João Doria (PSDB) que se cuide, pois simpatizantes do pré-candidato à Presidência Jair Bolsonaro já atuam nas entranhas virtuais para “desconstruir” a boa imagem que o prefeito de São Paulo vem cultivando com evangélicos.
O recado lhe foi dado pelo pastor Silas Malafaia, que disse à Folha ter alertado Doria na semana passada sobre a “onda de boataria” contra ele.
Os dois se dizem amigos e trocam mensagens pelo WhatsApp. Numa conversa, o pastor carioca revelou: “Bolsonaristas” andam espalhando nas redes sociais que Doria é a favor de duas ideias indigestas para igrejas evangélicas em geral: o aborto e a inclusão do debate sobre ideologia de gênero nas escolas (a noção de que feminino e masculino não são categorias biológicas, e sim construções culturais).
Corre nas trincheiras digitais pró-Bolsonaro um texto em que o prefeito é descrito como “social-democrata (esquerda)”. “Defeitos” atribuídos a ele (a caixa alta faz parte da mensagem): “DESARMAMENTISTA (mas não abre mão de sua escolta armada, claro), taxou o Uber, a favor da lei da migração, apoia MUÇULMANOS, a favor da reforma da Previdência, tem Alckmin como padrinho, elogia e defende Aécio Neves, se inspira em FHC e nega veementemente a existência de corrupção em seu partido”.
Várias dessas ideias se encaixam num fenômeno típico dos nossos tempos, as “fake news” (notícias falsas).
Doria, por exemplo, já defendeu mudanças no sistema previdenciário. Em abril, disse à revista “Época” ser contra descriminalizar a interrupção da gravidez, fora “casos de mulheres estupradas”, exceção já contemplada pela lei.
Ele também já se posicionou sobre a ideologia de gênero, um dos pontos mais sensíveis para evangélicos. Em setembro de 2016, ainda candidato a prefeito, foi entrevistado por Carla Zambelli, líder do movimento Nas Ruas.
Defendeu o Escola Sem Partido, projeto que prega “neutralidade política” nos colégios e é coqueluche da bancada evangélica na Câmara, que vê um “expediente esquerdista” nas discussões sobre gênero.
“Cada um tem direito de fazer sua opção da forma que achar conveniente. Mas transformar isso em política na sala de aula… Sou contra”, afirmou o tucano. Zambelli elogiou o posicionamento e disse que o público que os acompanhava no Facebook reagiu com “vários coraçõezinhos”.
Na semana passada, Doria foi definido como “falsa direita” por um dos principais grupos pró-Bolsonaro na rede, @conexaopoIitica, com 28 mil seguidores no Twitter e “viés cristão, conservador”.
Universitário pernaumbucano por trás do canal e também do @conexaocrista, Raul Holderf diz à reportagem que “concorda totalmente” com o “excelente texto” que aloca Doria à esquerda. “Ele vem fazendo jogo duplo.” Finaliza recitando Cazuza: “A tua piscina tá cheia de ratos, tuas ideias não correspondem aos fatos”.
Comentários recentes que associam prefeito e esquerda´na internet: “Contra o Escola Sem Partido, a favor do desarmamento, nunca falou sobre liberação das drogas, aborto. Doria sempre foi tucano”;”resumindo: Bolsonaro é conservador, Doria é liberal. Um é contra aborto e a favor da pena de morte, o outro ‘tanto faz’!”.
No Facebook, uma página sob o lema “sou Bolsonaro, sou pelo Brasil” previu um cenário apocalíptico para a extrema-direita: “Doria eleito = piora do quadro da islamização no Brasil. Avanço das pautas gayzistas, drogas e aborto. Parabéns a esta estúpida neodireita brasileira…”.
Questionado sobre quem critica o prefeito em seu nome, Bolsonaro afirmou que “a internet não tem controle” e se mostrou desconfiado com seus supostos escudeiros. “Tem seguidor que é de outro lado e planta notícia para tentar me bater de frente com A, B ou C. Não entro nessa.”
Malafaia -que celebrou o casamento do deputado com sua terceira esposa, quatro anos atrás- hoje diz ter predileção por Doria para 2018.
“A extrema-direita é tão vagabunda quanto a extrema-esquerda, usa as mesmas táticas dos petralhas: boataria, difamação”, afirmou sobre os grupos que se movimentam contra o prefeito paulistano.
Por via das dúvidas, o pastor aproveitou a abertura da feira ExpoCristão, onde dividiu palco com Doria e o governador Geraldo Alckmin, para reforçar a mensagem: autoridades que enveredem “no “politicamente correto” podem “seguir seu caminho” no ano que vem, pois os valores evangélicos são “inegociáveis”.
A ideologia de gênero, continuou, “é uma das maiores engenharias do diabo para destruir a família”. Tanto Doria quanto Alckmin, que travam batalha de bastidores para ver quem será o presidenciável do PSDB, riram, e em seus discursos repetiram a frase “feliz é a nação cujo Deus é o senhor”. O prefeito também soltou um “glória a Deus”.
(FOLHA PRESS)
Leia mais sobre: Política