A Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq), e a Terra de Direitos divulgaram um estudo que aponta o crescimento da violência em comunidades tradicionais. Segundo a pesquisa ‘Racismo e Violência contra Quilombos no Brasil’, que foi divulgada nesta sexta-feira (17), a média anual de assassinatos quase dobrou nos últimos cinco anos, comparando o período de 2008 a 2017.
A pesquisa foi divulgada três meses após o assassinato de Maria Bernadete Pacífico, conhecida como Mãe Bernadete, no Quilombo de Pitanga dos Palmares, mas a morte dela não foi contabilizada no estudo. Em um levantamento preliminar, em 2023 foram registradas sete mortes e, entre 2018 e 2022, houve 32 assassinatos em 11 estados. As principais caudas desses ataques seriam conflitos fundiários e violência de gênero.
No contexto de luta e defesa do território, pelo menos 13 quilombolas foram mortos. O objetivo é que o estudo seja entregue a autoridades do Executivo federal e estaduais e secretarias de Justiça dos estados. Além disso, a pesquisa deve ser entregue aos Poderes Legislativo e Judiciário.
A primeira edição da pesquisa considera o período de 2008 a 2017, apontando um mapeamento de 38 assassinatos ocorridos em dez anos. A média anual era de 3,8 e passou a ser de 6,4 ao ano. Se considerado o período de 15 anos, 70 quilombolas foram assassinados.
Em entrevista à Agência Brasil, a socióloga Givânia Maria da Silva, coordenadora do coletivo nacional de educação da Conaq, o levantamento foi realizado nas próprias comunidades. Segundo ela, os números vão além do noticiado e espelham uma estrutura racista da sociedade brasileira.
Assassinato
O líder Quilombola, Luis Fernando Santana, foi assassinado e o júri aconteceu nesta quinta-feira (16), no fórum de Santa Cruz de Goiás. Luis Fernando foi morto a 12 tiros enquanto dormia. O réu foi apontado como sendo Daniel dos Santos Maranhão Sobrinho foi condenado a 16 anos de prisão.
A família de Luis Fernando, entretanto, não concordou com a sentença. Segundo Mariane Santana, irmã do líder Quilombola, afirmou ao jornal Positivo Goiás, que é uma situação difícil e delicada. “Hoje, eu saio daqui pedindo que a justiça divina seja feita. A justiça do homem condenou ele a 16 anos de prisão, mas pelo que aconteceu aqui hoje, eu penso que deveria ser maior essa condenação. A gente sabe que a justiça hoje é falha e que essa pena pode ser reduzida”, lamenta.
Luta por terra
Uma das questões fundamentais que devem ser levadas em conta na discussão é a luta da terra no Brasil. Segundo Givânia, a questão é atravessada pelo racismo. “No Brasil, a impressão que eu tenho é que falar de terra, tendo pessoas negras como proprietárias, parece que ainda é mais grave”, diz.
De acordo com o coordenador da Terra de Direitos, Darci Frigo, demonstrações de racismo estrutural e institucional são uma espécie de pano de fundo da violência e que a morosidade do processo de regularização fundiária faz com que a violência se amplie. A solução, para ele, é que a gestão pública atue no combate da violência, bem como nas ações de garantia de direitos, já que “não ter políticas públicas gera mais violência”.
Nessa luta, as comunidades são o alvo. Ainda para a Agência Brasil, o filho da Mãe Bernadete, Jurandir Wellington Pacífico, também diz que a falta da titulação da terra propiciou o assassinato da mãe dele. “As terras quilombolas são fontes de energia e também são alvos da grilagem e do tráfico. Minha mãe era uma representante mundial da causa e que sempre lutou pelo empoderamento feminino”, afirma.
Assassinato e violação de direitos
O estudo traz, além do assassinato dos quilombolas, o levantamento de violações de direitos sofridos por essa comunidade em que houve identificação de morte causada por crimes. Conforme aponta a pesquisa, em 10 das 26 comunidades em que os assassinatos foram registrados, não há processos abertos no Instituto Nacional de Reforma e Colonização Agrária (Incra) e sete assassinatos foram motivados por conflitos fundiários.
Se considerados 11 quilombos que estão totalmente ou parcialmente titulados, os conflitos fundiários representaram 27% dos assassinatos. Além disso, o estudo tem destaque para 1.805 processos abertos no Incra para regularização de terras quilombolas, de acordo com a Fundação Palmares.
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