Essa é uma pergunta muito fácil de responder, de uma maneira geral o trânsito de Goiânia anda “travando” como uma grande engrenagem mal engraxada e, que há tempos, vem dando sinais de desgaste, é sintoma de que algo está errado. Os primeiros avisos são pequenos ruídos estridentes ou certos descompassos no ritmo do trabalho repetitivo. Como qualquer outra máquina, a engrenagem precisa de manutenção, reposição de peças e, eventualmente, de alguns ajustes para que continue funcionando normalmente.
Ainda aproveitando dessa metáfora, pode-se dizer, apenas com um olhar superficial, que o trânsito de uma grande cidade como Goiânia é quase a mesma coisa, ele precisa de cuidados, de gente entendida estudando o vai e vem de veículos, vinte e quatro horas por dia e sete dias por semana. Bem, mas isso não é tudo, existem outros elementos que devem ser observados, como as rotas, os eixos de transporte, as interseções, as passagens em níveis e principalmente os movimentos pendulares da periferia para o centro e do centro para periferia. A gestão do trânsito é uma matéria complexa, é para profissionais experimentados, pois além do conhecimento técnico, é preciso de muito treinamento e tempo, muito tempo! O olhar de um especialista é mais apurado, percebe facilmente as inconformidades e suas prováveis soluções. É difícil entender essa dinâmica porque a cidade é proativa, ela cresce, verticaliza, infla e se interconecta e também se relaciona com outras cidades, enfim, ela tem vontade própria e pode se transformar rapidamente de um dia para o outro.
Voltando à metáfora, se alguém precisasse reparar aquela velha engrenagem barulhenta e arrítmica não teria uma tarefa tão difícil, bastaria fazer algumas ligações, talvez pesquisar nas “páginas amarelas” e pronto! Em pouco tempo já teríamos um orçamento preciso e, com um pouco de sorte, o serviço executado. Agora, se alguém quisesse melhorar o trânsito de uma cidade como Goiânia deveria pensar em uma tarefa mais ousada, tecnológica, permanente e mais consistente. Existem tantas variáveis envolvidas nessa “engrenagem” do trânsito que, primeiramente, seria necessário listar no mínimo dez questões que se entrelaçam e que deveriam ser observadas, quem sabe em outro artigo possamos detalhar melhor.
A Lei Nº 12.587, de 3 de Janeiro de 2012, que institui as diretrizes da Política Nacional de Mobilidade Urbana prevê ações mais abrangentes, prevê as prioridades e até conexões com outras políticas, como o Plano Diretor e a acessibilidade. Outro avanço que a Lei 12.587 previu são os Planos de Mobilidade Municipais, Metropolitanos e Estaduais. Mas, para que tenham maior efetividade, diferentemente do que aconteceu com os Planos Diretores, espera-se que aconteçam em sintonia, integrados e, de preferência, antes da próxima eleição.
Goiânia chegou a licitar e contratar o seu Plano de mobilidade, mas foi interrompido e dispensado. O contrato previa, como manda a Lei, fazer um planejamento integrado para todos os modais como transporte coletivo, transporte de cargas, automotivo e para bicicletas, priorizando sempre os pedestres. O Plano de mobilidade deveria, também, dar uma resposta ao crescente adensamento do uso do solo, a descentralização do trânsito e o aumento geométrico da frota de veículos. Goiânia é uma cidade complexa, de traçado exótico e difícil solução para a mobilidade. Um dos fatores que poderia ajudar no planejamento da mobilidade, que está concebido no Plano Diretor, é a tão cantada “cidade compacta”, mas que pressupõe um transporte coletivo eficiente e de qualidade, o que de modo definitivo nós não temos. A cidade compacta, realmente, ajuda na mobilidade e no transporte de massa, mas a agressividade do adensamento do uso do solo pode ser um problema e os seus efeitos colaterais podem ser irreversíveis, tais como a superlotação de veículos nas vias adjacentes aos eixos preferenciais e a falta de estacionamento para o comercio, algo que já está perceptivo Goiânia.
Enquanto a nova licitação do Plano de Mobilidade não vem, a Prefeitura tem, de forma tímida, realizado algumas ações pontuais no trânsito de Goiânia, como pequenas intervenções em alguns cruzamentos, colocação de sinaleiros, mudanças de rotas e o sentido de algumas vias. Serviço de pouca monta, que a população, normalmente, nem percebe. É preciso de intervenções maiores para que a população repare essas melhorias. Talvez agora que a prefeitura anunciou a retomada para conclusão do BRT – Bus Rapid Transit, o trânsito no eixo norte-sul melhore. Uma solução de mobilidade bem sucedida passa obrigatoriamente pelo transporte de massa e o BRT é uma boa solução.
Na semana passada, começo de fevereiro de 2018, a SMT lançou uma enquete em seu site para descobrir quais seriam, na opinião dos entrevistados, os principais problemas do trânsito em Goiânia. Descobriu-se que o trânsito é ruim ou péssimo, que o motorista é mal educado, que não dão setas e ainda estacionam em fila dupla. De uma maneira geral, saber a opinião dos cidadãos goianienses é interessante, poderia ser um termômetro importante se fosse melhor direcionada, como por exemplo: Saber se o trânsito é ruim porque as rotas estão congestionadas ou se há um excesso de automóveis nas vias públicas ou se o cidadão percebe a fiscalização de trânsito, se já estamos preparados para dobrar a direita livremente e tantas outras.
Por outro lado, pensando cientificamente, esse tipo de pesquisa, sem quase nenhum critério metodológico, não tem resultados consistentes ou comprovados. É muito mais uma percepção geral, meramente opinativa e que pouco contribui para a mobilidade da nossa capital. Hoje, existem meios tecnológicos, eficientes e baratos para se pesquisar, como GPS-telefônicas, que podem medir em grande capacidade os fluxos de origem e destino. É o tipo de pesquisa indispensável para entender e estudar a real capacidade de demanda de determinados eixos estruturadores, também compreender os movimentos diários e sazonais e, desta forma, pensar em novas rotas e estratégias que possam desafogar o já caótico trânsito de Goiânia.
Então, precisamos mais do que graxa e algumas ferramentas e chaves inglesas. Precisamos de inteligência e planejamento, precisamos de investimento, pois ao que parece, com a iminente aprovação do Plano Diretor, esse cenário tende a piorar. Se não fizermos nada agora, ou seja, contratar e por em prática o novo Plano de mobilidade municipal e metropolitano a maquina vai enferrujar ou talvez irremediavelmente parar. Para uma cidade tão jovem como Goiânia, com problemas urbanísticos tão antigos, vê-la agonizando e se debatendo é muito triste e desanimador.
Luciano Caixeta, Arquiteto, professor de Arquitetura da PUC e integrante do Conselho de Arquitetura de Goiás