A deterioração política e econômica do Brasil e a transferência de recursos financeiros abaixo do desejado pela União podem motivar o surgimento de um novo país, formado pelos três Estados do Sul.
Ao menos esses são alguns dos argumentos do movimento O Sul É o Meu o País, que neste sábado (7) fará a segunda edição do Plebisul, com urnas espalhadas por 900 municípios de Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul.
“Você quer que Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul formem um país independente?” é a questão que será apresentada aos participantes.
A votação do movimento ocorre uma semana após plebiscito separatista da Catalunha (Espanha), que terminou com 90,09% dos votantes favoráveis à independência e 7,87% contrários -o restante votou em branco ou anulou.
Índice muito alto? Na primeira edição do Plebisul, em outubro do ano passado, 95,74% dos 616 mil participantes apoiaram a proposta de independência sulista. Neste ano, a expectativa é alcançar entre 1 milhão e 2 milhões de votantes.
“O Sul independente tem um grande potencial de ser um país de primeiro mundo. Enquanto estivermos atrelados a Brasília nós não temos esta condição. Nós ficamos no cabresto, como costumamos dizer aqui no Sul”, afirmou Anidria Rocha, uma das lideranças do movimento.
Os organizadores afirmam que um grupo de mais de 20 mil voluntários estará envolvido com o processo.
O movimento existe desde 1992, mas ganhou força nos últimos anos. Segundo ela, o principal motivo é a deterioração da situação política e econômica do Brasil. Outra queixa é sobre a região ficar com um baixo índice dos recursos
produzidos. “Apenas 20% dos recursos produzidos na região permanecem nos Estados do Sul, enquanto o restante fica ‘encastelado’ em Brasília.”
A integrante do movimento disse saber que o plebiscito não tem valor legal e que o sonho separatista ainda está distante -a maioria dos apoiadores da causa acredita que a conquista da independência levará cerca de dez anos.
Apesar disso, neste sábado o grupo também coletará assinaturas com o objetivo de apresentar um projeto de lei de iniciativa popular que propõe a realização de um plebiscito oficial nos três Estados do Sul junto com as eleições de 2018.
Docente de ciência política da UFRGS (Universidade Federal do Rio Grande do Sul), Rodrigo Stumpf González disse que o movimento do Sul do Brasil é diferente do observado em outras regiões do mundo, como na própria Espanha (onde atua como professor visitante da Universidade Autônoma de Madri), na Escócia ou no Curdistão.
Segundo ele, esses locais foram formados a partir da fusão de comunidades políticas com uma organização, cultura e língua comuns. “Já o Brasil é um país que foi fundado a partir da colonização portuguesa e no qual foram incorporados outros grupos de imigrantes, dentro de uma unidade política nacional que surgiu como um Estado unitário, e onde os Estados da federação têm uma existência posterior.”
‘Pouca viabilidade’
De acordo com González, a conquista da independência do Sul do país é “um projeto com pouquíssima viabilidade” porque é proibida pela Constituição. O primeiro artigo do texto constitucional “estabelece que a República Federativa do Brasil é formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e Distrito Federal”.
No ano passado o grupo tentou realizar o plebiscito no mesmo dia das eleições municipais, mas foi obrigado a alterar a data após uma decisão do TRE (Tribunal Regional Eleitoral) de Santa Catarina.
Na decisão, o desembargador Cesar Augusto Mimoso Ruiz Abreu alegou que a consulta poderia atrapalhar as eleições. Ele também entendeu a votação como uma tentativa de desmembrar parte do território nacional, o que é considerado um crime com pena que varia de quatro a 12 anos de prisão. O crime citado pelo TRE está previsto na lei 7.170, no artigo 11.
Como a data foi alterada, no entanto, para ele não havia nenhum impedimento para o a realização do Plebisul.
O plebiscito é realizado, também, num momento em que o Rio Grande do Sul enfrenta grave crise financeira. O Estado anunciou na quarta (4) que vai vender cerca de 49% do capital votante do banco estatal Banrisul.
O governo, que enfrenta dificuldades para pagar salários e dívidas, decretou em novembro do ano passado estado de calamidade financeira. O Estado fechou 2016 com resultado primário apontando deficit de R$ 104 milhões, de acordo com o Tesouro Nacional.
Pulverizado
Apesar de estar em estágio mais avançado, O Sul É o Meu o País não é o único grupo separatista existente no Brasil.
Pernambuco também tem um movimento organizado, assim como São Paulo, que no ano passado realizou o próprio plebiscito. O Sampadeus, como foi chamado, teve a participação de 48.917 pessoas, das quais 54,2% votaram pela independência de São Paulo.
Rio de Janeiro, Minas Gerais, Mato Grosso, além da região da Amazônia e até mesmo Brasília registram inciativas separatistas.
Para González, movimentos desse tipo podem interferir na política nacional, dependendo da capacidade de mobilização de eleitores e da constituição de uma representação no Congresso, a exemplo do que fazem partidos separatistas na Espanha.
“Essa é uma possibilidade, que eles venham a conseguir mobilizar eleitores no sentido de criar uma representação parlamentar e, com isso, negociar uma mudança no pacto federativo e na distribuição de recursos, e não necessariamente na conquista de uma independência”, disse.
Só poderá ir às urnas neste sábado quem tiver mais de 16 anos e for eleitor de um dos três Estados do Sul. O pleito será das 8h às 20h. Os locais de votação estão disponíveis no site sullivre.org. (Folhapress)
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