26 de novembro de 2024
Opinião
Publicado em • atualizado em 13/12/2012 às 20:16

OPINIÃO/ Aumento da contribuição previdenciária: Um confisco imoral

 

O PROJETO DO GOVERNO DE GOIÁS QUE AUMENTA A CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA DOS SERVIDORES PÚBLICOS DE 11% PARA 13,25% É INACEITÁVEL.

 

Primeiramente por que é flagrantemente inconstitucional, pois o caput do artigo 40 da Constituição Federal prevê que a previdência dos servidores precisa ter equilíbrio financeiro e atuarial, e a proposta não vem embasada em nenhum estudo atuarial, que é uma peça técnica científica obrigatória para embasar a aprovação de qualquer aumento de alíquota.

O que me faz concluir preliminarmente de que essa cantilena de que existe déficit previdenciário no estado de Goiás é equivocada, para dizer o mínimo, pois é preciso entender que somente um estudo atuarial pode dizer que isso existe.

O que o Estado de Goiás tem é despesas com pagamento de servidores inativos maiores que as suas receitas previdenciárias.

Não se pode confundir despesas de pagamento de servidores inativos maiores que as receitas previdenciárias, com déficit previdenciário, que são coisas completamente diferentes.

Para entender como tal falácia foi construída é preciso voltar um pouco no passado.

A aposentadoria da maioria dos servidores públicos brasileiros sempre foi pro labore facto, ou seja, pelo fato de terem laborado, o pagamento de sua aposentadoria pelo tesouro faz parte da sua remuneração, é o que tecnicamente se denomina salário diferido. E é assim desde os tempos de Portugal.

Com o estabelecimento do Regime Jurídico Único pela lei Federal 8112/91 foi estendido a todos os servidores públicos de cargo efetivo da união, que com a edição dessa lei passaram para essa modalidade, que o texto original da Constituição de 1988 no caput do artigo 40 previa esse tipo de aposentaria por tempo de serviço, sem a necessidade de contribuir. E isso se estendeu a todos os servidores públicos através da edição de leis estaduais e municipais.

E tecnicamente não tem nada de errado nisso, se o servidor contribuiu ou não, são apenas modelos diferentes de financiamentos previdênciaário.

Isso continuou assim até o advento da Emenda Constitucional nº 3, de 17 de março de 1993 – EC 03/93, no governo de Itamar Franco, a modalidade de previdência de todos os servidores públicos era no regime pró labore facto. Não existia a figura da contribuição previdenciária dos servidores públicos, embora muitos insistam que sempre contribuíram, mas isso não é verdade, pois a exemplo do Estado de Goiás eles contribuíam para Ipasgo (a antiga previdência de Goiás que foi substituída pela Goiásprev), mas essa contribuição sempre foi apenas para custear pensão e assistência à saúde e em regime de caixa, ou seja, não era capitalizada.

Os demais servidores públicos só passaram a serem obrigados a contribuírem a partir da promulgação da Emenda Constitucional nº 20, de 15 de dezembro de 1998 – EC 20/98, mais conhecida como reforma do FHC.

Embora o Governo de Goiás tenha pegado uma carona na EC 03/93 e instituído contribuição previdenciária para os seus servidores públicos, o fez de forma inconstitucional, pois tal emenda foi bem clara, ou seja, só instituiu a obrigatoriedade de contribuição para os servidores da união.

Quando a EC 20/98 muda a previdência de todos os servidores públicos da modalidade de pró labore facto para a modalidade contributiva ela não repassou a responsabilidade de pagar as aposentadorias já concedidas e à conceder para a responsabilidade dos servidores.

Esse passado que é facilmente mensurável em um estudo atuarial é integralmente do tesouro de cada ente federado.

Então não há que se falar em déficit previdenciário simplesmente por que a arrecadação previdenciária seja menor que a rubrica pagamento de servidores inativos.

Para saber se tem déficit atuarial ou superávit é preciso que o estudo atuarial mensure o que são obrigações passadas, na modalidade que o Conselho Estadual de Previdência – CEP estabelecer, não pode ser como o atuário quer, e o meu entendimento é de que a modalidade mais adequada é a de repartição simples no caixa do tesouro.

É preciso que o estudo atuarial estabeleça:

1 – Quanto dessa conta é de benefício concedido até o advento da EC 20/98, e dentro dessa conta também deve entrar os benefícios a conceder daqueles que já eram elegíveis até aquela data;

2 – Quanto é o valor dos benefícios a conceder, usando o método de beneficio proporcional acumulado, até o advento da EC 20/98;

3 – Quanto é o valor dos benefícios a serem concedidos aos servidores que já estavam no sistema na data da publicação da EC 20/98, usando a modalidade de capitalização e descontando o montante apurado pelo método de beneficio proporcional acumulado, que é de responsabilidade do estado;

4 – Quanto é o valor da reserva matemática dos benefícios concedidos aos servidores que já estavam no sistema na data da publicação da EC 20/98, usando a modalidade de capitalização e descontando o montante apurado pelo método de beneficio proporcional acumulado, que é de responsabilidade do estado;

5 – Quanto é o valor da reserva matemática dos benefícios concedidos aos servidores que entraram no sistema depois da publicação da EC 20/98, usando a modalidade de capitalização;

6 – Quanto é o valor o valor da reserva matemática dos benefícios a serem concedidos aos servidores que entraram no sistema depois da publicação da EC 20/98, usando a modalidade de capitalização.

