O Ministério Público de Goiás (MP-GO) divulgou, nesta segunda-feira (1º), uma recomendação à Prefeitura de Goiânia para que sejam exonerados, no prazo de dez dias, os servidores que se enquadram em situações de nepotismo e que estejam ocupando os cargos em comissão ou de confiança ou, ainda, de função gratificada na Administração Pública, direta e indireta, do Poder Executivo Municipal.
A recomendação, conforme o documento, é para a exoneração de parentes até o terceiro grau de vereadores e secretários municipais. No documento, a promotora Carmem Lúcia afirma que o Poder Executivo não pode tratar a Prefeitura como um “balcão de negócios”.
Em entrevista coletiva na manhã desta terça-feira (2), em pronunciamento sobre a medida do TCM que determinou o afastamento de Wilson Pollara da Secretaria de Saúde, o procurador-geral do Município de Goiânia, José Carlos Issy, afirmou tratar-se de uma prática que ocorre em todas as esferas do poder público. Além disso, ponderou não existirem legislações que vedem a prática.
“Esse é um assunto que chegou ontem no meio da sessão. Eu ainda não tive acesso, totalmente, mas o que eles falam ali é do transnepotismo. O nepotismo cruzado. Até onde eu me lembro, não existe nenhuma lei que faça vedação sobre isso. É uma prática que existe e não só no âmbito do município de Goiânia”, frisou. “A minha primeira dúvida é se o Ministério Público vai recomendar isso em todas as esferas. O segundo ponto que quero ver é se existe lei que obrigue a fazer isso”, questionou o procurador municipal.
Lista de servidores
Com inquérito iniciado em 2021, o documento encaminhado ao Paço cita 34 familiares de 20 dos 35 vereadores. Destes, 17 já não se encontram mais em atuação na administração municipal. Dentre eles, o esposo de Aava Santiago, Guilherme Liberato Alves, que pediu exoneração ainda em 2021, e o pai da vereadora Léia Klebia, o pastor Adão Maria, falecido em junho deste ano.
Recomendação
Por meio da 20ª Promotoria de Justiça de Goiânia, com atuação voltada à defesa do patrimônio público, o MP-GO expediu uma recomendação ao prefeito da capital, Rogério Cruz, para que exonere todos os servidores nomeados em cargos de confiança ou comissão que possuam determinados tipos de parentesco com vereadores e secretários municipais.
A 20ª PJ instaurou um inquérito civil público (ICP) para investigar indícios de fraude à lei, com troca de favores, nepotismo cruzado e transnepotismo na nomeação de servidores na estrutura de governo do Município de Goiânia, pelo chefe do Poder Executivo municipal.
De acordo com a promotora de Justiça Carmem Lúcia Santana de Freitas, titular da 20ª Promotoria, as indicações foram feitas pelo Legislativo municipal em nomeações a cargos em comissão ou de confiança, ou ainda de função gratificada, de cônjuges, companheiros ou parentes em linha reta, colateral ou por afinidade, até terceiro grau.
Segundo o inquérito, desde o início do mandato, o prefeito nomeou uma numerosa quantidade de servidores que se encaixam neste perfil. Para a promotora, dessa forma, o chefe do Executivo buscava conseguir alterações e atrasos na instauração e tomada de providências nos trabalhos da Comissão Especial de Inquérito (CEI) que investigou irregularidades na administração da Comurg, inclusive, repasses antecipados de recursos da Prefeitura de Goiânia e dívidas com o Instituto Municipal de Assistência à Saúde dos Servidores de Goiânia (Imas).
Assim, considerando que a Constituição prevê, em seu artigo 37, inciso V que os cargos em comissão “destinam-se apenas às atribuições de direção, chefia e assessoramento” e que nos termos do artigo 16 da Lei Orgânica do Município de Goiânia, “os cargos em comissão de direção e as funções de confiança serão exercidos, preferencialmente, por servidores ocupantes de cargo de carreira técnica ou profissional, nos casos e condições previstos em lei”, a promotora decidiu expedir a recomendação.
Ela também amparou a proposição na Súmula nº 13, do Supremo Tribunal Federal (STF), que aborda a questão do nepotismo e define que “a nomeação de cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, inclusive, da autoridade nomeante ou de servidor da mesma pessoa jurídica investido em cargo de direção, chefia ou assessoramento, para o exercício de cargo em comissão ou de confiança ou, ainda, de função gratificada na administração pública direta e indireta em qualquer dos poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, compreendido o ajuste mediante designações recíprocas, viola a Constituição Federal”.
Por fim, Carmem Lúcia destaca que, além do nepotismo propriamente dito (mesma pessoa jurídica) e do nepotismo cruzado (designações recíprocas), ganha cada vez mais força a necessidade de se combater o nepotismo indireto, especialmente o institucional (transnepotismo e ou nepotismo diagonal), por significar o apadrinhamento de pessoas com vínculo de parentesco com autoridades da administração, e, o comprometimento do Legislativo em relação ao Poder Executivo, estabelecendo-se uma relação de dependência mútua, ainda que não se retribua o favor.
“É inegável a influência que a mencionada nomeação não recíproca e recíproca pode causar, colocando em questionamento a necessária separação e independência dos poderes — no caso entre Executivo e Legislativo. Por isso, é imprescindível haver, nessas situações, uma atuação firme, visando a impedir tal prática”, justifica a promotora.