Madrugada de 1º de setembro de 2016. Uma operação como nunca vista na cidade abala a política em Ribeirão Preto. Prisões de políticos, mandatos de vereadores suspensos e a morte de uma peça-chave compõem o enredo de uma história iniciada mais de um ano antes, com uma denúncia anônima.
Naquele dia, foi deflagrada a operação Sevandija -“parasita”- do Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado), do Ministério Público paulista, após desdobramentos da investigação de uma licitação suspeita de R$ 26 milhões para a compra de catracas para escolas municipais, que nunca funcionaram como deveriam.
A denúncia chegou à Promotoria em 2015 e, a partir dela, descobriu-se um esquema de recebimento de propina envolvendo honorários advocatícios, corrupção num contrato do setor de água e o uso de uma empresa terceirizada para empregar indicados por vereadores.
A apuração chegou a licitações fraudadas que somam R$ 203 milhões, segundo o Gaeco. Foram denunciadas 34 pessoas e bloqueados R$ 33 milhões, além de 68 imóveis e 66 veículos.
Nove delas estão presas: a ex-prefeita Dárcy Vera (PSD), três ex-secretários (Administração, Educação e Casa Civil), dois ex-servidores, dois advogados e um ex-vereador.
“Mostrou como os poderes estavam corrompidos. Isso se refletia na falta de verbas para asfalto, saúde e educação. A consequência direta foi nas eleições”, disse Jorge Sanchez, conselheiro da Amarribo Brasil, organização que acompanha gastos públicos.
Dos oito vereadores que tiveram os mandatos suspensos e disputaram a eleição, só um foi eleito. Mas nem foi à diplomação e renunciou ao cargo.
Escândalos
Com o caso, Dárcy “elevou” o patamar da cidade na escala de escândalos. Até então, Ribeirão era conhecida por ser a cidade de Antônio Palocci (PT), ex-prefeito (1993-96 e 2001-02) e ex-ministro (Fazenda e Casa Civil), preso pela Lava Jato e que caiu nos governos Lula e Dilma.
“Corrupção é nefasta, corrói a dignidade dos envolvidos e a sociedade. Não é impossível reverter. Com mecanismos de controle e a sociedade fiscalizando teremos democracia plena. Em Ribeirão isso não existia, era meia dúzia de bandidos mandando no dinheiro público.”
A Sevandija resultou em três processos. O que levou Dárcy à prisão envolve suposto pagamento de propina para antecipar honorários à advogada Maria Zuely Librandi.
Ela atuava no sindicato dos servidores num acordo de perdas decorrentes do Plano Collor contra a prefeitura de R$ 800 milhões. Foram pagos desde 2008 mais de R$ 300 milhões, além de R$ 45 milhões em honorários -que eram pagos em dia, enquanto lixo se acumulava na cidade e hospitais não recebiam repasses. Dárcy seria beneficiária de propina.
“Não há argumento algum, nenhum, nada, que sustentasse esse pagamento”, disse o promotor Leonardo Romanelli, que coordena a operação.
Para ele, a operação até aqui teve como positiva a perspectiva de recomposição do prejuízo ao poder público, com a possibilidade de venda dos bens bloqueados.
Morte e prisão
Dois meses após a operação, o empresário Marcelo Plastino, dono da empresa Atmosphera, que era, conforme a apuração, usada para empregar apadrinhados de vereadores, foi encontrado morto em seu apartamento. Segundo a polícia, cometeu suicídio.
Dárcy foi presa na segunda fase da operação, em 2 de dezembro. Ficou 11 dias detida, até a defesa obter habeas corpus no STJ (Superior Tribunal de Justiça). O período, porém, foi suficiente para seu vice, Marinho Sampaio (PMDB), renunciar -alegou não querer assinar os balanços financeiros.
Ela voltou à prisão em maio, após o STJ revogar a decisão que a mantinha livre. No mês passado, teve pedido de habeas corpus negado pelo STF (Supremo Tribunal Federal). Agora, a Justiça local definiu que Dárcy será obrigada a deixar Tremembé, onde está presa, para acompanhar audiências do caso dos honorários, no fim de setembro.
Outro lado
A advogada Maria Claudia Seixas afirmou que Dárcy reafirma seu não envolvimento com as irregularidades e que aguarda o julgamento do pedido de liberdade feito ao STF.
“Ela é inocente e, com o transcorrer do processo, pretende demonstrar isso”, disse a advogada.
Ainda segundo ela, resta aguardar o trâmite legal do processo no STF, que já negou liminar. Não há prazo para que isso ocorra.
Entre os argumentos usados pela defesa estão o de que Dárcy é ré primária, tem bons antecedentes, residência fixa e família constituída.
A defesa recorreu da decisão que obriga a ex-prefeita a acompanhar as audiências. Os outros presos na operação sempre negaram elo com as irregularidades apontadas pelo Ministério Público. (Folhapress)
Leia mais sobre: Brasil