E essa capitalização deverá usar premissas realistas e definidas pelo CEP dentro dos padrões mínimos exigidos pelo Ministério da previdência.

Depois de efetuado tal estudo é que se definirá, respectivamente:

O quanto é de responsabilidade exclusivamente do tesouro. Lembrando que todas as receitas das contribuições dos servidores inativos e pensionistas que estavam aposentados ou eram elegíveis até o advento da EC 20/98 é exclusivamente do tesouro, assim como parte das contribuições dos aposentados e pensionistas que já estavam no sistema e só se tornaram ou vierem a se tornarem elegíveis após a EC 20/98 deverão ser quantificadas pelo atuário , usando o método de beneficio proporcional acumulado, e repassar para o tesouro; e

Quanto é de responsabilidade dos servidores juntamente com o Estado de Goiás.

E só depois de tudo isso é que o atuário poderá estabelecer se tem déficit, equilibrio ou superávit..

O Governo de Goiás poderia deixar de dar ouvidos para esses tecnocratas cheios de soluções mágicas, que só lhe mete em confusão, e poderia chamar o movimento sindical par apoiá-lo no enfrentamento da exigência, descabida, de capitalização para os estados.

Veja:

Estados contestam exigências da Previdência

Poderia também fazer uma atualização das regras de concessão de pensões para diminuir as fraudes, fazer justiça e economia.

Veja:

Casar com homem mais velho e rico é enriquecimento ilícito, diz Juiz

E antes que alguém ainda ressuscite a tal da capitalização e ou a malfadada segregação de massas e outras baboseiras do gênero, farei mais alguns esclarecimentos:

A Goiásprev, não é um fundo, e sim a unidade gestora única do Regime Próprio de Previdência dos Servidores Públicos e dos Militares, que acabou deixando de fazer a sua principal atribuição, que era a concessão das aposentadorias de todos os poderes e órgãos, conforme prevê o parágrafo 20 do artigo 40 da constituição Federal.

É por causa de equívocos como este que a CELG quase foi privatizada, pois o Banco Mundial arrumou uma receita para o Terceiro Mundo aprender a fazer omelete sem quebrar ovos.

Para justificar a entrega a preço de bananas, empresas estatais como a CELG, para a milagrosa iniciativa (ou seria descontinuidade) privada, eles arrumaram uma engenharia com começo meio e fim.

Primeiro, teriam que fazer um cálculo atuarial, o que é isso afinal, trazer a valor presente, de hoje, todos os valores de aposentadorias e pensões a serem pagos nos próximos 75 anos, é isso mesmo, nos próximos 900 meses.

Segundo, com esse valor astronômico (em Goiás eram 11 bilhões) estavam montadas todas as peças, esse valor viraria rombo, que é muito parecido com roubo, justificava cobrar previdência dos aposentados, que até então contribuía apenas para pensão e tratar de saúde, mas o servidor ao reagir, o governo dizia, também vou contribuir, e com o dobro, também não tinha saída, a sociedade como um todo acreditou que o problema era que, o servidor público ganhava muito e nunca tinha contribuído, parte dos servidores acabaram acreditando que tinha mesmo esse “rombo”.

Terceiro, com isso os governos “transtornados e preocupados” com a sociedade e com os servidores, muito a contra gosto teriam que vender as empresas públicas que além de ineficientes, não cumpriam um papel de estado, estado esse que deveria se ocupar de saúde segurança e educação e deixar essas outras atividades por conta do mercado, tem gente tão inocente que acredita que foi a privatização que inventou o celular. Não foi diferente aqui em Goiás, a CELG foi colocada à venda para capitalizar o fundo, isso mesmo, vender um bem hoje, para pagar dívidas vincendas que você poderia e pode muito bem pagar em regime de caixa do tesouro estadual.

Quarto, com isso dividiram a sociedade, entre os a favor e os contra as privatizações, os eletrosauros e os eletrorratos, foi muito difícil, pois os servidores públicos ficaram numa sinuca, sentiam que não era correto privatizar, mas entre a sua aposentadoria e a manutenção da CELG como empresa estatal, acabou pesando a aposentadoria, só os mais politizados reagiram, mas eram tão poucos que eram praticamente imperceptíveis. A sociedade como um todo também ficou refém deste discurso, entre manter a Celg e ficar sem saúde segurança e educação ou vendê-la e ser guindado ao paraíso, pois esta “estatal ineficiente” agora iria, nas mãos do mercado, ser a solução para todos os males da sociedade.

Da mesma forma que estão agora encurralando os servidores colocando a sociedade contra eles com essa falácia de déficit previdenciário sem nenhum estudo minimamente sério que o justifique.

Resumidamente: Isso é apenas mais um confisco no salário já minguado dos servidores públicos.

E o mais irônico de tudo isso é que ainda veio como presente de natal.

E pode estar certo que dinheiro para pagar os aposentados está em falta mais não faltará dinheiro para fazer propaganda desejando feliz natal. O que levará os trabalhadores e trabalhadoras do serviço público do estado de Goiás a só perderem para o peru na arte de odiar essa data.


(*) Jesus Divino Barbosa de Souza é ex-diretor do Ipasgo, especialista em previdência e autor do blog “Previdência! O Blog do Jesus” (http://jesusprev.zip.net)

Foto do Palácio das Esmeraldas de Viviane Veloso