A Covid-19 chegou com força ao Brasil em março de 2020 depois de assolar a Europa. As primeiras medidas implementadas para conter a propagação do vírus alteraram a fotografia das cidades, transformando os inflamados centros urbanos em locais quase desertos.
Cadeias produtivas inteiras foram impactadas com distanciamento social, que, por sua vez, contribuiu para que a catástrofe não fosse ainda maior. O transporte público por ônibus, transversal a todos os setores econômicos de uma metrópole, foi um dos serviços mais afetados nesse processo.
O sistema que atende a Região Metropolitana de Goiânia, apontou uma queda de 80% dos passageiros transportados no primeiro mês de pandemia. Dois anos depois, a demanda segue inferior a 60% do período pré-pandêmico. Essa oscilação impacta frontalmente esse serviço que é essencial para ordenar o desenvolvimento urbano.
O corredor BRT Norte Sul, depois de 80 meses em obra, foi planejado para uma demanda que não existe mais. Para ser inaugurado precisará sofrer reformulações como, por exemplo, a aquisição de ônibus de menor porte, ao contrário da frota de veículos articulados e bi-articulados previstos no projeto inicial, que determinaram o comprimento das estações de embarque e desembarque já construídas.
Paralelo ao drama da Covid-19, se deu o processo da revisão do Plano Diretor de Goiânia, que começou em 2018 e está por ser votado pela Câmara Municipal. A principal justificativa para este hiato entre início e fim da discussão é a própria pandemia que, de fato, inviabilizou os momentos de participação popular, garantidos por lei e indispensáveis para distribuir os riscos e benefícios da urbanização e para garantir um desenvolvimento mais inclusivo e sustentável para cidade.
Entretanto, o eixo que trata da mobilidade urbana no plano em discussão, ignora a maior crise sanitária da história do Brasil, que segue vigente e impactando o dia a dia das pessoas. Aprovar o texto como está é negar a existência da pandemia, seus perigos e sequelas.
Ademais, assim como aconteceu no Plano Diretor aprovado em 2007, os eixos viários que comportam o transporte público, servem de discurso de solução para justificar adensamentos desmedidos que atendem a explícitos interesses comerciais do setor imobiliário.
O espraiamento urbano, bem como o adensamento como está proposto, sem um debate qualificado e estratégias viáveis para desestimular o uso do automóvel, deixa mais distante qualquer solução que permita aos goianienses contarem com um serviço de melhor qualidade e eficiência.
(Olmo Xavier é arquiteto e urbanista, especialista em mobilidade urbana e mestrando no PPG Projeto e Cidade da UFG)