Imagine um cidadão octogenário, hoje homem correto e probo, mas com um passado vergonhoso, o qual quer mantê-lo esquecido e apagado. Esta pessoa tem o direito de manter apagado este passado e impedir que a mídia, tais como, páginas na internet, jornais, revistas, sites de busca ou qualquer outro meio, divulguem o seu “negro passado”?
A resposta é encontrada no “direito ao esquecimento”, alcunha que o mundo jurídico dá ao direito de impedir a divulgação de atos pretéritos. O Supremo Tribunal Federal vai definir em breve o alcance deste direito, quando do julgamento do caso “Irmãos Curi versus Rede Globo”.
A emissora carioca, nos anos 90, em seu Programa “Linha Direta” produziu e divulgou um episódio sobre o “Caso Aída Curi”, jovem que, nos anos 50, foi tragicamente estuprada, assassinada e jogada do alto de um prédio em Copacabana, no Rio de Janeiro, crime este nunca solucionado.
Os irmãos de Aida Curi, indignados com o reavivar deste terrível acontecimento ajuizaram ação com pedido de indenização em face da emissora de TV, que teria explorado comercialmente a tragédia, sem que isto tivesse fins informativos.
Além deste caso, o Brasil já teve o famoso caso Xuxa versus Google, em que a “rainha dos baixinhos” pretendia tirar de circulação fotos e vídeos de seu passado como modelo. Neste caso o Superior Tribunal de Justiça entendeu que “não se pode, sob pretexto de dificultar a propagação de conteúdo ilícito ou ofensivo na ‘web’, reprimir o direito da coletividade à informação”.
No caso Irmãos Curi versus Rede Globo o Ministério Público Federal defendeu que o direito ao esquecimento, ainda não regulamentado no Brasil, não pode “limitar o direito fundamental à liberdade de expressão por censura ou exigência de autorização prévia”. Diz ainda que não é cabível indenização pela simples lembrança de fatos pretéritos.
Enfim, agora a Suprema Corte brasileira está instada a julgar definitivamente o “direito ao esquecimento”. Por certo fará ponderações deste com o direito à informação e à inviolabilidade da intimidade, vida privada, honra e imagem. Mas, ao fim e ao cabo, espera-se que as informações tanto da família Curi, Xuxa ou qualquer outra pessoa, por mais doídas e terríveis que sejam, fiquem todas à disposição da sociedade para a análise e julgamento da história. O “direito à lembrança” deve prevalecer ao “direito ao esquecimento”, pois é necessário lembrar para não repetir.
Marcos César Gonçalves de Oliveira, Advogado e Conselheiro Seccional da OAB/GO, presidente do IGDC – Instituto Goiano de Direito Constitucional e professor de Direito Administrativo e Constitucional da PUC/GO.