23 de dezembro de 2024
Especial • atualizado em 13/02/2020 às 09:47

Mortalidade infantil e suicídios indígenas crescem, aponta pesquisa

A mortalidade entre crianças indígenas de até cinco anos de idade cresceu 18,5% no país e os suicídios entre índios de todas as idades aumentaram 18% na comparação entre 2015 e 2016. Os dados integram o relatório anual de violência contra os povos indígenas divulgado nesta quinta-feira (5) em Brasília pelo Cimi (Conselho Indigenista Missionário), vinculado à CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil).

De acordo com o relatório, o número de assassinatos aumentou de 54, em 2015, para 56 no ano passado. No Maranhão, o número passou de três para 11 casos. No Mato Grosso do Sul, houve 15 assassinatos. Em junho do ano passado, um grupo paramilitar atacou guaranis acampados em Caarapó (MS), matando um índio, Clodiodi Aquileu Rodrigues de Souza, e ferindo outros seis, incluindo uma criança de 12 anos.

Ao longo do ano passado, 106 indígenas tiraram a própria vida, com crescimento expressivo na região do Alto Rio Solimões, que saiu de 13 casos, em 2015, para 30 no ano de 2016. Recente pesquisa do Ministério da Saúde apontou que a taxa de suicídio entre indígenas no período 2011-2015, de 15,2 para cada grupo de 100 mil habitantes, é quase o triplo da taxa registrada entre os não indígenas, de 5,9/100 mil.

Em 2016, 20% dos 30 índios que se mataram no Mato Grosso do Sul tinham de cinco a 14 anos de idade. Segundo os dados do Cimi, de 2000 a 2016 782 indígenas cometeram suicídio somente no Mato Grosso do Sul.

Em todo o país, 735 crianças indígenas de até cinco anos perderam a vida no ano passado por doenças diversas, contra 599 em 2015. A etnia yanomami foi a que concentrou o maior número de casos, com 103 mortes no ano passado.

Em 2015, com base em dados oficiais do Ministério da Saúde, a Folha de S.Paulo apontou que a taxa de mortalidade infantil entre índios no ano de 2012, de 38 casos para mil nascidos vivos, foi mais do que o dobro da taxa nacional no mesmo ano (15 por mil).

Violência continua

“Todos os anos apresentamos esse relatório e a violência continua. Em determinado momento essa violência teria que acabar, são os primeiros habitantes do nosso país, que nos ajudam a conservar a cultura brasileira”, disse o secretário-geral da CNBB, dom Leonardo Steiner, em entrevista coletiva nesta quinta-feira (5).

Roque Paloschi, arcebispo de Porto Velho (RO) e presidente do Cimi, afirmou que o papa Francisco tem incentivado a Igreja a defender os direitos indígenas. “Para nós não é motivo de alegria hoje exibir trabalhos do Cimi, pelo contrário, é sinal vergonhoso dessa triste realidade de um país que se diz cristão. Essa realidade é de desprezo e de não cumprimento da legislação e dos deveres do Executivo, do Legislativo e do Judiciário.”

Roberto Liebgott, coordenador do relatório e da regional sul do Cimi, disse que o governo de Dilma Rousseff (2011-2016) se caracterizou “pela omissão”, “se calava contra a ofensiva que vinha chegando contra os direitos indígenas”. A partir do início do governo Temer, em maio de 2016, segundo Liebgott veio uma fase ainda pior para os indígenas. “Percebemos que desde a ascensão do novo governo, o Estado deixa de ser omisso e passa a ser um Estado propositivo na ofensiva contra os direitos indígenas. A gente percebe que se monta uma estratégia na perspectiva de desconstruir os direitos que os povos indígenas foram conquistando ao longo desses últimos 30 ou 40 anos.”

Maria Helena Guiletto, da etnia gavião do Maranhão, protestou contra a tese do marco temporal, adotada pelo governo Temer e por parte de ministros do STF, segundo o qual os índios que não estavam sobre as terras em outubro de 1988 não podem mais reivindicar a posse do território. “A maior violência que nós sofremos é a não demarcação dos nossos territórios. E pedimos apoio a todos contra o parecer [da Advocacia-Geral da União] que aplica o mesmo a todas as terras indígenas. Um parecer que pode provocar a morte dos povos indígenas”.

Segundo o relatório do Cimi, do total de 1.296 terras indígenas no país, 63% não estão demarcadas, com processos que não começaram ou com procedimentos ainda em curso.

O número total de assassinatos no ano passado, 56, inclui os que tem indígenas como autores, às vezes brigas motivadas por embriaguez. São muitos os casos não solucionados, como o assassinato da kaingangue Sebastiana

Mendes. Seu corpo nu foi encontrado no dia 13 de junho de 2016 perto da rodoviária de Cascavel (PR), região em que os índios costumam passar a noite quando vêm da aldeia para a cidade. (Folhapress)

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