Às 5h da segunda-feira, dia 4 de fevereiro, primeiro dia útil no Congresso Nacional no ano, policiais legislativos perceberam um movimento atípico no subsolo da Câmara. Assessores de candidatos de primeiro mandato se enfileiravam em frente ao guichê do protocolo.
Chefes de gabinete de congressistas mais experientes foram alertados e tiveram de, às pressas, mobilizar seu pessoal para conseguir um lugar na fila. Pouco adiantou.
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Por volta de 7h, a ex-jornalista Joice Hasselmann (PSL-SP) chegava a passos largos. Sua primeira iniciativa como deputada federal eleita com 1 milhão de votos foi furar a fila do protocolo. Como congressista, ela tem a prerrogativa de ser atendida antes. E assim conseguiu registrar a primeira CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) da legislatura, dedicada a investigar a tragédia da barragem da Vale em Brumadinho (MG).
Nas duas semanas passadas desde então, ela subiu à tribuna diversas vezes para tratar do tema.
“Essa CPI não é festa, não é brincadeira. Isso aqui não é disputa por protagonismo, não”, discursou, em tom irritado, na última quarta-feira (13). Ao descer do púlpito, confidenciou a um colega: “Estou espumando”.
Uma maioria se formava para transformar a CPI em CPMI, uma comissão mista, já que o Senado também tem intenção de investigar o rompimento da barragem. “Não vai ter CPI mista, não”, rechaçou Joice. “A mista é um ajeitamento com gente do PT no meio”, argumentou.
Uma assessora parlamentar cochichava rindo a um metro de distância. Se conhecesse o regimento, notou, a deputada podia transformar a CPI dela em mista e não perderia a autoria.
“O número do registro não tem a menor importância. Todos os projetos serão debatidos e o que tiver mais consistência vai ser aprovado, não é por ser o primeiro”, observou o deputado Zé Silva (Solidariedade-MG), em seu terceiro mandato. “Falta maturidade.”
A busca por visibilidade não é exclusividade de Joice. Na bancada do PSL, partido do presidente Jair Bolsonaro, diversos deputados jogam sozinhos.
Com 54 integrantes, incluindo Eduardo Bolsonaro (SP), filho do presidente, Alexandre Frota (SP), Bia Kicis (DF) e Carla Zambelli (SP), o PSL tinha condições de ser um ativo do governo em suas articulações com o Congresso.
Em tempos turbulentos de início de mandato, com o objetivo de aprovar a reforma da Previdência e denúncias de candidaturas laranjas envolvendo alguns dos seus, a bancada deu mostras até agora de que será um obstáculo para o Palácio do Planalto.
O primeiro teste ocorreu já no dia 5. O líder do governo, Major Vitor Hugo (PSL-GO), convocou uma reunião de líderes para negociar a reforma. Nem ele compareceu, depois das críticas que sofreu por falar em “apoio consistente” e “apoio condicionado” dos partidos.
Na última semana, sua capacidade de articulação mais uma vez foi reprovada. A Casa votava projeto que acelera o bloqueio de bens de investigados e acusados de terrorismo. Vitor Hugo fechou acordo com o Novo para incluir dois destaques. O líder do PSL, Delegado Waldir (GO), na última hora, orientou contra, e o projeto foi aprovado sem as emendas previstas.
“Estava tratando com o líder do governo, não sabia que no meio do caminho entraria alguém que derrubaria”, disse o deputado Marcel Van Hattem (RS), líder do Novo.
“A gente espera que não volte a ocorrer, tem que confiar que vai dar certo daqui para frente.”
Delegado Waldir afirmou que seguiu orientação dos ministros Onyx Lorenzoni, chefe da Casa Civil, e Sergio Moro, da Justiça. “Na verdade, dialogamos com os parlamentares e houve consenso”, justificou.
Nesta semana, outro episódio suscitou desconfiança entre líderes de partidos dispostos a apoiar o presidente Bolsonaro. A Mesa Diretora definiu que a CCJ (Comissão de Constituição e Justiça), mais importante colegiado da Casa depois do plenário, será presidida pelo PSL. O partido primeiro indicou Bia Kicis, depois, mudou de ideia, e apontou Felipe Francischini (PR), cujo nome não foi oficializado. O vaivém evidencia a disputa que a bancada não consegue resolver internamente, disseram líderes, e a consequência é a descrença na força que o governo terá na Câmara.
O fator mais desestabilizante da semana foi o acirramento da crise causada pela revelação, pela Folha de S.Paulo, de um esquema de candidaturas laranjas envolvendo o presidente do partido, deputado Luciano Bivar (PE), e o ministro Gustavo Bebianno (Secretaria-Geral), que deve ser demitido.
Parlamentares expressaram preocupação com o chamado poder paralelo exercido pelo vereador carioca Carlos Bolsonaro (PSC), filho do presidente. Causa insegurança negociar com Bolsonaro para aprovar, por exemplo, a Previdência, sem saber que tipo de influência seu filho, que não papel institucional, pode vir a exercer sobre a relação entre Executivo e Legislativo.
Não foi a primeira vez que Bivar dividiu opiniões entre os deputados do PSL. Sua condução considerada por alguns autoritária já suscita movimentos iniciais de migração partidária.
O deputado Charlles Evangelista (PSL-MG) foi excluído do grupo de Whatsapp da bancada depois de manter a sua campanha para a segunda vice-presidência da Câmara à revelia.
“Bivar colocou a candidatura dele sem deliberação nenhuma. Sofri pressão do grupo dele, o Julian [Lemos (PSL-PB)], Francischini, Waldir. Disseram que sofrerei sanção. Na eleição de 2022, eu poderia ser prejudicado de alguma forma”, disse Evangelista.
Ele foi para o enfrentamento como avulso. Obteve 161 votos e Bivar, 240, levando a eleição foi para o segundo turno. Bivar finalmente venceu o correligionário, mas por margem apertada, de 198 a 184.
Desde então não se tocou mais no assunto.
“Ficaram meio magoados com a quantidade de votos que eu tive, provavelmente”, afirmou o mineiro. “Mas meu compromisso é estar apoiando o presidente Bolsonaro e isso aí vou fazer no partido em que eu estiver.”
Bivar não respondeu ao contato feito pela reportagem. Major Vitor Hugo não quis comentar. Delegado Waldir minimizou as dificuldades que as desavenças da bancada podem impor ao governo.
“Nós realmente temos alguns grupos diferentes”, disse. “Temos palmeirenses, corintianos, são-paulinos, santistas. Nós respeitamos.
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