22 de novembro de 2024
Opinião
Publicado em • atualizado em 08/08/2022 às 17:58

Jô Soares: o último

Jô Soares abriu a Televisão, e a fechou. A História da TV no Brasil corresponde à sua própria vida. É claro, havia TV antes do Jô. Mas não era essa. A de hoje também não é. Ele trouxe para o Brasil o talk-show dos Estados Unidos. Mas seu programa era tão inusitado, que os próprios norte-americanos começaram a copiá-lo.

O carro-chefe não só de seu programa, mas de toda sua obra, era o humor. Exagerava nos detalhes. Uma espécie de humor hiper-real, que tirava dos detalhes, sarcasticamente, ou ironicamente, narrativas que – diferente do humor grosseiro, cheio de palavrões de hoje, apelativos – nos faziam rir pela correspondência, pela identificação. Era uma espécie de: como nunca ninguém conseguiu ver humor nisso, sendo tão evidente?

Ao que parece, era uma pessoa doce, e ao mesmo tempo ambiciosa. Ao contrário de todos os entrevistadores que vemos por aí, ele não cedia. Não puxava o saco de seus entrevistados. Se alguém fosse ao programa e falasse alguma besteira, ele não deixava passar.

Sua ironia deixava muitos entrevistados desconfortáveis. As pessoas temiam se passarem por ridículas, devido ao seu padrão de entrevistas. Ele não era um qualquer, era o Jô Soares. E quando ele percebia essa intimidação, ele rapidamente tornava o ambiente descontraído. Sua técnica é incrível.

Recebia o entrevistado em pé, abraçava e beijava. Acompanhava o convidado até a cadeira, e depois se dirigia para a sua. Fazia as pessoas se sentirem em casa. A intimidação rapidamente ia embora. Isso era tão natural, que os entrevistados, percebe-se, se esqueciam que estavam sendo entrevistados. Ao final, a impressão que se dava era realmente a de uma conversa.

O segredo é ser honesto consigo mesmo. Ele não precisava teatralizar. Ele era ele mesmo em seus programas. Já ouvimos vários que passaram por lá dizerem isso. Era não só uma espontaneidade, ou autenticidade. O programa era uma extensão de sua personalidade. E, talvez por isso, jamais puxou o saco de quem paga seu salário, ou de seus clientes, os entrevistados. Enfrentou os abusos das emissoras que já o contrataram.

Jô ficou maior que o seu programa. Ficou maior que a TV. Foi um gigante sem igual. Hoje, não há quem ocupe seu lugar. Ele é um desses que coloca o Brasil no mapa, em destaque. Ele não merecia tanta mediocridade. Vai para um lugar melhor.

Cristian de Paula Sales Moreira Junior é professor de História e mestre e doutorando em História Política pela UFG

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