A nova versão da base nacional curricular, documento que servirá como referência para o ensino das escolas públicas e particulares de todo o país, exclui o ensino religioso, área que até então estava presente nas versões anteriores.
A terceira versão do documento foi entregue nesta quinta-feira (6) ao Conselho Nacional de Educação, órgão ligado ao Ministério da Educação e responsável por analisar mudanças em políticas educacionais.
Antes da exclusão, a proposta anterior da base estabelecia diretrizes para o ensino religioso tanto nos anos iniciais quanto finais do ensino fundamental. Em um dos trechos, o documento dizia que “a escola, diante de sua função social, pode contribuir para a promoção da liberdade religiosa e dos direitos humanos, desenvolvendo práticas pedagógicas que enfrentem e questionem processos de exclusões e desigualdades, e que encaminhem vivências fundamentadas no conhecer, respeitar e conviver entre os diferentes e as diferenças”.
Entenda a base curricular
“Nesse sentido, lhe cabe disponibilizar aos estudantes o conhecimento da diversidade dos fenômenos religiosos, incluindo o estudo de perspectivas não religiosas, como o materialismo, agnosticismo, ateísmo, ceticismo, entre outras, tendo em vista a educação para o diálogo”, completava.
A área, porém, não consta da última versão, entregue nesta quinta. No novo documento, o MEC afirma que a área foi excluída para atender o que diz a Lei de Diretrizes e Bases, que define as diretrizes da educação no país. A lei determina que o ensino religioso “constitui disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental”, mas que a definição dos conteúdos cabe aos sistemas de ensino, “assegurado o respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil e vedadas quaisquer formas de proselitismo”.
“Portanto, sendo esse tratamento de competência dos Estados e municípios, aos quais estão ligadas as escolas públicas de ensino fundamental, não cabe à União estabelecer base comum para a área, sob pena de interferir indevidamente em assuntos da alçada de outras esferas de governo da federação”, informa a nova versão da base. A nota lembra ainda que a matrícula em ensino religioso é optativa ao aluno –apesar de a oferta ser, em tese, obrigatória pelas redes.
OPCIONAL
A exclusão pegou de surpresa associações que discutem o ensino religioso. “É um retrocesso”, afirma Eduardo Brasil, secretário do Coner (Conselho de Ensino Religioso do Estado de São Paulo). “A base [anterior] era um avanço com a possibilidade de desconstrução do ódio religioso. Não há como negar que a cultura muçulmana tem uma influência no mundo gigantesca. Ou que guerras que estão acontecendo têm como pano de fundo religiões. A única maneira de acabar com o preconceito é conhecendo a religião do outro.”
Para Valmir Biaca, professor de ensino religioso e técnico-pedagógico da Assintec (Associação Inter-Religiosa de Educação), do Paraná, a ideia de discutir o ensino religioso por meio de uma base nacional curricular era importante para dar diretrizes sobre como deve ocorrer a abordagem dos conteúdos. “Há lugares onde a proposta é trabalhar religião, o que vai contra a Constituição [que diz que o Estado é laico]”, afirma ele, que via a versão anterior da base como positiva, mas com possibilidade de avanços.
Segundo ele, há desconhecimento no país sobre o que deve ser visto, de fato, como ensino religioso. “Vemos o ensino religioso como área de conhecimento, e que trabalha conteúdo, não religião. Religião é igreja, escola é conhecimento. O que para a igreja é objeto de fé, para nós é conhecimento. Muitos são contra por não saber disso”, diz.
Nos últimos meses, a abordagem de ensino religioso na base curricular já era alvo de disputas durante a construção do documento -o que fez ganhar força a ideia de retirada, segundo especialistas que acompanharam as discussões.
Questionado, o secretário de educação básica do MEC, Rossieli Silva, diz que a exclusão do conteúdo ocorre devido ao fato do ensino religioso não ser obrigatório. “Entendemos que, diante de todo o quadro, e do Estado sendo laico, isso deve ser uma discussão direta do currículo dos sistemas [de ensino]”, afirma.
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