileiro) do presidente Michel Temer. Do total de candidatos disputando a eleição hoje, 6% saíram da sigla em direção a outras.
No espectro partidário, a migração foi mais intensa no campo do centrão. Dos candidatos desse grupo que migraram, 86% tiveram como destino outro partido do centrão.
Essa é a tendência -esquerda continua na esquerda, direita na direita e centro no centro. O centrão, no entanto, foi a segunda opção de todos.
A troca para um “partido vizinho”, afirma Nicolau, é o padrão. “Demonstra que há pelo menos algum tipo de ordem no sistema”, diz. O Brasil tem 35 partidos registrados, o que abre portas para a migração entre siglas similares.
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