28 de agosto de 2024
Opinião
Publicado em • atualizado em 20/08/2022 às 04:45

O que não dizem sobre brasileiros morando em Portugal

Portugal é um excelente lugar para morar, sem dúvidas, mas além da remuneração aos trabalhadores em geral estar longe de ser justa, a experiência de viver neste país tem grandes obstáculos. (Foto: Carlos Nathan Sampaio)
Portugal é um excelente lugar para morar, sem dúvidas, mas além da remuneração aos trabalhadores em geral estar longe de ser justa, a experiência de viver neste país tem grandes obstáculos. (Foto: Carlos Nathan Sampaio)

Mudar de país sempre foi um sonho desde minha juventude. Pensava em me formar em jornalismo e partir para viver no Canadá, o meu “país dos sonhos”. Só que, com o passar dos anos, as burocracias e dificuldades impostas pela realidade do Brasil me tiraram esse desejo, até eu lembrar que Portugal poderia ser o lugar ideal para vivenciar essa primeira experiência morando no exterior. Graças à facilidade por falarmos a mesma língua e os vários acordos políticos, isso poderia ajudar. Me preparei por dois anos e já adianto: não foi o suficiente.

Antes de explicar o porquê, porém, lembro ao leitor que estou há apenas dois meses na cidade de Porto (segunda maior de Portugal) e este é um dos vários artigos que pretendo escrever até que eu esteja completamente apto a obter a cidadania, o que dura cerca de cinco anos, no mínimo, se eu não me casar com algum cidadão do país. Vale reforçar, ainda, que cada experiência é única e só posso dizer pelas minhas e das pessoas portuguesas e brasileiras que entrevistei, com quem conversei e me relacionei e sobre suas vivências.

“Ora bem”, como dizem aqui, dois anos não foram o suficiente para chegar bem informado em Portugal porque, mesmo com os inúmeros benefícios concedidos por meio de parcerias entre o Brasil e este país europeu, você precisa de dinheiro, muito dinheiro. Esse é o principal, não adianta: R$ 20 a R$ 30 mil, em média, o que daria hoje, em euros, de 4 a 6 mil, para que você não passe fome ou se endivide completamente enquanto procura emprego, o que pode demorar meses.

O poder de compra em Portugal não é tão grande, já que os salários são pequenos. (Foto: Carlos Nathan Sampaio)

Com o dinheiro, ou já empregado em Portugal, você pode sobreviver, sim, adequadamente ganhando, pelo menos, 900 euros (o salário mínimo é 705). Mas falo de moradia, transporte, comida, gastos com celular, e um troco para lazer (sair, comer fora, bares, passeios), já que sabemos que um ser humano quer e precisa mais do que isso: roupas, objetos, saúde, viagens. E aí é que pega, achar um emprego que pague mais de 900 euros é muito, mas muito difícil, principalmente para brasileiros.

A moradia, infelizmente, é o maior problema, já que o mercado imobiliário, assim como no Brasil e, provavelmente, no mundo, faz o possível para tirar o máximo proveito da situação das pessoas. Um aluguel de um espaço simples, como uma quitinete, e numa localização com acesso rápido à ônibus ou metrô, não sai por menos de 600 euros, lembrando que, na maioria das vezes, imobiliárias ou proprietários pedem 2 ou 3 vezes este valor como caução.

Ainda em relação à moradia, há outras opções como dividir apartamento com amigos, ou alugar quartos, o que sai bem em conta, mas proporcionalmente sem privacidade. As contas, por outro lado, como internet, água e energia são bem baratas, principalmente quanto divididas. Um apartamento de três quartos, por exemplo, gasta, em média, 28 euros de internet, 65 de energia e 40 de água.

Fora os gastos com aluguéis, o resto é bem justo. O sistema de transporte é um dos melhores de todo o balanço, já que com 40 euros por mês é possível fazer um plano e utilizar o metrô e os ônibus a qualquer dia e hora, para qualquer lugar dentro de todo o território do distrito de Porto, que possuí 18 concelhos/municípios.

Outro fator de peso é, claro, a segurança. Apesar de todos com quem conversei afirmarem que há violência, roubo e crimes, até agora não encontrei uma pessoa que tenha sido vítima ou presenciado algo. Diferente do Brasil, inversamente proporcional, onde qualquer pessoa já foi roubada/furtada ou já presenciou um crime na vida. A segurança em Porto é algo que você sente ao andar pelas multidões ou em ruas desertas.

Por fim, por enquanto, o trabalho, como disse acima, não é fácil nem para os portugueses, que dirá para os brasileiros. Ganhar mais de 900 euros é um trabalho árduo para profissionais comuns de serviços em geral como os que trabalham com limpeza, vendas, hotelaria, restaurantes, etc. A diferença é que, para portugueses, o governo disponibiliza benefícios que facilitam financiamentos de casa e carro, empréstimos com juro baixo, auxílios para jovens estudantes ou não, para famílias em geral.

Já para os brasileiros, sobra o trabalho duro sem muitos benefícios. Não é uma reclamação, na verdade, apenas um fato. Além disso, vale lembrar que falar inglês não é um fator importante, é indispensável. Se você não fala inglês, suas chances de trabalhar reduzem drasticamente. E o brasileiro precisa se preparar para os trabalhos mais cansativos e com pagamentos ainda menores do que o usual (não que seja obrigado a aceitar). Inclusive, há quem diga que os salários em Portugal (um dos menores da Europa) se mantém baixos por que imigrantes aceitam o que lhes é oferecido. É claro que isso é apenas um lado de toda história, e história tem muita.

No próximo texto pretendo focar nas burocracias que envolvem os pedidos de visto para morar em Portugal. Já adianto, porém, que é bem mais complexo do que a maioria dos vídeos no Youtube trazem. Por isso, se quiser mesmo viver neste país, leia tudo que puder, principalmente em sites do governo português e converse com pessoas que já moram por aqui.

Caso tenha uma dúvida e queira ela respondida em um dos meus textos, pode enviar para o e-mail [email protected] que eu busco a informação com algum entrevistado

Carlos Nathan é jornalista, formado pela Universidade Federal do Mato Grosso e escreve periodicamente para o portal Diário de Goiás

A opinião deste artigo não necessariamente reflete o pensamento do jornal.