23 de dezembro de 2024
Brasil • atualizado em 13/02/2020 às 09:37

Há indícios suficientes de que delatores omitiram informações, diz Fachin

Ao decretar a prisão de Joesley Batista e Ricardo Saud, o ministro Edson Fachin, do STF (Supremo Tribunal Federal), afirmou que há “indícios suficientes de que os colaboradores omitiram” informações sobre a participação do ex-procurador Marcello Miller no processo de delação premiada da JBS.

Diante disso, o ministro decidiu suspender o acordo de ambos até o fim da apuração sobre o caso. “Cabível, portanto, nos termos pleiteados pelo MPF, a parcial suspensão cautelar da eficácia dos benefícios acordados entre o procurador-geral da República e os colaboradores para o fim de se deferir medidas cautelares com a finalidade de se angariar eventuais elementos de prova que possibilitem confirmar os indícios sobre os possíveis crimes ora atribuídos a Marcello Miller”, disse o ministro.

“Quanto aos colaboradores Joesley Mendonça Batista e Ricardo Saud, são múltiplos os indícios, por eles mesmos confessados, de que integram organização voltada à prática sistemática de delitos contra a administração pública e lavagem de dinheiro. A prisão temporária, quanto a eles, como requerida pelo MPF, é medida que se impõe”, afirmou.

Segundo a reportagem apurou, Fachin usa a expressão “parcial suspensão”, porque, por ora, continuam válidos os acordos celebrados por outros dois delatores do grupo, Francisco Assis e Silva, e Wesley Batista.

Segundo ele, o episódio “pode implicar justa causa à ulterior rescisão dos acordos celebrados”. O ministro informa que decretou a prisão ainda na sexta (8), data do pedido feito pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot, e que no mesmo dia enviou a decisão para a Polícia Federal. Em despacho assinado neste domingo (10), ele argumenta que decidiu torná-la pública após divulgação do decreto pela imprensa.

Fachin disse ainda que “a suspensão temporária da eficácia do acordo, com a decretação da prisão temporária dos representados, é medida que se impõe a averiguar de forma mais segura possíveis omissões de informações relativas a crimes conhecidos pelos colaboradores e sonegadas quando da formalização da avença, bem como subministrar meios para que se possa decidir sobre a rescisão dos acordos”.

Segundo o ministro, “há indícios de má-fé por parte dos colaboradores ao deixarem de narrar, no momento da celebração do acordo, que estavam sendo orientados por Marcello Miller, que ainda estava no exercício do cargo”.

“Tal atitude permite concluir que, em liberdade, os colaboradores encontrarão os mesmos estímulos voltados a ocultar parte dos elementos probatórios, os quais se comprometeram a entregar às autoridades em troca de sanções premiais, mas cuja entrega ocorreu, ao que tudo indica, de forma parcial e seletiva”, disse.

O ministro justifica sua decisão de não decretar a prisão de Miller: “Ainda que sejam consistentes os indícios de que pode ter praticado o delito de exploração de prestígio e até mesmo de obstrução às investigações, não há, por ora, elemento indiciário com a consistência necessária à decretação da prisão temporária, de que tenha, tal qual sustentado pelo Procurador-Geral da República, sido cooptado pela organização criminosa”.

“O crime do art. 288 do Código Penal (associação criminosa que substituiu o delito de quadrilha ou bando), para sua configuração, exige estabilidade e permanência, elementos que, por ora, diante do que trouxe a este pedido o MPF, não se mostram presentes, para o fim de qualificar o auxílio prestado pelo então Procurador da República Marcello Miller aos colaboradores como pertinência a organização criminosa”, ressaltou.

No pedido de prisão, Janot diz que Miller foi usado pela JBS “para manipular fatos e provas, filtrar informações e ajustar depoimentos”. “A atitude de Marcello Miller, tal como revelada no diálogo respectivo, configuraria, em tese, participação em organização criminosa, obstrução às investigações e exploração de prestígio”, diz o procurador.

Ao pedir as prisões de Joesley, Saud e Miller, Janot requereu a suspensão da imunidade penal concedida aos delatores no acordo de colaboração.

A suspensão, segundo a reportagem apurou, é considerada na PGR (Procuradoria-Geral da República) o primeiro passo para o fim da imunidade e a rescisão do acordo.

Para Janot, a prisão deles é necessária para a conclusão da investigação sobre o descumprimento do acordo de delação. Janot quer aguardar o prazo de prisão temporária de cinco dias de Joesley e Saud para terminar a apuração sobre a quebra de cláusulas do acordo firmado com eles. Não está descartado um pedido de prorrogação da prisão. Será a última semana de Janot no cargo de chefe da Procuradoria-Geral da República.

São duas as alternativas colocadas na mesa de negociação até sexta (15): rescindir de vez o acordo de delação ou repactuá-lo, ou seja, mantê-lo, mas com penas ou medidas cautelares impostas aos delatores.

Janot entende que houve patente descumprimento de dois pontos de uma cláusula do acordo de delação que tratam de omissão de má-fé, o que justificaria rever os benefícios.

Os pedidos de prisão foram feitos na sexta (8) pelo procurador-geral.

O centro da crise é uma gravação, datada de 17 de março, em que Joesley e Saud indicam possível atuação de Miller no acordo de delação quando ainda era procurador -ele deixou o cargo oficialmente em 5 de abril. O áudio foi entregue pelos delatores no dia 31 de agosto. (Folhapress)

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