A gestão João Doria (PSDB) decidiu mandar um ofício ao presidente Michel Temer pedindo que ele não sancione o projeto de lei que autoriza o armamento de agentes de trânsito no país.
O projeto de lei que altera o Estatuto do Desarmamento já foi aprovado pelo Senado e aguarda decisão do presidente da República. O texto dá a permissão de porte de armas a autoridades de trânsito da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos municípios, quando em serviço, “mediante comprovação de capacidade técnica e de aptidão psicológica”.
O ofício da prefeitura paulistana partiu do secretário dos transportes, Sérgio Avelleda, para quem o projeto de lei tende a trazer maior insegurança ao trânsito. Para o secretário, caso Temer aprove o projeto, a cidade de São Paulo não adotará o armamento da CET (Companhia de Engenharia de Tráfego). “Não vemos razão nenhuma para armar os agentes de trânsito”, disse Avelleda. “Armá-los significa torná-los alvo de bandidos. Isso contribui para uma animosidade desnecessária no trânsito”.
A oposição da Prefeitura de São Paulo ao projeto de lei encontra eco também na Frente Nacional dos Prefeitos, presidida pelo prefeito de Campinas, Jonas Donizette (PSB). “Costumeiramente, o trânsito é local de desentendimentos.
Colocar uma arma nesse contexto é como colocar gasolina em um incêndio”, argumenta. “Sem falar que quando o agente de trânsito prestou o concurso público, ele não esperava que um dia teria que pegar em armas.”
Além da questão da segurança, Donizette argumenta ainda que a mudança na lei pode trazer efeitos orçamentárias aos municípios brasileiros. “O trânsito é responsabilidade dos municípios. E as prefeituras do país já estão sufocadas financeiramente, não têm como bancar esse volume de investimentos”, argumenta.
Segundo ele, o armamento de agentes de trânsito implicaria em outros custos secundários como a promoção de cursos aos agentes e de compras de coletes a prova de balas. Avelleda concorda com esta leitura. “Se eu coloco uma arma na mão do agente de trânsito, estou assumindo que ele pode se envolver em uma troca de tiros, e devo conceder também coletes à prova de bala. Essa não é a função do agente de trânsito”.
Alfredo Coletti, diretor do sindicato que representa a categoria no Estado de São Paulo, também se posiciona contrário ao armamento. “Ao menos no que diz respeito à realidade paulista, não vemos benefícios de um agente portar armas. Imagine que um agente da CET vá atender um carro quebrado na Marginal Tietê. Ele terá que se abaixar para averiguar algum dano no carro ou para guinchar o veículo. Enquanto ele faz isso, tem que se preocupar com a arma ou pedir para que o munícipe a segure?”, questiona.
Ele explica ainda que, diferente de policiais, os agentes de trânsito costumam atuar sozinhos. “Outro ponto é que as sedes da CET teriam que ter um reforço policial para proteger o estoque de armas. Isso parece inviável”.
Isabel Figueiredo, membro do Fórum Brasileiro de política Pública e ex-diretora da secretaria nacional de segurança pública diz que o projeto de lei se insere num contexto de diminuição da força do Estatuto do Desarmamento. “Existem duas pressões contra a efetividade do estatuto. Uma delas é a que tenta revogar o estatuto inteiramente, outra é a de conceder aos poucos o porte de armas a categorias específicas que sempre usam o argumento de que trabalham em situação de risco”, analisa.
“Essas pressões partem do pressuposto que ter uma arma na mão aumenta a segurança das pessoas. Mas diversos estudos indicam o oposto”.
Pressão
A alteração no Estatuto do Desarmamento é uma pressão da Associação dos Agentes de Trânsito do Brasil. A associação informa que, ao lado de outras entidades, há nove anos tenta aprovar o projeto em nome do direito de autodefesa.
Em seu site, a associação diz que armar o agente de trânsito é uma necessidade social e que os agentes ainda terão que passar pelo controle de testes de aptidão técnica e psicológica. A reportagem não conseguiu entrar em contato com a associação.
Na Câmara Federal. o texto foi proposto em 2008, pelo então deputado Tadeu Filippelli (PMDB-DF). Em maio deste ano, Filippelli, que era assessor especial de Temer, foi preso pela Polícia Federal.
O relator do texto no Senado, senador José Medeiros (Podemos-MT), recomendou em seu parecer a aprovação da matéria e argumentou que, no caso desses profissionais, o porte de arma de fogo é um instrumento de trabalho, não um privilégio. “Cada agente desse, para ir para a rua em uma fiscalização ostensiva, é necessário ter a polícia lá de babá. Então, nós podemos nos dar a esse luxo? Porque o Estado não prepara e capacite o agente para cuidar ele próprio de sua segurança”.
Quando foi aprovado no Senado, o senador Romero Jucá (PMDB-RR) também defendeu o armamento de agentes de trânsito, dizendo que a categoria faz abordagens a eventuais carros roubados ou de criminosos. (Folhapress)
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