22 de novembro de 2024
Opinião
Publicado em • atualizado em 25/04/2022 às 18:34

Instabilidade democrática: se não é bom para os investidores, imagina para os cidadãos…

Deputado Daniel Silveira. (Foto: Câmara dos Deputados)
Deputado Daniel Silveira. (Foto: Câmara dos Deputados)

Não tem como falar de outro assunto. Todos receberam a decisão do Presidente Bolsonaro de conceder “graça” ao deputado Daniel Silveira com muita preocupação, por ser uma atitude sem precedentes. Independentemente da ausência de caracterização técnica do caso como graça, segundo aponta o dr. Miguel Reale Júnior em entrevista ao professor Marco Antonio Villa, o que existe é um confronto institucional grave. Uma afronta e um desprezo à Justiça.

O Presidente chega até mesmo a dizer, no decreto, que a condenação imposta por dez a um pelo Supremo Tribunal Federal causou uma “comoção nacional”, que é de “uma profunda injustiça que intranquiliza a nação”. Ele entende como nação ele mesmo e seu grupo. Muito pelo contrário, a nação ficou tranquila no momento em que se pune aqueles que tentam inviabilizar o exercício do poder judiciário, aqueles que coagem testemunhas e autoridades judiciais durante o exercício da justiça. A tranquilidade decorre da condenação, além da estabilidade entre os poderes. Crises institucionais não geram tranquilidade, geram insegurança política e temor que o conflito alcance proporções maiores.

Daniel Silveira por palavras e atos tentou inviabilizar o exercício do poder judiciário, e no curso do processo coagiu as autoridades e testemunhas. Fez tudo isso valendo-se da sua condição de deputado. No momento em que foi condenado, concedê-lo a graça torna a democracia muito insegura. Representa um ato de interesse meramente político, para criar uma vítima para a população que pretende-se mobilizar em torno da eleição. O deputado Eduardo Bolsonaro, filho do Presidente, chegou a compará-lo com Jesus Cristo. Isso é o que comove o país, não a condenação: um indivíduo que prega a violência, a desobediência institucional, o ódio, ser comparado a Jesus.

Para além de tudo isso, se percebe que o Presidente não tem limites, o que gera muita insegurança. Podemos mesmo imaginar que, se perder a eleição, irá contestar o resultado das urnas, ou mesmo até as próprias urnas. Este indulto presidencial mostra justamente um aparelhamento para isso.

Segundo, ainda, o jurista Dr. Miguel Reale Júnior, o fato de ser concedido a graça é, inclusive, ilegal, pois a graça só pode ser concedida depois de transitado e julgada a condenação. Como ainda caberia recurso, o processo não estava finalizado. Além disso, a graça, no entanto, apenas concede o perdão para o não cumprimento da pena – criado para casos absolutamente excepcionais –, e não tira, no entanto, os efeitos políticos da condenação. Um desses efeitos é a perda dos direitos políticos e, consequentemente, a perda do mandato. Ele não poderá, inclusive, ser candidato. 

Uma das hipóteses de impeachment, segundo a Constituição, é a afronta aos exercícios da Justiça, quando o Presidente atua contra o livre exercício do poder judiciário. Não há livre exercício do poder judiciário quando se pode anular, no dia seguinte, uma condenação de um deputado que afrontou a liberdade do próprio poder judiciário. Veja que ele não está sendo condenado por um crime de opinião, ou por difamação, como tentou imputar o bolsonarismo. Ele tentou inviabilizar através de graves ameaças à Justiça, no sentido de que, se o poder judiciário cumprisse seu trabalho, ele poderia ser fechado. É instaurado o reino da arbitrariedade, da autocracia, do anarcocapitalismo. 

A reação dos empresários também não foi boa. A atitude do presidente mostra uma instabilidade institucional no Brasil, e países com instabilidade institucional não funcionam regularmente com as bolsas de valores. Elas começam a cair, com menos investimento, e quem está investindo ali, perde dinheiro. Um presidente que não segue as leis, abre espaço para não saber mais o que pode acontecer. 

Para quem é investidor estrangeiro, e não está inserido no cotidiano da política nacional, isso significa que o Brasil se assemelha a países como Bolívia e Venezuela. Podem pensar que, daqui a pouco, este presidente não aceita sair, quem sabe dê um golpe. E a bolsa, que é completamente especulação, perde dinheiro. No entanto, Bolsonaro é um golpista artificial, um projeto. Ele vem vencendo há 30 anos na democracia.  Os investidores preferem uma democracia regular, é o que a experiência mostra. E nós, cidadãos, mais ainda. Volto, novamente, à pergunta: qual será a resposta da  Justiça?

Cristian de Paula Sales Moreira Junior é professor de História e mestre e doutorando em História Política pela UFG.

A opinião deste artigo não necessariamente reflete o pensamento do jornal.