Ele relata esse aprendizado no livro “Sobre Formigas e Cigarras”, ao contar o episódio em que o ex-presidente o aconselhou a simplesmente não conversar com os jornalistas que aguardavam um pronunciamento seu em Nova York, no calor de sua nomeação para o Ministério da Fazenda.
“Fique tranquilo, Palocci -ele [Lula] respondeu, seguro de si. – Por que você tem que falar? Simplesmente não fale…”, escreveu o ex-ministro, reproduzindo o que lhe disse o líder petista.
Na semana passada, Palocci resolveu falar ao juiz Sergio Moro que havia um “pacto de sangue” entre Lula e a Odebrecht -político e empresa são dois dos protagonistas da Operação Lava Jato.
Entre outras acusações, o ex-ministro disse que o ex-presidente avalizou o pagamento de R$ 300 milhões em propinas da Odebrecht ao PT.
Visto como sucessor de Lula, Palocci foi o primeiro nome do primeiro escalão do governo a ser anunciado após a vitória eleitoral de 2002. Era o grande interlocutor dos petistas com o mercado, assim como José Dirceu (que diz preferir “morrer” a delatar, segundo a coluna Mônica Bergamo) foi o principal articulador político do partido.
Lula e Palocci já tiveram muito a dizer um do outro. Veja algumas dessas falas:
PALOCCI SOBRE LULA, NO PASSADO
No livro “Sobre Formigas e Cigarras” (ed. Objetiva, 2007)
“Aprendi, então, uma entre as tantas lições que já tivera e as muitas que ainda haveria de ter nos anos seguintes, convivendo com aquele líder obstinado, dono de um carisma inconfundível e uma sabedoria política rara. Sim, de fato: por que mesmo eu teria que falar? Era só não falar.”
“O presidente permite que divergências internas existam e sigam o seu curso natural, com a fluidez necessária. Ele observa e acompanha cada uma delas com atenção, se alimenta delas e ajuda o processo a amadurecer até completar seu ciclo natural. Lula só interfere quando as diferenças saem daquilo que pode ser chamado de razoável.”
“Para quem imaginava um presidente populista, Lula se mostraria, ao enfrentar a crise econômica com determinação férrea, o contrário: era de uma racionalidade rara.”
“Como qualquer ser humano, Lula está longe de ser um sujeito infalível ou isento de erros. Como em geral acontece com as pessoas que fazem muito, ele também comete os seus. Mas não deixa de ser interessante a maneira pela qual Lula combina características como a intuição e pragmatismo para resolver situações mais complexas.”
Em entrevista à Folha de S.Paulo, em 2003
“Acho que o presidente Lula faria bem ao país com um mandato renovado. Acredito muito no presidente Lula.”
Em entrevista à revista “IstoÉ”, em 2007
“Lula não é um ortodoxo. É racional.”
Em discurso ao deixar a Fazenda, em 2006
“Digo ao presidente Lula que não me arrependo nenhum minuto de ter dedicado 25 anos de minha vida pública ao seu projeto político.”
PALOCCI SOBRE LULA, HOJE
Em depoimento a Sergio Moro
“Quando Dilma foi tomar posse a empresa entrou num certo pânico. Foi nesse momento que o doutor Emilio Odebrecht fez uma espécie de pacto de sangue com o presidente Lula.”
“O presidente Lula era um amigo da empresa de forma mais intensa.”
LULA SOBRE O PALOCCI, NO PASSADO
Em discursos em 2003
“Não tem política do Palocci, não tem política do Lula, não tem política do José Dirceu, não tem política do José Alencar, não tem política do Gushiken, não tem política da Marina. Tem política de governo.”
“Cada vez que um ministro olha um número, ele tem que se lembrar que ali há uma criança, um homem, uma mulher, que serão vítimas ou que ganharão, se ele souber tratar aqueles números. E por isso coloquei o meu companheiro Antônio Palocci para ser ministro da Fazenda.”
Em 2006, quando Palocci deixou o governo
“Palocci, junto com outros companheiros, foram os autores da engenharia da Carta ao Povo brasileiro. A carta que possibilitou nós ultrapassarmos a barreira dos 30, ou seja, eu dizia para todo mundo que eu não tinha mais interesse em ser candidato, porque 30%, eu não precisava de ninguém, ou seja, eu já tinha 30% [de intenções de voto], eu precisava era chegar a 50%. E trabalhamos para chegar a esses 50%. E a Carta ao Povo brasileiro, sem dúvida nenhuma, foi o marco na campanha de 2002.”
“Posso te dizer, Palocci, independente deste momento que estamos vivendo agora, eu posso lhe dizer: a nossa relação é de companheiro, possivelmente mais do que a relação de irmão. Muito obrigado, querido.” [quando deixou o cargo de ministro]
Em abril de 2017
“Não tenho preocupação com nenhuma delação. Palocci é meu companheiro há 30 anos, é um dos homens mais inteligentes desse país.”
“Palocci é meu amigo, uma das maiores inteligências politicas do país. Ele tá trancafiado, mas não tenho nenhuma preocupação com delação dele.”
LULA SOBRE PALOCCI, HOJE
“Eu tenho uma profunda amizade com o Palocci, há mais de 30 anos. Não é uma coisa de um dia, sabe? O Palocci foi meu ministro da Fazenda. E prestou um grande serviço a esse país. Eu tirei o Palocci do governo em março de 2003 [2006, na verdade]. Porque ele não conseguiu explicar uma coisa pequena. Saiu a denúncia de que ele frequentava uma casa e ele disse que não ia na casa. A oposição denunciou, o caseiro disse que ele ia. Ficou uma briga na imprensa, vai ou não vai, vai ou não vai. Eu lembro que vim a Curitiba inaugurar uma obra, acho que com o prefeito, e disse para o Palocci: ‘Se você não resolver o problema do caseiro, quando eu voltar de Curitiba eu vou tirar você do governo. Porque não é possível um ministro da Fazenda ficar brigando com um caseiro’. E voltei à tarde, o Palocci não tinha resolvido e eu então afastei o Palocci.”
“[O depoimento] foi uma coisa cinematográfica, quase feita por um roteirista da Globo. Sabe? ‘Você vai dizer tal coisa’, os lides são esses. Preparam alguns lides para ele dizer e ele foi dizendo habitualmente, lendo alguma coisa. E eu conheço o Palocci bem. Palocci, se ele não fosse um ser humano, ele seria um simulador. Ele é tão esperto que é capaz de simular uma mentira mais verdadeira que a verdade. O Palocci é médico, é calculista, é frio.”
“Nada daquilo [depoimento de Palocci] é verdadeiro. A única coisa que tem verdade ali é ele dizer que está fazendo aquela delação porque quer os benefícios.”
“Ele é que fez pacto de sangue com os delatores, com os advogados e talvez com o Ministério Público. Porque ele disse exatamente o que ‘Powerpoint’ queria que ele dissesse.”
“Foi um conjunto de simulações que o Palocci fez, por isso que usei a palavra simulador, tudo com o objetivo de duas coisas: diminuir a pena dele, ganhar os benefícios da delação, e quem sabe ficar com um pouco dos recursos que foram bloqueados.”
“O que não pode é, se você não quer assumir a tua responsabilidade pelos atos ilícitos que você fez, não jogue em cima dos outros.”
“Eu vi o Palocci mentir aqui essa semana.”
“Eu não tenho raiva do Palocci. Eu tenho pena.”
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