22 de dezembro de 2024
Brasil • atualizado em 13/02/2020 às 09:22

Líderes indígenas e quilombola criticam desrespeito e discriminação

O líder indígena do Alto do Rio do Negro (AM), Álvaro Tukano, criticou o desrespeito à demarcação de terras indígenas e a discriminação que sofrem os povos tradicionais durante debate ocorrido na Flip nesta quinta-feira (27). Segundo ele, o índio é tratado como um invasor que não tem direito à terra.

“Alguns acham que o índio tem muita terra. Não tem. Quem tem é a União. Mas lá existe uma grande biodiversidade, e tem os povos indígenas que sobrevivem da floresta. Os índios não são invasores. Quem são invasores são eles, do agronegócio, eles é que estão desruindo tudo”, afirmou Tukano.

Segundo ele, os homens brancos deveriam aprender com os povos tradicionais, que cuidam de seus territórios e se comprometem a educar as gerações mais novas sobre a importância da terra, das águas e da preservação da cultura e das tradições. Para que a destruição acabe, segundo ele, é preciso que índios e não-índios se entendam e respeitem.

“Vocês destruíram os territórios de vocês. Nós somos capazes de mudar isso, desde que vocês possam nos compreender. É preciso acabar com a discriminação, dar fim à matança do nosso povo”, disse Tukano durante sua fala de abertura na Mesa Zé Cléber.

A mesa, que começou com 15 minutos de atraso, teve como tema “Aldeia”. Membros de comunidades indígenas e quilombolas foram chamados para discutir ameaças à preservação ambiental, o respeito às tradições, a educação dentro e fora das salas de aula e a perpetuação da cultura de povos nativos.

O objetivo da mesa Zé Cléber, que ocorre na Flip desde 2005, é discutir temas que envolvem a realidade de Paraty, como problemas sociais, enfrentamento da violência e preservação cultural.

O nome é uma homenagem ao advogado e militante José Cléber, que se refugiou em Paraty durante a ditadura e foi responsável pela produção de músicas que são “os hinos afetivos da cidade”, de acordo com a mediadora da mesa, a jornalista Cláudia Antunes.

Além de Tukano, participaram do debate a liderança quilombola da comunidade Campinho da Independência, território de 287 hectares que fica na região de Paraty, Laura Maria dos Santos, e a líder guarani Ivanildes Kerexu Pereira da Silva, que até 20 dias atrás morava na região de Paraty, mas se mudou com a tribo para Itamanduca, próximo de Ubatuba.

Laura complementou o raciocínio de Tukano ao lembrar que a passagem do homem pela terra é temporária, e que desperdiçar recursos naturais ajuda a perpetuar a destruição da natureza que os povos nativos lutam para evitar que ocorra.

“Quando você estiver fazendo qualquer atividade, você vai estar ensinando, repassando para alguém que estiver te observando. Se a gente quiser um mundo melhor, ainda dá tempo. Ainda dá tempo”, disse.

Segundo os participantes, essa mudança de mentalidade só pode acontecer por meio da educação, e reforçaram a importância de cuidar da educação dos jovens -o que seria diferente de “escolarizar”, de acordo com Ivanildes.

“A gente educa sendo educado, sendo correto. A gente educa as crianças repassando bons hábitos”, afirmou Laura.

Ao concordar com as outras debatedoras, Tukano criticou os métodos educacionais dos homens brancos, baseados no castigo. Levado quando jovem para estudar em um colégio de padres, o indígena conta ter aprendido apenas “a competir, usar roupas e ter medo”.

Esses métodos didáticos, conta, eram muito diferentes dos de seu pai e avô, que cantavam sobre a importância das águas e da preservação da natureza.

“O nosso deus nunca foi castigador. O deus dos cristãos é castigador. Se fizer algo errado, vai pro inferno. Nossa cultura não é assim”.

No fim da mesa, Tukano pediu a todos que se levantassem, dessem as mãos e cantassem com ele. A maior parte do público ficou de pé e acompanhou sua prece. “Sempre que vocês quiserem muito algo, cantem e peçam. Podem ter certeza que alguém vai ouvir”. (Folhapress)

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