A tentativa de votação de um projeto que previa aumento salarial e pagamento de décimo terceiro aos vereadores de Piracanjuba, no sul de Goiás, foi interrompida após forte reação popular. O episódio culminou em bate-boca na Câmara Municipal e ganhou grande repercussão nas redes sociais, com vídeos de uma carreata de eleitores que se mobilizaram contra a proposta antes da sessão. A nova votação já está marcada para quinta-feira, mantendo o tema em pauta e sob atenção da população.
Segundo o agricultor Fábio Rodrigues, um dos participantes do movimento, a manifestação surgiu da indignação com o aumento de gastos públicos em um momento em que a cidade enfrenta sérios problemas na área da saúde. “A gente é contra porque aumenta os gastos públicos, e não foi isso que prometeram para a sociedade quando pediram votos. Piracanjuba está um caos na saúde. O Hospital Regional está caindo aos pedaços, faltam insumos e até analgésico para crianças”, afirmou em entrevista ao Diário de Goiás.
Para Fábio, a insatisfação da população é reflexo da sensação de abandono em serviços básicos. Ele explica que a sociedade se mobilizou espontaneamente e que o grupo tem buscado contribuir com o município por meio de ações solidárias. “A gente se comprometeu a fazer um mutirão para limpar a cidade e arrecadar recursos com leilões beneficentes para doar ao hospital regional. Mas é difícil mobilizar as pessoas quando o poder público não dá exemplo”, disse.
A pressão popular levou ao encerramento da sessão, e os manifestantes afirmam que vão continuar acompanhando os trabalhos do Legislativo para evitar novas tentativas de votação. “O pessoal está mobilizado para continuar. A repercussão foi grande, e dentro do respeito, a pressão vai continuar”, contou Fábio.
A repercussão também gerou efeitos políticos imediatos. “Já mudou. Os vereadores não estão podendo sair na rua. O povo acordou. Isso pode até não ser ilegal, mas é imoral aumentar gastos num momento desses”, completou o agricultor, ressaltando que o movimento prefere ser identificado como “a indignação da população de Piracanjuba”.
O que diz a lei
Para entender o que é juridicamente permitido, o Diário de Goiás ouviu o advogado Dyogo Crosara, especialista em Direito Administrativo. Ele explicou que há limites constitucionais claros sobre o momento em que vereadores podem votar aumentos de subsídio. “O subsídio é fixado em uma legislatura valendo apenas para a próxima. Você não pode fixar novo valor durante a legislatura vigente, isso seria inconstitucional e não teria validade”, esclareceu.

Segundo o advogado, o que pode ser feito dentro do mesmo mandato é a recomposição de perdas salariais, desde que limitada à inflação, o que difere de um aumento real. “Reajuste por recomposição é permitido, mas não é aumento. É apenas correção inflacionária”, afirmou.
No caso do décimo terceiro salário, Crosara explica que a situação é diferente: “O Supremo Tribunal Federal já decidiu que os vereadores têm direito ao 13º. Então, se eles ainda não recebem, pode haver uma votação instituindo esse pagamento, mesmo no curso da legislatura, sem problema legal”, afirmou.
Mobilização continua
A promessa de que a Prefeitura destinaria recursos economizados pela Câmara à saúde também motivou parte da mobilização. Segundo Fábio, o compromisso foi assumido publicamente após o primeiro protesto. “A prefeita se comprometeu que tudo o que fosse devolvido pela Câmara seria aplicado 100% na saúde. Isso deu esperança ao povo de que o dinheiro público seria melhor usado”, contou.
Apesar da tensão política, o movimento garante que continuará agindo de forma pacífica. “A pressão é grande, mas é dentro da legalidade e do respeito. A gente quer apenas que o exemplo venha de cima”, finalizou Fábio Rodrigues.
Com a sessão encerrada e a proposta ainda sem nova data para votação, o episódio marcou um ponto de inflexão na relação entre os eleitores e o Legislativo local, escancarando o descompasso entre as prioridades da população e as pautas do parlamento municipal.
Projetos de lei
O Diário de Goiás localizou quatro projetos de lei e uma proposta de emenda à Lei Orgânica apresentados recentemente na Câmara Municipal de Piracanjuba. As matérias tratam de temas relacionados à remuneração de agentes políticos e servidores do Legislativo. Entre elas, o Projeto de Lei nº 34/2025 propõe garantir o pagamento de décimo terceiro salário e adicional de um terço de férias aos vereadores, enquanto a Emenda nº 001/2025 à Lei Orgânica do Município busca assegurar o mesmo direito aos demais agentes políticos da cidade.
Outras proposições obtidas pela reportagem incluem os Projetos de Lei nº 35 e nº 36/2025, que preveem reajustes salariais de 4,5% aos servidores do Legislativo e correção no vencimento do cargo comissionado de Assessor Geral. Os documentos, datados de 6 de outubro de 2025, apontam que os aumentos e benefícios possuem respaldo orçamentário e se baseiam em decisões do Supremo Tribunal Federal e na Lei de Responsabilidade Fiscal. As propostas foram assinadas por membros da Mesa Diretora e vereadores da base, e já contam com justificativas e estudos de impacto financeiro anexados.
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